terça-feira, 5 de setembro de 2017

SENTENÇA. AÇÃO POPULAR. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. SECRETARIO MUNICIPAL E DOIS CARGOS DE PROFESSOR



Processo nº 1737-12.2016.8.10.0038
Ação Popular
Requerente: JOSÉ AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA
Requerido: JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA e MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA


SENTENÇA

I - RELATÓRIO

Trata-se de AÇÃO POPULAR ajuizada por JOSÉ AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA em face do JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA e MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA, todos devidamente qualificados na inicial.

Alegou o autor que na condição de cidadão tomou conhecimento que no ano de 2014 foram instaurados diversos processos administrativos para fins de exoneração de servidores municipais em situação de acumulo de cargos indevidamente, em cumprimento a um TAC Nº 06/2013, firmado em 07.01.2014.
Afirma que o requerido FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA, mesmo ocupando os cargos de SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO E PROFESSOR DO ESTADO DO MARANHÃO E PROFESSOR DO MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA, não foi abarcado pelo referido procedimento.
Sustenta que o requerido JAIRO MADEIRA, na condição de prefeito, tinha pleno conhecimento do fato e manteve-se inerte e, ainda, que FRANCISCO HELENO não pediu licença do cargo de professor e que vinha recebendo sem trabalhar como professor, motivo pelo qual deve ser condenado solidariamente à devolução dos valores indevidamente percebidos por FRANCISCO HELENO, afirmando ainda que tal ato configura improbidade administrativa.
Finaliza requerendo a procedência da demanda com a exoneração de FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA do cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO e suspensão dos pagamentos com condenação dos requeridos ao ressarcimento ao Erário Público do valor equivalente àqueles pagos indevidamente à requerida FRANCISCO HELENO desde 01.01.2013.
Às fls. 40, postergou-se a análise do pedido de liminar para depois das respostas e determinou-se a citação dos requeridos.
Às fls. 45-50, o município junta aos autos ofício informando que o requerido FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA ocupa os cargos públicos de PROFESSORO NIVEL III, lotado no turno vespertino na U.E. DESEMB. NICOLAU DINO, data de admissão 02.02.1998 e SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO, no turno matutino.
Às fls. 51-72, o MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA apresentou contestação, oportunidade em que sustentou a inexistência de ato lesivo ao patrimônio público; que é possível a cumulação de cargo efetivo com o cargo em comissão; que é incabível a concessão da liminar; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Contestação de idêntico conteúdo foi apresentada por JAIRO MADEIRA DE COIMBRA e  FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA às fls. 73-87. Juntaram os documentos de fls. 90/108.
Às fls. 113-146, a SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO informa que o requerido, FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA, ocupa cargo efetivo de PROFESSOR III, MAT. 785543, lotado na U.I HENRIQUE DE LA ROQUE, com carga horária de 20h semanais.
                        Às fls. 147, o MP requer a concessão de prazo para análise do feito.
                        Às fls. 148, foi deferido o prazo de 30 dias para o MP.
                        Às fls. 151-152, o MP requereu novas diligências.
                        Às fls. 155-157, FRANCISCO HELENO PEREIRA DA SILVA junta declaração de que é professor efetivo do Estado do Maranhão, mas que não mais possui Condição Especial de Trabalho.
                        Às fls. 192, o município informa a carga horária do requerido FRANCISCO.                   Às fls. 195-199, o MP apresentou parecer pela procedência da ação com exoneração do requerido FRANCISCO HELENO e condenação solidária dos três requeridos a devolverem os valores indevidamente percebidos por FRANCISCO.

Vieram os autos conclusos.
É o relatório. DECIDO.

II – FUNDAMENTAÇÃO

DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO LIDE

Cumpre observar que o ordenamento jurídico brasileiro permite que o juiz conheça diretamente do pedido, proferindo sentença, nos casos em que a controvérsia gravite em torno de questão eminentemente de direito ou sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência ou ainda no caso de revelia dos réus.
Desse modo, cabível é o julgamento antecipado da lide (CPC, art. 355, I), em atenção aos princípios da economia e da celeridade processuais.

