quinta-feira, 21 de junho de 2012

SENTENÇA. CONTRATO PRELIMINAR INADIMPLIDO. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. PROCEDÊNCIA


PROCESSO N˚: 497/2011

AUTOR: CLOVIS VIEIRA REIS e MARIA AMÉLIA DO CARMO REIS
RÉUS: ADIR FERREIRA DA SILVA e REGINA FERREIRA DA SILVA


SENTENÇA


RELATÓRIO

CLOVIS VIEIRA REIS e MARIA AMÉLIA DO CARMO REIS, já qualificados, através de advogado, intentaram a presente ação de ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA contra ADIR FERREIRA DA SILVA e REGINA FERREIRA DA SILVA alegando, em síntese, que em 29.09.1989, celebraram com os réus contrato de PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL, por meio do qual os requeridos se comprometeram a vender aos requerentes o imóvel descrito na matrícula 933, fls. 243 no livro 2-G do cartório do Ofício único de Amarante do Maranhão/MA, pelo preço de Ncz$ 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos cruzados novos), dando integral quitação no ato (fls. 09).

Sustenta que a posse direta dos bens acima descritos foi entregue aos adquirentes no ato da assinatura do contrato de promessa de compra e venda em 29.09.1989, mas que não lhes foi outorgada a escritura definitiva uma vez que os vendedores fugiram da cidade por conta de um mandado de prisão preventiva expedido contra o primeiro requerido, datado de 04.10.1991, decretado pela Comarca de Grajaú/MA, motivo pelo qual requer o suprimento judicial da vontade dos requeridos.
Juntou documentos de fls. 07-14
Às fls. 16, determinei a emenda da inicial para corrigir o valor da causa, o ingresso do cônjuge no pólo ativo e o recolhimento das custas processuais, o que foi feito às fls. 18-22.
Os requeridos foram citados por edital às fls. 25, tendo decorrido in albis o prazo para contestação, motivo pelo qual foi-lhes nomeado curador especial o qual apresentou defesa por negativa geral (fls. 32).
O Ministério Público manifestou seu desinteresse na causa às fls. 34.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

Em face da ausência de resposta por parte dos requeridos, apesar de regularmente citado, decreto sua revelia e reputo-os confessos quanto à matéria de fato, nos termos do art. 319 do CPC, já que circunstância diversa não se apura dos autos.
Em face dessa decretação, mister analisar os efeitos decorrentes. A revelia enseja veracidade do que alegado na inicial, se assim se convencer o magistrado, com respaldo nas provas colacionadas aos autos, uma vez que não se presta o referido instituto a constituir direitos, sob pena de se desvirtuar a função maior que cabe ao processo.

A jurisprudência pátria inclina nesse sentido, senão vejamos:

“Mesmo presente a revelia, o reconhecimento da presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor na inicial exige prova de verossimilhança entre o fato alegado e a prova dos autos”. (RJEsp 3/248)

Na forma do que preconiza o art.330, I, do Código de Processo Civil, julgo antecipadamente a lide, em face da revelia dos requeridos.

Superada a questão processual, passo à análise do mérito.

Em sua inicial o autor alega que o contrato de promessa de compra e venda foi devidamente adimplido, mas que os requeridos até a presente data mantiveram-se inertes quanto a celebração da obrigação principal que é a assinatura da escritura pública de compra e venda do imóvel adquirido, fato que lhe está causando prejuízo, uma vez que não possui um título adequado para transferência da propriedade do imóvel, motivo pelo qual pretende com a presente ação a obtenção de suprimento judicial de autorização que permita aos autores procederem à transferência do imóvel para o seu nome.
Tecnicamente, o que pretende o autor é compelir os réus a cumprirem  os termos do contrato de promessa de compra e venda acostado às fls. 09.

Considerando que os réus até o momento permanecem inertes, somente restou ao autor a via judicial para obrigar os requeridos a procederem ao registro de seus bens ou o suprimento judicial do consentimento do réus para que fosse possível a transferência do imóvel para seus nomes.

O pleito do autor encontra respaldo na legislação pátria em que pese ter fundamentado seu pleito no Dec-Lei nº 58/37 que não se plica ao caso diante da inexistência de registro do contrato preliminar do cartório, conforme Súmula nº 167 do STF:

STF - SÚMULA Nº 167: Não se aplica o regime do decreto–lei 58/37 ao compromisso de compra e venda não inscrito no registro imobiliário, salvo se o promitente vendedor se obrigou a efetuar o registro.

A adjudicação compulsória pode ser definida, na lição de Ricardo Arcoverde Credie, como: “a ação pessoal que permite ao compromissário comprador, ou ao cessionário de seus direitos à aquisição, ajuizada com relação ao titular do domínio do imóvel – que tenha prometido vende-lo através de contrato de compromisso de compra e venda e se omitiu quanto à escritura definitiva – tendente ao suprimento judicial dessa outorga, mediante sentença constitutiva com a mesma eficácia do ato não praticado”(CREDIE, Ricardo Arcoverde. Adjudicação compulsória. 7. Ed. São Paulo, Malheiros, 1997).

Dispõem os arts. 1417 e 1418 do CC:

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.
Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.


