Processo nº 2165-28.2015.8.10.0038
Ação
Popular
Requerente:
ANTONIA CACILDE SOUSA LIMA
Requerido:
JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, CLEONALDO PEREIRA DINIZ, EVILASIO CARVALHO DA SILVA e
MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA
SENTENÇA
I - RELATÓRIO
Trata-se de AÇÃO POPULAR ajuizada
por ANTONIA CACILDE SOUSA LIMA em face do JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, CLEONALDO
PEREIRA DINIZ, EVILASIO CARVALHO DA SILVA e MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA, todos
devidamente qualificados na inicial.
Alegou o autor que na
condição de cidadão tomou conhecimento que no ano de 2014 foram instaurados
diversos processos administrativos para fins de exoneração de servidores
municipais em situação de acumulo de cargos indevidamente, em cumprimento a um
TAC Nº 06/2013, firmado em 07.01.2014.
Afirma que o requerido CLEONALDO
PEREIRA DINIZ, mesmo ocupando os cargos públicos de SECRETARIO MUNICIPAL DE SAÚDE
DE JOÃO LISBOA/MA, FARMACÊUTICO CNES Nº 2646439 DO HOSPITAL MUNICIAPAL DE
ITINGA/MA (10h/semana), FARMACÊUTICO ANALISTA CLÍNICO DO HOSPITAL MUNICIPAL DE
ITINGA/MA (20h/semana) E o cargo privado de FARMACÊUTICO ANALISTA CLINICO DO
LABORATÓRIO SIGMA (60h/semana), não foi abarcado pelo referido procedimento.
Sustenta que os requeridos
JAIRO MADEIRA e EVILASIO CARVALHO DA SILVA, na condição de prefeito de João
Lisboa e Secretario de Administração de João Lisboa, respetivamente, tinham pleno conhecimento do fato e mantiveram-se
inertes e, ainda, que CLEONALDO DINIZ não pediu licença de nenhum dos cargos
ocupados e que vinha recebendo sem trabalhar nos cargos, motivo pelo qual devem
ser condenados solidariamente à devolução dos valores indevidamente percebidos
por CLEONALDO DINIZ, afirmando ainda que tal ato configura improbidade
administrativa.
Finaliza requerendo a
procedência da demanda com a exoneração de CLEONALDO PEREIRA DINIZ do cargo de
SECRETARIO MUNICIPAL DE SAÚDE e suspensão dos pagamentos com condenação dos
requeridos ao ressarcimento ao Erário Público do valor equivalente àqueles
pagos indevidamente ao requerido CLEONALDO DINIZ desde 01.01.2013.
Às fls. 44, postergou-se a
análise do pedido de liminar para depois das respostas e determinou-se a
citação dos requeridos.
Às fls. 56-57, o município
de João Lisboa junta aos autos ofício informando que o requerido CLEONALDO
PEREIRA DINIZ ocupa é agente político vinculado a SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE.
Às fls. 64-82, CLEONALDO
PEREIRA DINIZ apresentou contestação, oportunidade em que sustentou a
inexistência de ato lesivo ao patrimônio público; que é possível a cumulação de
cargo efetivo com o cargo em comissão; que é incabível a concessão da liminar;
finaliza requerendo a improcedência da ação. Juntou documentos de fls. 83-546.
Contestação de idêntico
conteúdo foi apresentada por JAIRO MADEIRA DE COIMBRA e EVILASIO CARVALHO DA SILVA às fls. 547-561.
Às fls. 564-573, o
MUNICÍPIO DE ITINGA/MA informa que o requerido, CLEONALDO PEREIRA DINIZ, ocupa
cargo efetivo de FARMACÊUTICO BIOQUÍMICO, que esteve de licença sem vencimentos
no período de 16.01.2013 a 15.01.2015, data em que foi reconduzido ao cargo
através a PORTARIA Nº 005/2015 (FLS.567), apresentando inclusive cópias dos
contracheques do mesmo do ano de 2015 (fls. 571-573).
Às fls. 571, as partes
foram intimadas para especificarem eventuais provas, mas quedaram-se inertes,
conforme certidão de fls. 583.
Às fls. 585, este juízo
determinou a intimação da autora para incluir o município de João Lisboa no
pólo passivo tendo em vista a configuração de litisconsórcio necessário.
Petição de emenda às fls.