MÉRITO
A Ação Popular é um meio do qual se pode valer qualquer cidadão do povo, para comparecer perante o Estado-Juiz, referindo-lhe a existência de ato lesivo ao patrimônio público, onde quer que esteja e independentemente de quem o detenha, estendendo-se ao ataque à imoralidade administrativa ou que fira qualquer outro bem entre os que pertencem ao grupo dos interesses sociais ou individuais indisponíveis.
Tal ação tem as mesmas características de todas aquelas com que alguém se volve ao Poder Judiciário, em busca do reconhecimento da detenção de um direito, ou da tutela de qualquer dos bens assim juridicamente considerados. Toda ação tem como pressuposto, que seu autor tenha interesse e legitimidade para agir. No caso desta, apenas uma condição é requerida da parte de quem a quiser ajuizar e cuja comprovação é exigida no ato: que seja eleitor.
Os atos atacáveis via ação popular, se classificam em ATOS NULOS quando são lesivos ao patrimônio público ou quando praticados ou celebrados sem observância legal (art. 2º, § único da Lei nº 4717/65). A nulidade pode se dar por motivo de INCOMPETÊNCIA, ou seja, quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; pelo vício de FORMA e consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; por ILEGALIDADE DO OBJETO cuja ocorrência se dá, quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; ainda, por inexistência dos MOTIVOS e se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e finalmente, por desvio da FINALIDADE o que se verifica, quando o agente pratica o ato visando fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
No presente caso o autor impugna a nomeação do requerido para o cargo de SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO sob o fundamento de sua ILEGALIDADE, pois o mesmo já exercia a profissão de professor no Estado e professor no município e, sem qualquer licença, passou a acumular indevidamente o cargo de SECRETÁRIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO.
A acumulação remunerada de cargos é a situação em que o servidor ocupa mais de um cargo, emprego ou função pública, conforme previsão na Constituição Federal.  
 São considerados cargos, empregos ou funções públicas todos aqueles exercidos na administração direta, em autarquias, empresas públicas, sociedade de economia mista ou fundações da União, Estados ou Municípios, quer seja no regime estatutário ou no regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
A regra geral da acumulação remunerada de cargos, funções e empregos públicos é a sua proibição.
A acumulação remunerada é uma exceção à regra geral e somente é permitida para determinados cargos, funções e empregos públicos, previamente definidos na Constituição Federal e desde que haja compatibilidade de horários.
A acumulação de cargos, funções e empregos públicos encontra-se assim disciplinada na Constituição Federal: 
I) Artigo 37, incisos XVI e XVII (com redação dada pela EC 19/98 e EC 34/01):

“XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou científico;
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
XVII – a proibição de acumular estendese a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público;”
II) Artigo 38, III;

“Art. 38. Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicamse as seguintes disposições:
I – tratandose de mandato eletivo federal, estadual ou distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;
II – investido no mandato de Prefeito será afastado do cargo, emprego ou função, sendolhe facultado optar pela sua remuneração;
III – investido no mandato de Vereador, havendo compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo compatibilidade, será aplicada a norma do inciso anterior;” 

III) Artigo 95, parágrafo único, I (com redação dada pela EC 19/98); 

“Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:
(...)
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;”
 
IV) Artigo 128, §5º, II, letra d) - (com redação dada pela EC 19/98);

“Art. 128. O Ministério Público abrange:
(...)
§ 5o Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos ProcuradoresGerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
(...)
II – as seguintes vedações:
(...)
d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério;”

V) Artigo 142, §3º, II e III (com redação dada pela EC 19/98); 

“§ 3o Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicandoselhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:
(...)
II – o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente será transferido para a reserva, nos termos da lei;
III – o militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contandoselhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei;”

Os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias também regulamentam dois casos de acumulações de cargos públicos:
I) Artigo 17, §§ 1º e 2º; 
“Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.
§ 1o É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de médico que estejam sendo exercidos por médico militar na administração pública direta ou indireta.
§ 2o É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo exercidos na administração pública direta ou indireta.”