O promitente comprador, para fazer uso do direito garantido pelo art.1418, precisa preencher os seguintes requisitos de ordem substantiva:

1-   Cumprimento da prestação que lhe competia conforme avençado no contrato;
2-   Recusa injustificada do promitente vendedor ou de terceiros a quem os direitos foram cedidos, em firmar a escritura definitiva de compra e venda do imóvel;
3-   Inexistência de cláusula de arrependimento;
4-   Registro do instrumento público ou particular no Cartório de Registro de Imóveis.


Portanto da análise e interpretação literal dos referidos dispositivos se infere que, se a promessa de compra e venda irretratável (compromisso), estiver devidamente REGISTRADA, GERA DIREITO REAL ao promitente-comprador, que poderá ingressar diretamente com “ação da adjudicação compulsória”. Na sentença, o juiz “julga procedente o pedido, lastreado em direito real do autor, para adjudicar (incorporar) o imóvel ao seu patrimônio”.

Entretanto, caso a promessa não esteja registrada, firmou o STJ na Súmula nº 239 ( O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis)  o entendimento de que, ainda assim, mesmo ausente o direito real, poderá o promitente comprador ingressar com “ação de natureza obrigacional”, lastreado nos arts.. 466B e 466C do CPC, a fim de que o juiz profira sentença para obrigar o promitente-vendedor a outorgar a escritura definitiva, sob pena de o comando sentencial surtir o mesmo efeito. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado:

“PROCESSUAL CIVIL. ADJUDICAÇÃO COMPULSORIA. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. CONTRATO CELEBRADO SEM CLAUSULA DE ARREPENDIMENTO. PREÇO DEVIDAMENTE QUITADO PELO PROMITENTE COMPRADOR. REGISTRO NO CARTORIO DE IMOVEIS. PRESCINDIBILIDADE. PARA FINS DE ADJUDICAÇÃO COMPULSORIA, NOS TERMOS DO ART. 16 DO DEL. 58, DE 1937, COMBINADO COM O ART. 640 E 641 DO CPC, E PRESCINDIVEL O REGISTRO DO CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMOVEL, CELEBRADO SEM CLAUSULA DE ARREPENDIMENTO E CUJO PREÇO JA TENHA SIDO QUITADO PELO PROMITENTE COMPRADOR. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS.” (RESP 83571/PB, Rel. Ministro DEMÓCRITO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09.09.1997, DJ 06.10.1997 p. 49883)”.

Sobre o assunto, o Conselho da Justiça Federal expediu dois Enunciados, cujos conteúdos se transcreve:

Enunciado nº 95 CJF – Art. 1418: O direito à adjudicação compulsória (art. 1418 do NCC), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula 239 do STJ). 
Enunciado nº 235 CJF  – Art. 1417: O promitente comprador, titular de direito real (art. 1417), tem a faculdade de reivindicar de terceiro o imóvel prometido à venda. 

Considerando que a função do registro do Contrato preliminar limitar-se a dar publicidade ao ato, não pode ser requisito para a procedência da presente ação, uma vez que a única e relevante diferença entre ambas as situações – contrato registrado e sem registro – é a oponibilidade perante terceiros.
Em suma, o registro do contrato preliminar no oficial competente não é requisito para que o contratante possa exigir a celebração do contrato principal, mas mero pressuposto de oponibilidade perante terceiros de boa-fé.

A doutrina chega a sugerir uma solução diversa resultado de uma interpretação construtiva dos dispositivos retro em consonância com o entendimento jurisprudencial, qual seja, a de que a adjudicação compulsória seria uma espécie do gênero execução de obrigação de fazer (art. 461 do CPC). Logo, o promitente comprador com título registrado usaria a espécie adjudicação compulsória (CC, art. 1418), enquanto o promitente comprador sem título registrado usaria o gênero do art. 461 do CPC, que alberga todos os contratos preliminares.

Feitas tais considerações passo à analise do pleito.

Dispõe o art. 461  e art. 466-B do CPC:


“Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.”

Art. 466-B. Se aquele que se comprometeu a concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a ser firmado.

O caso em tela guarda pertinência com a cláusula aberta retro, pois na execução de obrigação de fazer cabe ao juiz determinar providência que assegurem o resultado prático da demanda. In casu, observo que, a cominação de multa diária pelo descumprimento da obrigação é insuficiente para assegurar o resultado prático da presente demanda uma vez que não se tem notícias do paradeiro dos requeridos que foram embora desta cidade há mais de 20 anos.

Os requerentes provaram os fatos constitutivos de seu direito, uma vez que demonstraram com começo de prova escrita a existência da obrigação não adimplida pelo réu, cumprindo o disposto no art. 333, I do CPC.

“Art. 333. O ônus da prova incumbe:

I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”

Por outro lado, a revelia do réu fez recair sobre o mesmo as conseqüências do art. 319 do CPC:



“Art. 319. Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.”


Portanto, demonstrada a mora dos reclamados, razão assiste ao autor que pode se valer do judiciário para obter a tutela da obrigação assegurada pelo ordenamento pátrio.

DISPOSITIVO


ANTE O EXPOSTO e o que mais dos autos consta, julgo PROCEDENTE o pedido contido na inicial para SUPRIR A VONTADE DOS REQUERIDOS CONSTITUINDO A PRESENTE SENTENÇA EM TÍTULO HÁBIL PARA A TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO, NO REGISTRO IMOBILIÁRIO COMPETENTE, DO IMÓVEL   descrito na matrícula 933, fls. 243 no livro 2-G do cartório do Ofício único de Amarante do Maranhão/MA para o nome de CLOVIS VIEIRA REIS e sua esposa MARIA AMÉLIA DO CARMO REIS, mediante a prova do pagamento de todas as taxas, tributos e emolumentos relacionados à alienação de bens imóveis “ inter vivos”, com base no valor de alienação de R$ 9.000,00 (nove mil reais). 