586.
Às fls. 587 determinou-se
a citação do município de João Lisboa.
Às fls. 589-606, o
município apresentou contestação de idêntico conteúdo ao das anteriores, porém
de forma intempestiva, conforme certidão de fls. 607.
Às fls. 608-610, o MP requereu novas
diligências aos município de João Lisboa, Itinga e ao Laboratório Sigma.
Às
fls. 615, o Laboratório SIGMA informa que CLEONALDO PEREIRA DINIZ não exerce
qualquer atividade profissional na empresa.
Às
fls. 619, o município de João Lisboa informa que CLEONALDO PEREIRA DINIZ exerce
o cargo de Secretário municipal de Saúde, não possui carga horária definida,
mas que a administração municipal funciona de segunda a sexta, das 08H as 13h.
Às
fls. 623, o município de Itinga afirma que desconhece qualquer duplicidade de
cargos ocupados no município por CLEONALDO DINIZ.
Às
fls. 628, o MP requer nova diligência ao município de Itinga/MA, o que foi
deferido.
Às
fls. 631, o município de Itinga/MA informa que a carga horária de CLEONALDO
PEREIRA DINIZ é de 40 horas semanais em regime de plantão, com lotação no
Hospital Municipal de Itinga/MA.
Às
fls. 640-645, o MP apresentou parecer pela procedência da ação com exoneração do
requerido CLEONALDO PEREIRA DINIZ e condenação solidária dos quatro requeridos
a devolverem os valores indevidamente percebidos por CLEONALDO DINIZ.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. DECIDO.
II – FUNDAMENTAÇÃO
DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO LIDE
Cumpre observar que o
ordenamento jurídico brasileiro permite que o juiz conheça diretamente do
pedido, proferindo sentença, nos casos em que a controvérsia gravite em torno
de questão eminentemente de direito ou sendo de direito e de fato, não houver
necessidade de produzir prova em audiência ou ainda no caso de revelia dos réus.
Desse modo, cabível é o
julgamento antecipado da lide (CPC, art. 355, I), em atenção aos princípios da
economia e da celeridade processuais.
MÉRITO
A Ação Popular
é um meio do qual se pode valer qualquer cidadão do povo, para comparecer
perante o Estado-Juiz, referindo-lhe a existência de ato lesivo ao patrimônio
público, onde quer que esteja e independentemente de quem o detenha,
estendendo-se ao ataque à imoralidade administrativa ou que fira qualquer outro
bem entre os que pertencem ao grupo dos interesses sociais ou individuais
indisponíveis.
Tal ação
tem as mesmas características de todas aquelas com que alguém se volve ao Poder
Judiciário, em busca do reconhecimento da detenção de um direito, ou da tutela
de qualquer dos bens assim juridicamente considerados. Toda ação tem como
pressuposto, que seu autor tenha interesse e legitimidade para agir. No caso
desta, apenas uma condição é requerida da parte de quem a quiser ajuizar e cuja
comprovação é exigida no ato: que seja eleitor.
Os atos atacáveis via ação popular, se
classificam em ATOS NULOS quando são lesivos ao patrimônio público ou quando
praticados ou celebrados sem observância legal (art. 2º, § único da Lei nº
4717/65). A nulidade pode se dar por motivo
de INCOMPETÊNCIA, ou seja, quando o ato não se incluir nas
atribuições legais do agente que o praticou; pelo vício de FORMA e consiste na omissão ou na
observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência
ou seriedade do ato; por ILEGALIDADE
DO OBJETO cuja ocorrência se dá, quando o resultado do ato importa
em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; ainda, por inexistência dos MOTIVOS e
se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato,
é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e
finalmente, por desvio da
FINALIDADE o que se verifica, quando o agente pratica o ato visando
fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de
competência.
No presente caso o autor impugna a
nomeação do requerido para o cargo de SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE sob o fundamento
de sua ILEGALIDADE, pois o
mesmo já exercia a profissão de professor no Estado e professor no município e,
sem qualquer licença, passou a acumular indevidamente o cargo de SECRETÁRIO
MUNICIPAL DE SAÚDE.
A acumulação remunerada de cargos é a situação em que o servidor ocupa
mais de um cargo, emprego ou função pública, conforme previsão na Constituição
Federal.