Deve restar claro que as possibilidades de acumulação de cargos públicos, funções públicas e empregos públicos abrangem a Administração Direta, Autarquias, Fundações, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista, suas subsidiárias, e Sociedades controladas, direta e indiretamente, pelo Poder Público.
Assim, qualquer situação não abrangida nas exceções acima configura caso de acumulação ilegal de cargos públicos. 
ANALISE DA ACUMULAÇÃO DE CARGOS DO CORRÉU FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA
No caso em análise, observo a partir dos documentos de fls. 45 e 113 que o requerido FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA ocupa junto ao município de João Lisboa os cargos de PROFESSOR NIVEL 3  e SECRETARIO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ADJUNTO (FLS. 45).
Não fosse o suficiente para configurar a ilegalidade da acumulação, constato a partir do DOCUMENTO DE FLS. 46, subscrito pelo Supervisor de Cadastro Funcional/SEDUC, oriundo da SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO, que o referido servidor ocupa um terceiro cargo público, qual seja, PROFESSOR III, MAT. 785543, LOTADO NA U.I. HENRIQUE DE LA ROQUE, MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA.
Portanto, o corréu FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA acumula indevidamente TRÊS CARGOS PÚBLICOS, situação que por si só já dispensa o enquadramento em qualquer das exceções acima citadas, pois é inadmissível que alguém acumule – EM QUALQUER SITUAÇÃO – três cargos públicos junto à ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, o que impõe a obrigação de exoneração imediata do corréu do cargo de SECRETARIO ADJUNTO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO.

QUANTO AO PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO MUNICIPAL DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE PARA FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA

                        Pretende o autor, ainda, que os requeridos sejam obrigados a ressacir os valores vertidos para o pagamento do salário de FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA desde 01.01.2013, em função do acúmulo ilegal de cargos públicos.
Nesse ponto merece análise a jurisprudência brasileira para casos de acumulação irregular de cargos.
Para a mais recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em matéria de acumulação irregular de cargos públicos, uma vez comprovada a efetiva prestação dos serviços e a boa-fé do servidor, estaria afastada a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa por se tratar de mera irregularidade. Isso é o que se pode concluir da análise do julgamento de Agravo Regimental no Recurso Especial 1.245.622 – RS:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ACUMULAÇÃO DE CARGOSPÚBLICOS. AUSÊNCIA DE DOLO OU MÁ-FÉ. PRESTAÇÃO EFETIVA DE SERVIÇOPÚBLICO. MODICIDADE DA CONTRAPRESTAÇÃO PAGA AO PROFISSIONALCONTRATADO. INEXISTÊNCIA DE DESVIO ÉTICO OU DE INABILITAÇÃO MORALPARA O EXERCÍCIO DO MUNUS PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO DE MERAIRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA. 1. "A Lei n. 8.429/92 visa a resguardar os princípios da administração pública sob o prisma do combate à corrupção, da imoralidade qualificada e da grave desonestidade funcional, não se coadunando com a punição de meras irregularidades administrativas ou transgressões disciplinares, as quais possuem foro disciplinar adequado para processo e julgamento." (Nesse sentido: REsp1.089.911/PE, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em17.11.2009, DJe 25.11.2009.) 2. Na hipótese de acumulação de cargos, se consignada a efetiva prestação de serviço público, o valor irrisório da contraprestação paga ao profissional e a boa-fé do contratado, há de se afastar a violação do art. 11 da Lei n. 8.429/1992, sobretudo quando as premissas fáticas do acórdão recorrido evidenciam a ocorrência de simples irregularidade e inexistência de desvio ético ou inabilitação moral para o exercício do múnus público. (Precedente: REsp 996.791/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8.6.2010, DJe 27.4.2011.) Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1245622 RS 2011/0046726-8, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 16/06/2011, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/06/2011)