Condeno ainda os réus ao pagamento de custas e despesas processuais e honorários advocatícios os quais fixo em R$ 622,00 (seiscentos e vinte e dois reais) a teor do disposto no art. 20, §4º do CPC.

P. R. I.

Amarante do Maranhão/MA, 21 de junho de 2012.

         Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da Comarca de Amarante do Maranhão





quarta-feira, 20 de junho de 2012

SENTENÇA. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRANSITO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA


PROC. 517/2008
SENTENÇA
1- RELATÓRIO.

CHARLEIS BARBOSA BARROS e FRANCISCO PEREIRA CAVALCANTE, através de advogado constituído, ajuizou a presente AÇÃO DE RESPONSABIIDADE CIVIL POR ATO ILÍCITO, em face de VANDERLY GOMES MIRANDA, pelos fatos e fundamentos expendidos a seguir.
Que os requerentes são genitores de PAULO JUNIO BARROS CAVALCANTE, nascido em 28.11.2006, tendo sido privados do convívio com o seu filho em 29.07.2008, por volta das 16:30h, quando o mesmo faleceu vitima de acidente de trânsito ocorrido na Rua 31 de março, próximo ao Forum desta cidade, tendo como causa mortis “parada cárdio-respiratória, traumatismo crânio encefálico” em decorrência de atropelamento em via pública pelo veículo GM/D20 CUSTOM S, PLACAS BNO 4451, ANO 1993/1993, CHASSI 9BG244NAPPC025149, conduzida pelo requerido VANDERLY GOMES MIRANDA, qualificado às fls. 02.
Afirma que a vítima possuía apenas 01 ano e 08 meses na época do acidente e que gozava de perfeita saúde e que tal fato privou os autores do amor, carinho e alegria de ter o filho consigo, fato que lhes causou profunda dor, diante da perda de um ente querido, suscetível de reparação por danos morais.
Imputa a responsabilidade do acidente a  culpa exclusiva do condutor do veículo uma vez que segundo o laudo do “auto de verificação de local de acidente de trânsito” o fato teria “como a causa o fato de condutor da unidade V1 está conduzindo seu veículo do lado da via de mão inapropriado ao sentido de direção” e pelo fato do condutor trazer consigo na cabine do veículo sua filha de 02 anos de idade, o que provaria que o requerido agiu com culpa grave consistente em imprudência e negligência.
Pleiteia, ainda, danos materiais no valor de R$ 169.320,00 (cento e sessenta e nove mil, trezentos e vinte reais) valor correspondente a 51 anos de trabalho com percepção de renda de 2/3 do salário mínimo vigente à época do sinistro.
Juntou documentos de fls. 10-25.
 Devidamente citado, o requerido apresentou contestação oportunidade em que alegou que o acidente não se deu como descrito na inicial uma vez que o requerido não agiu com imprudência ou negligência uma vez que não trafegava na contramão, nem acima da velocidade permitida e não estava distraído sendo que sua filha menor estava em cadeira própria; que o acidente se deu por culpa exclusiva dos representantes da vítima, em especial de sua genitora que se encontrava numa calçada conversando com vizinhos; que a Rua 31 de março tem tráfego nas duas mãos; que houve culpa exclusiva dos representantes da vítima, tanto que o pai do menor atribuiu a responsabilidade à mãe do menor, em plena via pública, uma vez que o menor saíra correndo no intuito de atravessar a rua e se encontrar com a mãe que estava do outro lado da via; que o requerido trafegava dentro da velocidade permitida e com as cautelas necessárias; que o menor saiu detrás de uma árvore para atravessar para o lado contrário da rua, momento em que veio a entrar na frente do veículo deste que freio mas não conseguiu evitar o acidente; que tal conclusão conta do auto de verificação de local de acidente; que tal fato é corroborado com a conclusão de que no momento do acidente a criança se encontrava 0.90 m da calçada, ou seja, no meio da via de trânsito; que em relação a alegação de que o requerido trafegava distraidamente por levar sua filha menor no interior do veículo também é inverídica uma vez que a mesma se encontrava em uma cadeira apropriada para crianças, não contribuindo de qualquer maneira para o fato; que não estão presentes os requisitos da responsabilidade civil; que inexiste nexo causal entre a conduta do requerido e o dano sofrido pelos autores; que no caso restou evidenciada a culpa exclusiva da vítima; que inexiste ato ilícito imputável ao requerido; que poderia ter ocorrido, no máximo, culpa concorrente; que é incabível o requerimento de pensão vitalícia; que inexiste dano moral indenizável uma vez que não há responsabilidade imputável ao requerido; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Às fls. 45 realizou-se audiência preliminar a qual restou infrutífera, tendo este juízo determinado o apensamento da ação penal respectiva. Às fls. 47, o requerido juntou declaração do município indicando a inexistência de sinalização vertical ou horizontal na Rua 31 de março e fls. 48 juntou nota fiscal de compra de cadeira Galzerano.
Às fls. 50-55, o autor apresenta réplica oportunidade em que reafirma os fatos constantes da inicial e impugna os documentos juntados às fls. 47 e 48.
Às fls. 58 foi designada audiência de instrução a qual somente se realizou no dia 12.04.2012, oportunidade em que foram ouvidas duas testemunhas da parte autora, na mesma assentada foi deferido o requerimento de prova emprestada da ação penal nº 533/2008, uma vez que naquela ação os autores funcionaram como assistentes de acusação.
Às fls. 85, realizou-se audiência de continuação, oportunidade em que as partes declararam não ter outras provas a produzir em audiência, motivo pelo qual foi declarada encerrada a instrução.
Às fls. 89-98, os autores apresentaram alegações finais oportunidade em que reafirma a culpa exclusiva do requerido que trafegava do lado da via de mão inapropriado ao seu sentido de direção e trazendo uma menor de dois anos na cabine de seu veículo sem acondicionamento adequado; que o art. 29 do CTB revela que requerido deveria está circulando pelo lado direito da pista de rolamento, motivo pelo qual requer a procedência da ação.
Às fls. 100-102, o requerido apresenta alegações finais reafirmando os termos da contestação afirmando a inexistência de culpa por parte do requerido, a absolvição da seara penal, a inexistência de ato ilícito imputável ao requerido, motivo pelo qual requer a improcedência da ação. Juntou documentos de fls. 103-108, qual seja, a cópia da assentada criminal da ação penal que já foi deferida como prova emprestada.
Vieram os autos conclusos para sentença.