São
considerados cargos, empregos ou funções públicas todos aqueles exercidos na
administração direta, em autarquias, empresas públicas, sociedade de economia
mista ou fundações da União, Estados ou Municípios, quer seja no regime
estatutário ou no regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
A regra geral da acumulação remunerada de cargos, funções e empregos
públicos é a sua proibição.
A acumulação remunerada é uma exceção à regra geral e somente é permitida
para determinados cargos, funções e empregos públicos, previamente
definidos na Constituição Federal e desde que haja compatibilidade de horários.
A acumulação de cargos, funções e empregos públicos encontra-se assim
disciplinada na Constituição Federal:
I)
Artigo 37, incisos XVI e XVII (com redação dada pela EC 19/98 e EC 34/01):
“XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos
públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em
qualquer caso o disposto no inciso XI:
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou
científico;
c) a de dois cargos
ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
XVII – a proibição de acumular estende‑se a empregos e funções e abrange autarquias,
fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias,
e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público;”
II)
Artigo 38, III;
“Art. 38. Ao servidor público
da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato
eletivo, aplicam‑se as seguintes disposições:
I
– tratando‑se de mandato eletivo federal, estadual ou
distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;
II
– investido no mandato de Prefeito será afastado do cargo, emprego ou função,
sendo‑lhe facultado optar pela sua remuneração;
III – investido no mandato de Vereador, havendo
compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou
função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo
compatibilidade, será aplicada a norma do inciso anterior;”
III)
Artigo 95, parágrafo único, I (com redação dada pela EC 19/98);
“Art. 95. Os juízes gozam das
seguintes garantias:
(...)
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro
cargo ou função, salvo uma de magistério;”
IV)
Artigo 128, §5º, II, letra d) - (com redação dada pela EC 19/98);
“Art. 128. O
Ministério Público abrange:
(...)
§ 5o Leis complementares da União e dos Estados,
cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores‑Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições
e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus
membros:
(...)
II – as seguintes vedações:
(...)
d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer
outra função pública, salvo uma de magistério;”
V)
Artigo 142, §3º, II e III (com redação dada pela EC 19/98);
“§ 3o Os membros das Forças Armadas são denominados
militares, aplicando‑se‑lhes, além das que vierem a ser fixadas em
lei, as seguintes disposições:
(...)
II
– o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil
permanente será transferido para a reserva, nos termos da lei;
III – o militar da ativa que, de acordo com a lei,
tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva,
ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e
somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por
antiguidade, contando‑se‑lhe o tempo de serviço apenas para aquela
promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de
afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei;”
Os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias também regulamentam
dois casos de acumulações de cargos públicos:
I)
Artigo 17, §§ 1º e 2º;
“Art. 17. Os vencimentos, a
remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de
aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição
serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo,
neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer
título.
§ 1o É assegurado o exercício cumulativo de dois
cargos ou empregos privativos de médico que estejam sendo exercidos por médico
militar na administração pública direta ou indireta.
§ 2o É assegurado o exercício cumulativo de dois
cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo
exercidos na administração pública direta ou indireta.”
Deve restar claro que as possibilidades de acumulação de cargos públicos,
funções públicas e empregos públicos abrangem a Administração Direta, Autarquias,
Fundações, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista, suas subsidiárias,
e Sociedades controladas, direta e indiretamente, pelo Poder Público.
Assim, qualquer situação não abrangida nas exceções acima configura caso
de acumulação ilegal de cargos públicos.
ANALISE DA ACUMULAÇÃO DE CARGOS DO CORRÉU CLEONALDO
PEREIRA DINIZ
No caso em análise, observo a partir
dos documentos de fls. 619 e 631-637 que o requerido CLEONALDO PEREIRA DINIZ
ocupa junto ao município de João Lisboa o cargo de SECRETARIO MUNICIPAL DE SAÚDE
e o cargo de FARMACEUTICO BIOQUIMICO no município de Itinga/MA (FLS. 623).
A situação jurídica do corréu
CLEONALDO PEREIRA DINIZ não encontra respaldo em qualquer das regras de
permissibilidade de acumulação remunerada de cargos, empregos e funções
públicas em atividade, uma vez que as exceções à regra da inacumulatividade estão
previstas no art. 37, XVI da CF/88, admitindo a acumulação remunerada de
cargos, desde que haja compatibilidade de horários, em três hipóteses:
Art.37.(...)
“XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos
públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em
qualquer caso o disposto no inciso XI:
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou
científico;
c) a de dois cargos
ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
Com efeito, o réu acumula um cargo
privativo de profissional da saúde (FARMACÊUTICO BIOQUÍMICO) em ITINGA/MA (FLS.
623), porém, o cargo de SECRETARIO MUNICIPAL DE SAÚDE DE JOÃO LISBOA não é
privativo de profissional da saúde – podendo ser ocupado por outros
profissionais - e, portanto, é inacumulável com o cargo de FARMACÊUTICO ocupado
pelo requerido CLEONALDO DINIZ.
Observe-se, ainda, que a Constituição, ao prever a
possibilidade de acumulação, determina que esta deva observar se os cargos envolvidos
são privativos de profissionais da
saúde com profissão regulamentada, não cabendo a estes profissionais a extensão
dessa possibilidade de acumular a qualquer outro cargo administrativo.
Segundo CARVALHO FILHO, “o novo mandamento se referiu a profissionais
da saúde, ou seja, àqueles profissionais que exercem atividade técnica
diretamente ligadas ao serviço de saúde, como médicos, odontólogos,
enfermeiros, etc. Não alcança, portanto, os servidores administrativos que
atuam em órgãos onde o serviço de saúde é prestado, como hospitais, postos de
saúde, ambulatórios, etc. Por conseguinte, não são rigorosamente sinônimas as
expressões “profissionais de saúde” e “profissionais da área de saúde”. Esta é
mais ampla e envolve não só os servidores técnicos em saúde como todos os que
trabalham na área de apoio administrativo”(MANUAL DE DIREITO
ADMINISTRATIVO, rev.amp.atual, 27ed., p. 670-671).
Portanto, é inaplicável o permissivo
do inciso XVI do art. 37 da Constituição Federal eis que ali é viabilizada a
acumulação de dois cargos ou empregos privativos de profissionais
da saúde, com profissões regulamentadas". Uma vez que Secretário
Municipal é agente político, óbvio que não se trata da espécie prevista no
texto constitucional, ou seja, não consiste de cargo privativo de profissional
de saúde, sendo preenchido pelo critério confiança, como os demais
agentes políticos auxiliares do Poder Executivo.
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO.
PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. NULIDADE DA DECISÃO QUE
DEFERIU A QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. PRECLUSÃO. ACUMULAÇÃO INDEVIDA DE CARGOS
PÚBLICOS. CARGO EFETIVO DE ENGENHEIRO CIVIL E COMISSIONADO DE SECRETÁRIO
MUNICIPAL DE OBRAS E URBANISMO. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 37, XVI DA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA. RECURSO NÃO PROVIDO (...) 5. O
cargo de Secretário Municipal de Obras e Urbanismo, de natureza eminentemente
política, não é passível de acumulação com emprego ou cargo público efetivo ou
comissionado. 6. O ressarcimento aos cofres públicos do valor indevidamente
recebido pelo servidor, em decorrência da acumulação ilegal de cargos, é medida
que se impõe. (TJ-MG - AC: 10243060024912001 MG, Relator: Bitencourt Marcondes,
Data de Julgamento: 09/10/2014, Câmaras Cíveis / 8ª CÂMARA CÍVEL, Data de
Publicação: 20/10/2014)
Portanto, o corréu CLEONALDO PEREIRA
DINIZ acumula indevidamente DOIS
CARGOS PÚBLICOS, situação que não se encontra abarcada em qualquer das
exceções acima citadas, o que impõe a obrigação de exoneração imediata do corréu
do cargo de SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE.
QUANTO AO PEDIDO DE
RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO MUNICIPAL DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE PARA
CLEONALDO PEREIRA DINIZ
Pretende
o autor, ainda, que os requeridos sejam obrigados a ressacir os valores
vertidos para o pagamento do salário de CLEONALDO PEREIRA DINIZ desde
01.01.2013, em função do acúmulo ilegal de cargos públicos.
Nesse ponto merece análise a
jurisprudência brasileira para casos de acumulação irregular de cargos.