Assim, verifica-se que, segundo a jurisprudência do STJ, a acumulação de cargos irregular não configura necessariamente um ato de improbidade administrativa, devendo ser considerada uma série de elementos no caso concreto.
O primeiro aspecto a se analisar é se houve ou não a efetiva prestação dos serviços e se a mesma se deu de forma satisfatória, sem trazer prejuízo a nenhum dos órgãos envolvidos.
No caso dos autos, não houve alegação de descumprimento da carga horária e as declarações de fls. 106-108 afirmam que houve prestação de serviços pelo requerido nos três cargos acumulados indevidamente, inexistindo informação nos autos de cumprimento insatisfatório das referidas atribuições.
Com relação à boa-fé do contratado, entendo que a mesma é específica, ou seja, refere-se apenas à vontade de exercer as atividades de maneira eficiente e não causar prejuízo, mesmo estando o servidor ciente de que se trata de uma acumulação irregular de cargos públicos.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. I - A acumulação lícita de cargos exige que se atenda ao requisito da compatibilidade de horários, a teor do art. 119 da Lei 8.112/90. II - As sanções do art. 12, da Lei 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado a sua dosimetria. III - Não é devida a devolução dos valores percebidos a título de salários quando verificado que o trabalho foi efetivamente prestado, ainda que as nomeações tenham sido irregulares, visto que seria o mesmo que admitir enriquecimento sem causa da União. IV - Apelação provida em parte. Sentença reformada. (AC 2003.41.00.005421-8/RO, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro.Terceira Turma. TRF1. Publicado em 21 de setembro de 2007).
Há que se registrar a subjetividade da expressão “valor irrisório da contraprestação paga ao profissional” constante do Acórdão paradigma. Desde o meu olhar, por tal expressão deve-se entender que trata-se de valor que não excede ao que é praticado habitualmente para serviços da mesma natureza e que não resulte em enriquecimento sem causa ou prejuízo ao Erário.
Destaque-se, ainda, que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao julgar acumulação irregular de cargos em municípios distintos, reforça que a boa-fé do servidor é sempre presumida, uma vez que deve ser comprovada a má-fé de maneira inequívoca:
EMENTA: Remessa oficial e apelação cível voluntária. Ação civil pública. Acumulação indevida de cargos públicos. Má-fé ausente. Direito de opção. Falta de oportunidade para ser exercido. Improbidade administrativa não caracterizada. Sentença confirmada. 1. Rejeitada a petição inicial da ação civil pública na qual foi veiculada pretensão de ressarcimento do erário público, está presente o duplo grau de jurisdição obrigatório. A remessa deve ser, de ofício, conhecida. 2. A boa-fé sempre é presumida. Assim, a má-fé desafia comprovação. 3. O funcionário público que esteja acumulando mais de um cargo público de forma irregular tem o direito de optar por apenas um deles. 4. Ausente a prova da má-fé na acumulação indevida de cargos e não tendo sido ensejada oportunidade para a opção, resta afastada a suposta improbidade administrativa. Revela-se, portanto, correta a sentença que deixou de receber a petição inicial. 5. Remessa oficial conhecida de ofício. 6. Apelação cível voluntária conhecida. 7. Sentença que deixou de receber a petição inicial confirmada no reexame necessário, prejudicado o recurso voluntário. (Apelação Cível N° 1.0439.08.086621-3/001. Rel. Desembargador Caetano Levi Lopes. 2ª Câmara Cível. TJ-MG. Publicado em 05 de novembro de 2009.

Portanto, havendo prova nos autos de que, em que pese a indevida acumulação de cargos públicos pelo requerido, houve a efetiva prestação de serviços, entendo que a Administração Pública não pode se locupletar da força de trabalho do réu, sob pena de configuração de enriquecimento sem causa da municipalidade, motivo pelo qual entendo indevido o pleito de ressarcimento dos salários pagos à FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA, até a presente data, motivo pelo qual indefiro o pleito.

III - DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, neste momento concedo a liminar requerida por reconhecer o fumus boni iuris consubstanciado no acúmulo de cargos públicos indevidamente e o periculum in mora na medida em que a manutenção do status quo obrigaria o município a permanecer pagando salários à requerida, para determinar a imediata suspensão de FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA das atividades que exerce como SECRETÁRIO ADJUNTO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) sobre o patrimônio pessoal do prefeito municipal, nos termos do art. 5º, §4º da Lei nº 4717/65 c/c art. 536, §1º do CPC e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação popular para ANULAR O ATO DE NOMEAÇÃO DE FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA para o cargo de SECRETÁRIO ADJUNTO  MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, com efeitos ex nunc, tendo em vista a sua flagrante ilegalidade com fundamento no art. 2º, “c” da Lei nº 4717/65.

Deixo de condenar os requeridos JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA E MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA ao ressarcimento dos salários de Secretário Adjunto Municipal de Educação, por reconhecer a boa-fé na sua percepção já que houve efetiva prestação dos serviços e inexistiu efetivo prejuízo ao Erário Municipal, nos termos da fundamentação supra.

Condeno os réus JAIRO MADEIRA DE COIMBRA e FRANCISCO HELENO PEREIRA SILVA, solidariamente, em custas e despesas processuais e honorários advocatícios os quais, fixo desde logo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do art. 85, §8º do CPC.
Dispensada a remessa necessária no termos do art. 496, §3º, II do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.
João Lisboa/MA, 25 de agosto de 2017.

 

Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa

SENTENÇA. AÇÃO POPULAR. ACUMULAÇÃO INDEVIDA DE CARGOS. SECRETARIA MUNICIPAL E DOIS CARGOS DE PROFESSORA.



Processo nº 1739-79.2016.8.10.0038
Ação Popular
Requerente: JOSÉ AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA
Requerido: JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES e MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA


SENTENÇA

I - RELATÓRIO

Trata-se de AÇÃO POPULAR ajuizada por JOSÉ AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA em face do JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES e MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA, todos devidamente qualificados na inicial.

Alegou o autor que na condição de cidadão tomou conhecimento que no ano de 2014 foram instaurados diversos processos administrativos para fins de exoneração de servidores municipais em situação de acumulo de cargos indevidamente, em cumprimento a um TAC Nº 06/2013, firmado em 07.01.2014.
Afirma que a requerida EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES, mesmo ocupando os cargos de SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL E DOIS CARGOS DE PROFESSORA DO ESTADO DO MARANHÃO, não foi abarcada pelo referido procedimento.
Sustenta que o requerido JAIRO MADEIRA, na condição de prefeito, tinha pleno conhecimento do fato e manteve-se inerte e, ainda, que EDNA MARIA não pediu licença dos cargos de professora e que vinha recebendo sem trabalhar como professora, motivo pelo qual deve ser condenado solidariamente à devolução dos valores indevidamente percebidos por EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES, afirmando ainda que tal ato configura improbidade administrativa.
Finaliza requerendo a procedência da demanda com a exoneração de EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES do cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL e suspensão dos pagamentos com condenação dos requeridos ao ressarcimento ao Erário Público do valor equivalente àqueles pagos indevidamente  à requerida EDNA MARIA  desde 01.01.2013.
Às fls. 27, postergou-se a análise do pedido de liminar para depois das respostas e determinou-se a citação dos requeridos.
Às fls. 30-44, a requerida EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES apresentou contestação, oportunidade em que sustentou a inexistência de ato lesivo ao patrimônio público; que é possível a cumulação de cargo efetivo com o cargo em comissão; que é incabível a concessão da liminar; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Contestação de idêntico conteúdo foi apresentada pelo MUNICÍPIO às fls. 62-85 que ainda juntou os documentos de fls.87-134 e pelo requerido JAIRO MADEIRA às fls. 135-152.
Às fls. 155 consta certidão de que as contestações do MUNICÍPIO E JAIRO MADEIRA foram apresentadas de forma intempestiva, motivo pelo qual foram declarados revéis às fls. 156.
Às fls. 157-237, a SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO informa que a requerida EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES, ocupa dois cargos efetivos de de PROFESSORA III, MAT. 729970 e MAT. 608638.
                        Às fls. 242-243, o MP requer que a Secretaria de Educação informe a carga horária de EDNA MARIA.
                        Às fls. 246-251, a Secretaria de Educação do Estado informa que EDNA MARIA está lotada na UE HENRIQUE DE LA ROQUE, em João Lisboa, ambas com carga horária de 20h semanais, mas que em relação a matrícula 729970, encontra-se aposentada desde 01.02.2017.
                        Às fls. 252-256, o MP apresentou parecer pela procedência da ação com exoneração da requerida EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES e condenação solidária dos três requeridos a devolverem os valores indevidamente percebidos por EDNA MARIA.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. DECIDO.