Eis o breve relato dos fatos. Passo a decidir.

2 - DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.

2.1. MÉRITO
O direito civil consagrou um amplo dever legal de não lesar ao qual corresponde a obrigação de indenizar, aplicável sempre que, de um comportamento contrário àquele dever de indenizar, surtir algum prejuízo injusto para outrem.

Reza o art. 927 do Código Civil:

"Art. 927 - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".

Definem os arts. 186 e 187 do mesmo diploma legal:
"Art. 186 - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187 - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes" (grifo nosso).

Por conseguinte, ato ilícito é aquele praticado por terceiro que venha refletir danosamente sobre o patrimônio da vítima ou sobre o aspecto peculiar do homem como ser moral.

O dano moral é também consagrado como garantia constitucional, conforme prescreve o art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal:

"Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral, ou à imagem;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação" (grifo nosso).


PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

                                      Para a configuração da responsabilidade civil, necessário se faz a demonstração da presença dos elementos da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta (comissiva ou omissiva), o evento danoso, a culpa e nexo de causalidade. Deve ainda inexistir qualquer causa excludente da responsabilidade civil.
CONDUTA

A responsabilidade civil, tanto objetiva como subjetiva, deverá sempre conter como elemento essencial uma conduta.
Maria Helena Diniz assim a conceitua: "Ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado".
Portanto, podemos dizer que conduta seria um comportamento humano, comissivo ou omissivo, voluntário e imputável. Por ser uma atitude humana, exclui os eventos da natureza; voluntário no sentido de ser controlável pela vontade do agente, quando de sua conduta, excluindo-se, aí, os atos inconscientes ou sob coação absoluta; imputável por poder ser-lhe atribuída a prática do ato, possuindo o agente discernimento e vontade e ser ele livre para determinar-se.
No presente caso, restou devidamente demonstrada a conduta comissiva imputável ao requerido na medida em que restou incontroverso nos autos que o requerido dirigia o veículo que trafegava na Rua 31 de março e colidiu com a vítima, conforme se observa da contestação:
“ (...) Neste momento o requerido trafegava corretamente pela rua 31 de março, utilizando-se da velocidade permitida, bem como das cautelas necessárias. Porém, o menor saiu detrás de uma árvore para atravessar para o lado contrário da rua, momento em que veio a entrar na frente do veículo deste, o que impediria qualquer reação por parte do requerido (...)”.
No mesmo sentido o auto de verificação do local de acidente de trânsito de fls. 11-12:
“(...) O V1 trafegava na via pública 31 de março no sentido Prefeitura local, e conforme os relatos das testemunhas a vítima saiu bruscamente de dentro de sua residência no intuito de atravessar a via para ir ao encontro de sua mãe que se encontrava do outro lado da via, lhe aguardando, porém ao tentar atravessar a via, inadvertidamente, foi atropelada às margens da via pública a 90 (noventa) centímetros do meio fio do lado de sua residência, mesmo o veículo V1 tendo tido os freios acionados o mesmo não foi suficiente para parar o veículo a tempo de não atropelar a vítima, o impacto do atropelamento atingiu a cabeça da vítima e posteriormente o V1 passou por cima do corpo da mesma, porém desta vez não atingindo haja vista o corpo ter ficado na posição entre as rodas do V1.(...)”
EVENTO DANOSO

O dano representa uma circunstância elementar ou essencial da responsabilidade civil. Configura-se quando há lesão, sofrida pelo ofendido, em seu conjunto de valores protegidos pelo direito, relacionando-se a sua própria pessoa (moral ou física) aos seus bens e direitos. Porém, não é qualquer dano que é passível de ressarcimento, mas sim o dano injusto, contra ius, afastando-se daí o dano autorizado pelo direito.
O dano poderá ser patrimonial ou moral. Patrimonial é aquele que afeta o patrimônio da vítima, perdendo ou deteriorando total ou parcialmente os bens materiais economicamente avaliáveis. Abrange os danos emergentes (o que a vítima efetivamente perdeu) e os lucros cessantes (o que a vítima razoavelmente deixou de ganhar), conforme no art. 402 do novo Código. Já o dano moral corresponde à lesão de bens imateriais, denominados bens da personalidade (ex.: honra, imagem etc.).
O dano resta devidamente configurado através do atestado de óbito de fls. 14, onde consta como causa mortis PARADA CÁRDIO RESPIRATÓRIA, TRAUMATISMO CRÂNIO ENCEFÁLICO (VÍTIMA DE ATROPELAMENTO EM VIA PÚBLICA, NESTA CIDADE) e do exame cadavérico de fls. 15.