Para
a mais recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em matéria de
acumulação irregular de cargos públicos, uma vez comprovada a efetiva prestação
do serviço e a boa-fé do servidor, estaria afastada a aplicação da Lei de
Improbidade Administrativa por se tratar de mera irregularidade. Isso é o que
se pode concluir da análise do julgamento de Agravo Regimental no Recurso
Especial 1.245.622 – RS:
ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ACUMULAÇÃO DE CARGOSPÚBLICOS. AUSÊNCIA DE DOLO OU
MÁ-FÉ. PRESTAÇÃO EFETIVA DE SERVIÇOPÚBLICO. MODICIDADE DA CONTRAPRESTAÇÃO PAGA
AO PROFISSIONALCONTRATADO. INEXISTÊNCIA DE DESVIO ÉTICO OU DE INABILITAÇÃO
MORALPARA O EXERCÍCIO DO MUNUS PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO DE MERAIRREGULARIDADE
ADMINISTRATIVA. 1. "A Lei n. 8.429/92 visa a resguardar os princípios da
administração pública sob o prisma do combate à corrupção, da imoralidade
qualificada e da grave desonestidade funcional, não se coadunando com a punição
de meras irregularidades administrativas ou transgressões disciplinares, as
quais possuem foro disciplinar adequado para processo e julgamento."
(Nesse sentido: REsp1.089.911/PE, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma,
julgado em17.11.2009, DJe 25.11.2009.) 2. Na hipótese de acumulação de
cargos, se consignada a efetiva prestação de serviço público, o valor irrisório
da contraprestação paga ao profissional e a boa-fé do contratado, há de se
afastar a violação do art. 11 da Lei n. 8.429/1992, sobretudo quando as
premissas fáticas do acórdão recorrido evidenciam a ocorrência de simples
irregularidade e inexistência de desvio ético ou inabilitação moral para o
exercício do múnus público. (Precedente: REsp 996.791/PR, Rel. Min. Herman
Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8.6.2010, DJe 27.4.2011.) Agravo regimental
improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1245622 RS 2011/0046726-8, Relator: Ministro
HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 16/06/2011, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de
Publicação: DJe 24/06/2011)
Assim,
verifica-se que, segundo a jurisprudência do STJ, a acumulação de cargos
irregular não configura necessariamente um ato de improbidade administrativa,
devendo ser considerada uma série de elementos no caso concreto.
O
primeiro aspecto a se analisar é se houve ou não a efetiva prestação dos
serviços e se a mesma se deu de forma satisfatória, sem trazer prejuízo a
nenhum dos órgãos envolvidos.
No
caso dos autos, não houve alegação de descumprimento da carga horária e os
documentos de fls. 619 e 632-637 afirmam que houve prestação de serviços pelo
requerido nos dois cargos acumulados indevidamente, inexistindo informação nos
autos de cumprimento insatisfatório das referidas atribuições.
Com
relação à boa-fé do contratado, entendo que a mesma é específica, ou seja,
refere-se apenas à vontade de exercer as atividades de maneira eficiente e não
causar prejuízo, mesmo estando o servidor ciente de que se trata de uma
acumulação irregular de cargos públicos.
Nesse
sentido:
ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. INCOMPATIBILIDADE DE
HORÁRIOS. I - A acumulação lícita de cargos exige que se atenda ao requisito da
compatibilidade de horários, a teor do art. 119 da Lei 8.112/90. II - As
sanções do art. 12, da Lei 8.429/92 não são necessariamente cumulativas,
cabendo ao magistrado a sua dosimetria. III - Não é devida a devolução dos
valores percebidos a título de salários quando verificado que o trabalho foi
efetivamente prestado, ainda que as nomeações tenham sido irregulares, visto
que seria o mesmo que admitir enriquecimento sem causa da União. IV -
Apelação provida em parte. Sentença reformada. (AC 2003.41.00.005421-8/RO, Rel.
Desembargador Federal Cândido Ribeiro.Terceira Turma. TRF1. Publicado em 21 de
setembro de 2007).
Há
que se registrar a subjetividade da expressão “valor irrisório da
contraprestação paga ao profissional” constante do Acórdão paradigma. Desde o
meu olhar, por tal expressão deve-se entender que trata-se de valor que não
excede ao que é praticado habitualmente para serviços da mesma natureza e que
não resulte em enriquecimento sem causa ou prejuízo ao Erário.