II – FUNDAMENTAÇÃO

DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO LIDE

Cumpre observar que o ordenamento jurídico brasileiro permite que o juiz conheça diretamente do pedido, proferindo sentença, nos casos em que a controvérsia gravite em torno de questão eminentemente de direito ou sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência ou ainda no caso de revelia dos réus.
No presente caso, a certidão de fls. 155, indica que as contestações apresentadas pelos réus MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA E JAIRO MADEIRA são intempestivas, motivo pelo qual declaro a revelia dos mesmos.
Desse modo, cabível é o julgamento antecipado da lide (CPC, art. 355, II), em atenção aos princípios da economia e da celeridade processuais.

MÉRITO
A Ação Popular é um meio do qual se pode valer qualquer cidadão do povo, para comparecer perante o Estado-Juiz, referindo-lhe a existência de ato lesivo ao patrimônio público, onde quer que esteja e independentemente de quem o detenha, estendendo-se ao ataque à imoralidade administrativa ou que fira qualquer outro bem entre os que pertencem ao grupo dos interesses sociais ou individuais indisponíveis.
Tal ação tem as mesmas características de todas aquelas com que alguém se volve ao Poder Judiciário, em busca do reconhecimento da detenção de um direito, ou da tutela de qualquer dos bens assim juridicamente considerados. Toda ação tem como pressuposto, que seu autor tenha interesse e legitimidade para agir. No caso desta, apenas uma condição é requerida da parte de quem a quiser ajuizar e cuja comprovação é exigida no ato: que seja eleitor.
Os atos atacáveis via ação popular, se classificam em ATOS NULOS quando são lesivos ao patrimônio público ou quando praticados ou celebrados sem observância legal (art. 2º, § único da Lei nº 4717/65). A nulidade pode se dar por motivo de INCOMPETÊNCIA, ou seja, quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; pelo vício de FORMA e consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; por ILEGALIDADE DO OBJETO cuja ocorrência se dá, quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; ainda, por inexistência dos MOTIVOS e se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e finalmente, por desvio da FINALIDADE o que se verifica, quando o agente pratica o ato visando fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.
No presente caso o autor impugna a nomeação da requerida para o cargo de SECRETÁRIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL DE JOÃO LISBOA sob o fundamento de sua ILEGALIDADE, pois a mesma já exercia dois outros cargos de professora no Estado e, sem qualquer licença, passou a acumular indevidamente o cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL.
A acumulação remunerada de cargos é a situação em que o servidor ocupa mais de um cargo, emprego ou função pública, conforme previsão na Constituição Federal.  
 São considerados cargos, empregos ou funções públicas todos aqueles exercidos na administração direta, em autarquias, empresas públicas, sociedade de economia mista ou fundações da União, Estados ou Municípios, quer seja no regime estatutário ou no regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
A regra geral da acumulação remunerada de cargos, funções e empregos públicos é a sua proibição.
A acumulação remunerada é uma exceção à regra geral e somente é permitida para determinados cargos, funções e empregos públicos, previamente definidos na Constituição Federal e desde que haja compatibilidade de horários.
A acumulação de cargos, funções e empregos públicos encontra-se assim disciplinada na Constituição Federal: 
I) Artigo 37, incisos XVI e XVII (com redação dada pela EC 19/98 e EC 34/01):

“XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou científico;
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;
XVII – a proibição de acumular estendese a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público;”
II) Artigo 38, III;

“Art. 38. Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicamse as seguintes disposições:
I – tratandose de mandato eletivo federal, estadual ou distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;
II – investido no mandato de Prefeito será afastado do cargo, emprego ou função, sendolhe facultado optar pela sua remuneração;
III – investido no mandato de Vereador, havendo compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo compatibilidade, será aplicada a norma do inciso anterior;” 