CULPA EM SENTIDO LATO
A noção jurídica de culpa abarca tanto a idéia de dolo, como a idéia contida na fórmula da “negligência, imprudência e imperícia”.
Por dolo entende-se o propósito de causar dano a outrem.
Já por culpa em sentido estrito, entende-se a inobservância de uma norma de conduta, seja por negligência (falta de cuidado por conduta omissiva), imprudência (falta de cuidado por conduta comissiva) ou imperícia (falta de habilidade no exercício de atividade técnica), que leva a um resultado não desejado, qual seja, a violação de um dever jurídico, ,causando dano a outrem. 
O conceito jurídico de culpa evoluiu, de modo a surgir o que chamam hoje de “concepção normativa de culpa”. Por essa concepção, a culpa passou a ser entendida como “o erro de conduta”, de modo que age com culpa aquele que age fora dos padrões de conduta esperados. Desse modo, para verificar se houve erro de conduta ou não (se houve culpa ou não), deve-se comparar a conduta concreta do agente causador do dano com a conduta que teria adotado o homem-padrão.
Ou seja, adota-se um modelo de comportamento esperado, baseado no parâmetro romanista do bonus pater famílias (o homem médio, prudente), e o compara com o comportamento do agente causador do dano, aferindo, assim, se esse agiu com culpa ou não. 

Portanto, a culpa se caracteriza quando há a violação de um dever objetivo de cuidado que se espera do homem médio. Sua caracterização depende da aferição dos chamados ELEMENTOS DA CULPA, quais sejam:

1) conduta voluntária e resultado involuntário;
2) previsão ou previsibilidade do resultado;
3) falta de cautela, cuidado, diligência.

No presente caso os requerente imputam ao requerido duas modalidades de culpa: a imprudência uma vez que o requerido estaria trafegando na contramão da pista de rolamento ou do lado esquerdo do sentindo de direção infringindo normas de transito e a negligência uma vez que estaria trazendo consigo sua filha de 02 anos de idade na cabine do veículo sem o necessário assento.

No caso em análise é evidente que o requerido trafegava em seu veículo de maneira voluntária tendo se envolvido em acidente de trânsito de maneira involuntária.
É evidente também que descumpriu o seu dever de cuidado objetivo uma vez, sem qualquer motivo explicitado nos autos,  trafegava pelo lado esquerdo da pista de rolamento infligindo normas de trânsito.
Entretanto, cumpre observar que a situação em que trafegava, ou seja, em velocidade compatível com a via ( conforme se infere dos depoimentos das testemunhas colhidos na instrução) em uma via de dupla mão de direção, conforme demonstrado a partir da declaração da municipalidade de fls. 47, não lhe era previsível no caso concreto antever que uma criança de tenra idade (01 ano e 08 meses de vida), desacompanhada de seu responsável (pai, mãe, avós, babá, etc) e sem a vigilância de qualquer pessoa, saísse “bruscamente de dentro de sua residência com o intuito de atravessar a via e ir ao encontro de sua mãe que se encontrava do outro lado” (fls. 11 e 12) não permitindo ao requerido o tempo de reação necessário para evitar o atropelamento, em que pese o acionamento do sistema de freios do veículo.
Também os autores não lograram êxito em revelar de que forma o fato de o requerido trazer consigo na cabine do veículo sua filha teria contribuído para o acidente.
Previsível é tudo aquilo que tem probabilidade de acontecer, não sendo razoável taxar como provável a brusca tentativa de uma criança de tenra idade de atravessar a rua, desacompanhada e sem vigilância dos pais ou responsáveis. No caso deve prevalecer o princípio da confiança, de forma que tal situação revela-se como excepcional.

Para Sérgio Cavalieri Filho a idéia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva.
Caio Mário da Silva Pereira destaca: A essência da responsabilidade subjetiva vai assentar, fundamentalmente, na pesquisa ou indagação de como o comportamento contribui para o prejuízo sofrido pela vítima. Assim procedendo, não considera apto a gerar o efeito ressarcitório um fato humano qualquer. Somente será gerador daquele efeito uma determinada conduta, que a ordem jurídica reveste de certos requisitos ou de certas características. Assim considerando, a teoria da responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a culpa, abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente. [...]
Segundo Carlos Roberto Gonçalves: Para obter a reparação do dano, a vítima geralmente tem de provar dolo ou culpa stricto sensu do agente, segundo a teoria subjetiva adotada em nosso diploma civil.
Sendo assim, desde meu olhar, não se infere a culpa imputada ao agente.
NEXO DE CAUSALIDADE