Destaque-se,
ainda, que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao julgar acumulação
irregular de cargos em municípios distintos, reforça que a boa-fé do servidor é
sempre presumida, uma vez que deve ser comprovada a má-fé de maneira
inequívoca:
EMENTA:
Remessa oficial e apelação cível voluntária. Ação civil pública. Acumulação
indevida de cargos públicos. Má-fé ausente. Direito de opção. Falta de
oportunidade para ser exercido. Improbidade administrativa não caracterizada.
Sentença confirmada. 1. Rejeitada a petição inicial da ação civil pública na
qual foi veiculada pretensão de ressarcimento do erário público, está presente
o duplo grau de jurisdição obrigatório. A remessa deve ser, de ofício,
conhecida. 2. A boa-fé sempre é
presumida. Assim, a má-fé desafia comprovação. 3. O funcionário público
que esteja acumulando mais de um cargo público de forma irregular tem o direito
de optar por apenas um deles. 4. Ausente
a prova da má-fé na acumulação indevida de cargos e não tendo sido ensejada
oportunidade para a opção, resta afastada a suposta improbidade administrativa.
Revela-se, portanto, correta a sentença que deixou de receber a petição
inicial. 5. Remessa oficial conhecida de ofício. 6. Apelação cível voluntária
conhecida. 7. Sentença que deixou de receber a petição inicial confirmada no
reexame necessário, prejudicado o recurso voluntário. (Apelação Cível N°
1.0439.08.086621-3/001. Rel. Desembargador Caetano Levi Lopes. 2ª Câmara Cível.
TJ-MG. Publicado em 05 de novembro de 2009.
Portanto, havendo prova
nos autos de que, em que pese a indevida acumulação de cargos públicos pelo
requerido, houve a efetiva prestação de serviços, entendo que a Administração Pública
não pode se locupletar da força de trabalho do réu, sob pena de configuração de
enriquecimento sem causa da municipalidade, motivo pelo qual entendo indevido o
pleito de ressarcimento dos salários pagos à CLEONALDO PEREIRA DINIZ, até a
presente data, motivo pelo qual indefiro o pleito.
Por fim, considerando que
a ação fora proposta também contra o SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO DO MUNICÍPIO,
EVILASIO CARVALHO DA SILVA, verifico que o mesmo não possui qualquer poder de
nomeação ou exoneração em relação a outro SECRETARIO MUNICIPAL, motivo pelo
qual reconheço “ex officio” sua ilegitimidade passiva para figurar na presente
demanda.
III
- DISPOSITIVO
ANTE O EXPOSTO, neste
momento concedo a liminar requerida por reconhecer o fumus boni iuris consubstanciado no acúmulo de cargos públicos
indevidamente e o periculum in mora na medida em que a manutenção do status quo
obrigaria o município a permanecer pagando salários à requerida, para
determinar a imediata suspensão de CLEONALDO PEREIRA DINIZ das atividades que
exerce como SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE, sob pena de multa diária de R$
1.000,00 (mil reais) sobre o patrimônio
pessoal do prefeito municipal, nos termos do art. 5º, §4º da Lei nº
4717/65 c/c art. 536, §1º do CPC e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente
ação popular para ANULAR O ATO DE NOMEAÇÃO DE CLEONALDO PEREIRA DINIZ para o
cargo de SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE, com efeitos a partir de 15.01.2015,
data do encerramento da sua licença não remunerada no município de Itinga/MA, tendo em vista a sua flagrante
ilegalidade com fundamento no art. 2º, “c” da Lei nº 4717/65.
Deixo de condenar os
requeridos JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, CLEONALDO PEREIRA DINIZ E MUNICÍPIO DE
JOÃO LISBOA ao ressarcimento dos salários de Secretário Municipal de Saúde, por
reconhecer a boa-fé na sua percepção já que houve efetiva prestação dos
serviços e inexistiu efetivo prejuízo ao Erário Municipal, nos termos da
fundamentação supra.
Condeno os réus JAIRO
MADEIRA DE COIMBRA e CLEONALDO PEREIRA DINIZ, solidariamente, em custas e
despesas processuais e honorários advocatícios os quais, fixo desde logo em R$
5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do art. 85, §8º do CPC.
Dispensada a remessa
necessária no termos do art. 496, §3º, II do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
João
Lisboa/MA, 25 de agosto de 2017.
Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da 1ª
Vara da Comarca de João Lisboa
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