III) Artigo 95, parágrafo único, I (com redação dada pela EC 19/98); 

“Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:
(...)
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;”
 
IV) Artigo 128, §5º, II, letra d) - (com redação dada pela EC 19/98);

“Art. 128. O Ministério Público abrange:
(...)
§ 5o Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos ProcuradoresGerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:
(...)
II – as seguintes vedações:
(...)
d) exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo uma de magistério;”

V) Artigo 142, §3º, II e III (com redação dada pela EC 19/98); 

“§ 3o Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicandoselhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:
(...)
II – o militar em atividade que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente será transferido para a reserva, nos termos da lei;
III – o militar da ativa que, de acordo com a lei, tomar posse em cargo, emprego ou função pública civil temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antiguidade, contandoselhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a reserva, nos termos da lei;”

Os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias também regulamentam dois casos de acumulações de cargos públicos:
I) Artigo 17, §§ 1º e 2º; 
“Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.
§ 1o É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de médico que estejam sendo exercidos por médico militar na administração pública direta ou indireta.
§ 2o É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo exercidos na administração pública direta ou indireta.”

Deve restar claro que as possibilidades de acumulação de cargos públicos, funções públicas e empregos públicos abrangem a Administração Direta, Autarquias, Fundações, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista, suas subsidiárias, e Sociedades controladas, direta e indiretamente, pelo Poder Público.
Segundo CARVALHO FILHO: “O fundamento da proibição é impedir que o acúmulo de funções públicas faça com que o servidor não execute qualquer delas com a necessária eficiência. Além disso, porém, pode-se observar que o constituinte quis também impedir a acumulação de ganhos em detrimento da boa execução das tarefas públicas”
Assim, qualquer situação não abrangida nas exceções acima configura caso de acumulação ilegal de cargos públicos. 

ANALISE DA ACUMULAÇÃO DE CARGOS DA CORRÉ EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES
No caso em análise, em que pese a revelia dos requeridos, observo a partir dos documentos de fls. 249 que a requerida EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES ocupa junto ao ESTADO DO MARANHÃO dois cargos de PROFESSORA III e junto ao município de João Lisboa o cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE AGRICULTURA (FLS. 18-24).
Portanto, a corré EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES acumula indevidamente TRÊS CARGOS PÚBLICOS, situação que por si só já dispensa o enquadramento em qualquer das exceções acima citadas, pois é inadmissível que alguém acumule – EM QUALQUER SITUAÇÃO – três cargos públicos junto à ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, o que impõe a obrigação de exoneração imediata da corré do cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL.
Importante destacar que o fato de EDNA MARIA ter se aposentado de uma dos cargos de professora em 01.02.2017 (fls. 249) em nada modifica a conclusão acima, pois, a vedação constitucional de acumulação remunerada de cargos, empregos ou funções públicas se estende também aos proventos de aposentadoria, conforme previsão expressa do art. 37, §10 da CF:
“Art. 37(...) § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.”   
Portanto, mesmo que se alegue que o cargo de SECRETARIA MUNICIPAL seria um cargo em comissão de livre nomeação e exoneração, indubitavelmente caracteriza uma terceira fonte de renda advinda do Erário Público, o que não encontra respaldo na CF/88.
Nesse sentido o STF:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MAGISTÉRIO. DE ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS DE DOIS CARGOS DE PROFESSOR COM VENCIMENTOS DE UM TERCEIRO CARGO. ART. 11, DA EC 20/98. INAPLICABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I – Somente se admite a acumulação de proventos e vencimentos quando se tratar de cargos, empregos ou funções acumuláveis em atividade, na forma prevista pela Constituição Federal. Precedentes. II – Não é permitida a acumulação de proventos de duas aposentadorias com os vencimentos de cargo público, ainda que proveniente de aprovação em concurso público antes da EC 20/98. Precedentes. III – Agravo regimental improvido. (STF - AI: 529499 PR, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 19/10/2010, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-220 DIVULG 16-11-2010 PUBLIC 17-11-2010 EMENT VOL-02432-01 PP-00033)