O nexo de causalidade consiste na relação de causa e efeito entre a conduta praticada pelo agente e o dano suportado pela vítima.
Nem sempre é tarefa fácil buscar a origem do dano, visto que podem surgir várias causas, denominadas concausas, concomitantes ou sucessivas. Quando as concausas são simultâneas ou concomitantes, a questão resolve-se com a regra do art. 942 do CC, que estipula a responsabilidade solidária de todos aqueles que concorram para o resultado danoso.
Porém, diante da problemática a respeito das concausas sucessivas, surgiram duas teorias a respeito:
a) TEORIA DA EQUIVALÊNCIA DAS CONDIÇÕES OU DOS ANTECEDENTES OU CONDITIO SINE QUA NON: estipula que existindo várias circunstâncias que poderiam ter causado o prejuízo, qualquer delas poderá ser considerada a causa eficiente, ou seja, se suprimida alguma delas, o resultado danoso não teria ocorrido.
b) TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA: para essa teoria, a causa deve ser apta a produzir o resultado danoso, excluindo-se, portanto, os danos decorrentes de circunstâncias extraordinárias, ou seja, o efeito deve se adequar à causa. O dano deve ser resultado direto e imediato da conduta.
A análise das provas colacionadas aos autos me conduzem à conclusão de que de fato o evento morte decorreu do atropelamento pelo veículo conduzido pelo requerido, entretanto, vislumbro na espécie uma causa de rompimento do nexo causal, qual seja: a culpa exclusiva da vítima.

INEXISTÊNCIA DE EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE

A responsabilidade civil será elidida quando presentes determinadas situações, aptas a excluir o nexo causal entre a conduta e o dano causado ao particular, quais sejam a força maior, o caso fortuito, o estado de necessidade e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.
A força maior é conceituada como sendo um fenômeno da natureza, um acontecimento imprevisível, inevitável ou estranho ao comportamento humano, p. ex., um raio, uma tempestade, um terremoto. Nesses casos, o Estado se torna incapacitado diante da imprevisibilidade das causas determinantes de tais fenômenos, o que, por conseguinte, justifica a elisão de sua obrigação de indenizar eventuais danos, visto que não está presente aí o nexo de causalidade.
Já na hipótese de caso fortuito, o dano decorre de ato humano, gerador de resultado danoso e alheio à vontade do agente, embora por vezes previsível. Por ser um acaso, imprevisão, acidente, algo que não poderia ser evitado pela vontade humana, ocorre, desta forma, a quebra do nexo de causalidade, daí a exclusão da responsabilidade diante do caso fortuito.
O estado de necessidade é também causa de exclusão de responsabilidade. Ocorre quando há situações de perigo iminente, não provocadas pelo agente, tais como guerras, em que se faz necessário um sacrifício do interesse particular em favor do Poder Público, que poderá intervir em razão da existência de seu poder discricionário.
A culpa exclusiva da vítima ou de terceiro é também considerada causa excludente da responsabilidade estatal, pois haverá uma quebra do nexo de causalidade, visto que o requerido não pode ser responsabilizado por um fato a que, de qualquer modo, não deu causa. Decorre de um princípio lógico de que ninguém poderá ser responsabilizado por atos que não cometeu ou para os quais não concorreu.
No caso dos autos, em que pese os autores terem tentado imputar a responsabilidade pelo óbito da vítima exclusivamente ao requerido, entendo que a conduta da vítima – uma criança de apenas 01 ano e 08 meses de vida -  de sair correndo de sua casa,  atravessar bruscamente a pista de rolamento em direção a sua genitora que se encontrava na margem oposta da via, desacompanhada de qualquer responsável e sob nenhuma vigilância, revela ao contrário do sustentado na inicial revela culpa exclusiva da vítima e grave omissão de seus responsáveis os quais podiam e deviam agir para evitar o resultado, bastando que não permitissem que o menor estivesse desacompanhado, sem qualquer vigilância e com as portas da casa abertas a permitirem a sua saída para o evento danoso:

“que o veículo passou na frente da depoente, nada lhe chamou a sua atenção, ou seja, o requerido não vinha em uma velocidade que chamasse a atenção da declarante; que logo em seguida observou quando a criança Paulo Junior, de dois anos de idade, ia saindo do portão da casa de sua avó materna, sozinho, “na carreira”; que quando o carro bateu na criança estava no asfalto; que a mãe da criança estava sentada na calçada do muro do Forum; que não sabe dizer se a autora deixou a criança sob os cuidados de algum adulto; que o requerido prestou socorro para o menor (...) (depoimento da testemunha LUCIANA SILVA, fls. 78)

“(...) QUE não recorda exatamente o dia, mas recorda que nesse dia retornava de sua colégio em companhia de uma amiga chamada Kaliane quando parou na calçada do forum para conversa com Dina, irmã da autora e a autora; que passados alguns minutos ouviu quando Dina comentou que o carro tinha passado por cima de uma pedra; que logo em seguida observaram que  a criança ora vítima saiu rolando por debaixo do carro(...) que não sabe dizer onde se encontrava a criança quando a depoente conversava com a mãe em frente ao Forum; que a velocidade do veículo não chamou a atenção da depoente; que o local do atropelamento foi  próximo ao meio fio das casas que ficam em frete ao fórum; (...) que não sabe dizer se Chaleis possuía babá que cuidasse do seu filho; que não sabe explicar porque a criança que na época tinha aproximadamente 02 anos estava andando sozinha na rua; que explicita que o acidente ocorreu em frente a casa da avó materno da criança; que os avós maternos estavam em casa e logo saíram gritando de dentro de casa em atitude de desespero  (...)(depoimento de ALICE CONCEIÇÃO, fls. 79)

Assim, pelos depoimentos colacionados, restou evidenciada a culpa exclusiva da vítima e a omissão relevante dos responsáveis legais da criança os quais, por lei, tem a obrigação de cuidado, proteção e vigilância, podendo, em tese, até caracterizar uma delito comissivo por omissão, nos termos do art. 13, §2º, a do CPB.

DOS DANOS MATERIAIS

                                      Quanto aos danos materiais pleiteados, consistentes no arbitramento de pensão mensal aos requerentes, em função da presunção de contribuição que o filho menor daria à família, também seguem a mesma sorte da análise supra dos requisitos da responsabilidade civil.
                                      Assim, havendo rompimento do nexo causal por culpa exclusiva da vítima e de terceiros, inexiste o dever de indenizar.

3- DO DISPOSITIVO.

Em face do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a presente demanda.
Condeno ainda os autores que custas e despesas processuais e honorários advocatícios no valor de R$ 1000,00, a teor do que dispõe o art. 20, §4º do CPC, porém, dispenso o pagamento tendo em vista que neste momento defiro os benefícios da justiça gratuita.
P. R. I.

Amarante do Maranhão, 19 de junho de 2012.

 


Glender Malheiros Guimarães

Juiz de Direito Titular

domingo, 17 de junho de 2012

DECISÃO. INDEFERE REVOGAÇÃO DE PREVENTIVA


DECISÃO

Proc. Nº 510/2012

INDICIADOS: ELSON ALVES MACHADO “JACARÉ” e EDSON ALVES MACHADO
VÍTIMA: EVERTON BATISTA DA CÂMARA OLIVEIRA
PEDIDO DE REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA

                             Vistos, etc.                               
                          
ELSON ALVES MACHADO “JACARÉ” e EDSON ALVES MACHADO, já qualificados, por intermédio de advogado constituído, ajuizou o presente pedido solicitando a revogação de suas prisões preventivas, para que respondam em liberdade ao processo, invocando, em síntese, ensinamento do Magistério  jurisprudencial, além de argumentos fáticos, como por exemplo, o fato deles serem primários e portadores de bons antecedentes criminais, possuindo atividade lícita e residência fixa, não se tratando de pessoas perigosas. Afirma que não subsistem os motivos que ensejaram a decretação da prisão preventiva dos requerentes, em face das suas circunstâncias pessoais favoráveis; que a manutenção da prisão dos mesmos viola o princípio da inocência descrito no art. 5º, LVII da CF/88, colacionando jurisprudência que corroboraria tal tese; que em seu depoimento o primeiro requerente afirma que fora ameaçado de morte pela vítima e que a ação fora praticada com o fim de defender-se de agressão injusta; que o disparo teria sido praticado de maneira acidental; que no caso seria incabível a decretação da prisão preventiva uma vez que teria agindo sob o manto de excludente de ilicitude nos termos do art. 314 do CPP; que os requerentes não oferecem risco à instrução criminal e nem à ordem pública, pois  tem colaborado com as investigações, motivo pelo qual requer a concessão de liberdade provisória com ou sem fiança.
Colacionou ao pedido cópia de documentos pessoais, certidão negativa de antecedentes criminais na comarca, comprovante de residência, certidão de casamento do segundo requerente, comprovante de renda do primeiro requerente, termo de posse do segundo requerente no cargo de auxiliar de administração do município.
Instado a manifestar-se  o representante do Ministério Público ofertou parecer pelo indeferimento do pleito tendo em vista a manutenção da situação fática que ensejou a decretação da prisão cautelar.(fls. )
Às fls. determinei a juntada da procuração e de certidão de antecedentes criminais dos indiciados.
É o relato do essencial.
Decido sobre o pedido.

A Legislação Processual Penal ensina que a custódia preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da Lei Penal, quando houver provas de crime e indícios suficientes da autoria (art. 312 do C.P.P.), não sendo o caso de substituição da prisão por outra medida cautelar prevista no art. 319 do CPP com a redação dada pela Lei nº 12.403/2011.
No caso ora em análise, o requerente teve sua prisão preventiva decretada em 13.06.2012, sob o fundamento de está presente o fumus comissi delicti e o periculum libertatis. Naquela decisão este Juízo vislumbrou a necessidade da prisão com o fim de garantir a ordem pública com fundamento em dados concretos emanados dos autos, havendo indícios suficientes de autoria e estando provada a materialidade, constando do inquérito policial, ainda, que existem outros registros de ocorrência policial envolvendo os indiciados com a utilização de arma de fogo, conforme se infere de excerto daquela decisão que colaciono:
“(...)Foi anexada à presente representação dois boletins de ocorrência policial registrados no dia 12.06.2012, os quais imputam aos representados delitos de porte ilegal de arma de fogo e ameaça contra a vítima CLEITON DA CONCEIÇÃO SANTOS, fato ocorrido no dia 10.06.2012  e delito de porte ilegal de arma de fogo e constrangimento ilegal contra as vítimas CLEUTON e PAULO, filho e sobrinho de RAIMUNDO NONATO FALCÃO MARINHO, respectivamente, fato ocorrido no dia 09.06.2012.(..)”

A seriedade e gravidade das imputações que recaem sobre a pessoa dos indiciados no crime em comento, em tese, cometido com violência contra a pessoa da vítima EVERTON BATISTA DA CÂMARA OLIVEIRA, somados aos dados concretos emanados dos autos acerca da ocorrência de outros delitos que também em tese teriam sido cometidos com grave ameaça contra a pessoa, fazendo uso de arma de fogo contra as vítimas acima citadas, revelam de fato uma repugnante reiteração criminosa imputável aos indiciados exigindo uma firme resposta por parte deste Juízo com  fito de fazer cessar tal comportamento antissocial.
De relevo, ainda, explicitar  as circunstâncias em que cometido o delito em tela que foram deveras reprováveis, uma vez que o acusado, durante o horário do almoço, em uma rua movimentada da cidade empunhou uma arma de fogo que trazia consigo, e após efêmera discussão, desferiu um tiro na vítima atingindo suas costas, havendo informações de que o segundo requerente também armado desferiu um segundo disparo, nas mesmas circunstâncias que teria consistido, em tese, em um tentativa incruenta de execução de crime de homicídio contra a citada vítima, sem preocupar-se com as consequência danosas de suas ações tanto relativamente à vítima quanto a populares que também estiveram no local, fato que causou correria e medo na população.
Tais fatos revelam a ausência de freios sociais dos indiciados diante da gravidade e violência do delito, ao qual se adicionam outros dois delitos semelhantes ocorridos algumas horas depois deste e também no dia seguinte, respectivamente.
Portanto, ao contrário do sustentado pelos requerentes, remanesce intacto o quadro fático que ensejou a decretação da prisão dos indiciados, estando revelada a necessidade da segregação com o fim de evitar a ocorrência de novos delitos, ou seja, remanesce a necessidade de preservação da ordem pública.
Ademais, a verificação de circunstâncias pessoais favoráveis, por si só, não autorizam a revogação da prisão quando presentes os requisitos da prisão preventiva, sem que isso revele qualquer ofensa ao princípio da presunção de inocência. Nesse sentido o enunciado da súmula de jurisprudência dominante do STJ que se aplica por analogia:

Não obstante não fazermos por ora qualquer apreciação de mérito, posto improcedente, nesta fase, reitere-se que, há nos autos sérios indícios de autoria e materialidade delitiva, sobre a matéria já decidiram os Colendos S.T.F. e S.T.J:
“PRISÃO PREVENTIVA: Fatores como a primariedade, bons antecedentes, residência fixa e profissão definida não bastam para afastar a possibilidade de prisão preventiva, quando esta é ditada por qualquer das razões previstas no artigo 312 do CPP” (STF – RHC – Rel. Sydney Sanches – RT 643/361).
PRISÃO PREVENTIVA: Presunção Constitucional de Inocência não é incompatível com a cautela. Providência expressamente regulado no art., LXI, da C.F., inteligência de seu inc. LVII.
Quanto à alegação de que a vítima teria ameaçado o primeiro indiciado de morte e, portanto, que o requerente teria praticado a ação típica sob o manto da eximente da legítima defesa, observo que os requerentes limitam-se a alegar, mas não subsidiam sua assertiva em qualquer documento anexado aos autos, ou seja, tal tese não encontra respaldo, ou mesmo indício, em qualquer elemento constante dos autos, de forma que, neste momento, em juízo de mera prelibação, não pode prosperar tal alegação.
Quanto à alegação de que não há riscos para a instrução criminal é necessário esclarecer que a prisão preventiva fora decretada com fundamento diverso. Entretanto, notícias oficiosas dão conta de que, até a presente data, o segundo requerente não fora localizado para ser preso, motivo pelo qual, entendo que quanto a este a medida restritiva anteriormente decretada também deve ser fulcrada na aplicação da lei penal que passa a fazer parte da fundamentação constante da decisão que decretou a prisão preventiva deste.
Portanto, ao contrário do que sustentam os requerentes, dos autos emanam dados concretos que autorizam a manutenção da prisão, qual seja, o risco do cometimento de novos delitos em relação ao indiciado ELSON ALVES MACHADO “JACARÉ”; e o mesmo risco em relação ao indiciado EDSON ALVES MACHADO ao qual se assoma a garantia da aplicação da lei penal diante de sua situação atual de foragido.
Embora constituindo-se a prisão cautelar em medida excepcional, este Juízo entende restarem evidências tais que corroboram situação jurídica a recomendar a manutenção da prisão dos requerentes, vez que, estando presente o binômio confirmado pelos indícios de autoria/materialidade, e a preservação da ordem pública, além da insuficiência de outras cautelares previstas no art. 319 do CPP, diante da necessidade de atuação mais firme do Estado, não reputo,  como justificável, neste momento, sua liberdade processual.
Desta feita, torna-se imperiosa, a custódia provisória dos requerentes, pelos motivos ao norte declinados, o que conduz este Juízo a INDEFERIR O PEDIDO de fls., por ser a medida mais escorreita a ser adotada no momento. 

ANTE O EXPOSTO, considerando-se o Magistério Jurisprudencial e levando-se em conta que as razões que justificaram a custódia preventiva dos indiciados neste processo subsistem, INDEFIRO o pedido de REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA, formulado pelos requerentes ELSON ALVES MACHADO “JACARÉ” e EDSON ALVES MACHADO, mantendo a prisão dos indiciados, com fundamento normativo no artigo 316 do C.P.P.
P.R. Intime-se.
                                     Cumpra-se. Ciência ao Parquet.

Amarante do Maranhão/MA, 17 de junho de 2012.


Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da Comarca de Amarante do Maranhão