QUANTO AO PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO MUNICIPAL DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE PARA EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES

                        Pretende o autor, ainda, que os requeridos sejam obrigados a ressacir os valores vertidos para o pagamento do salário de EDNA MARIA desde 01.01.2013, em função do acúmulo ilegal de cargos públicos.
Nesse ponto merece análise a jurisprudência brasileira para casos de acumulação irregular de cargos.
Para a mais recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em matéria de acumulação irregular de cargos públicos, uma vez comprovada a efetiva prestação dos serviços e a boa-fé do servidor, estaria afastada a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa por se tratar de mera irregularidade. Isso é o que se pode concluir da análise do julgamento de Agravo Regimental no Recurso Especial 1.245.622 – RS:
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ACUMULAÇÃO DE CARGOSPÚBLICOS. AUSÊNCIA DE DOLO OU MÁ-FÉ. PRESTAÇÃO EFETIVA DE SERVIÇOPÚBLICO. MODICIDADE DA CONTRAPRESTAÇÃO PAGA AO PROFISSIONALCONTRATADO. INEXISTÊNCIA DE DESVIO ÉTICO OU DE INABILITAÇÃO MORALPARA O EXERCÍCIO DO MUNUS PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO DE MERAIRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA. 1. "A Lei n. 8.429/92 visa a resguardar os princípios da administração pública sob o prisma do combate à corrupção, da imoralidade qualificada e da grave desonestidade funcional, não se coadunando com a punição de meras irregularidades administrativas ou transgressões disciplinares, as quais possuem foro disciplinar adequado para processo e julgamento." (Nesse sentido: REsp1.089.911/PE, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, julgado em17.11.2009, DJe 25.11.2009.) 2. Na hipótese de acumulação de cargos, se consignada a efetiva prestação de serviço público, o valor irrisório da contraprestação paga ao profissional e a boa-fé do contratado, há de se afastar a violação do art. 11 da Lei n. 8.429/1992, sobretudo quando as premissas fáticas do acórdão recorrido evidenciam a ocorrência de simples irregularidade e inexistência de desvio ético ou inabilitação moral para o exercício do múnus público. (Precedente: REsp 996.791/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 8.6.2010, DJe 27.4.2011.) Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1245622 RS 2011/0046726-8, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 16/06/2011, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/06/2011)

Assim, verifica-se que, segundo a jurisprudência do STJ, a acumulação de cargos irregular não configura necessariamente um ato de improbidade administrativa, devendo ser considerada uma série de elementos no caso concreto.
O primeiro aspecto a se analisar é se houve ou não a efetiva prestação dos serviços e se a mesma se deu de forma satisfatória, sem trazer prejuízo a nenhum dos órgãos envolvidos.
No caso dos autos, em qualquer momento foi alegado que EDNA MARIA não cumpria suas funções.
Com relação à boa-fé do contratado, entendo que a mesma é específica, ou seja, refere-se apenas à vontade de exercer as atividades de maneira eficiente e não causar prejuízo, mesmo estando o servidor ciente de que se trata de uma acumulação irregular de cargos públicos.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MÉDICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. I - A acumulação lícita de cargos exige que se atenda ao requisito da compatibilidade de horários, a teor do art. 119 da Lei 8.112/90. II - As sanções do art. 12, da Lei 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado a sua dosimetria. III - Não é devida a devolução dos valores percebidos a título de salários quando verificado que o trabalho foi efetivamente prestado, ainda que as nomeações tenham sido irregulares, visto que seria o mesmo que admitir enriquecimento sem causa da União. IV - Apelação provida em parte. Sentença reformada. (AC 2003.41.00.005421-8/RO, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro.Terceira Turma. TRF1. Publicado em 21 de setembro de 2007).
Há que se registrar a subjetividade da expressão “valor irrisório da contraprestação paga ao profissional” constante do Acórdão paradigma. Desde o meu olhar, por tal expressão deve-se entender que trata-se de valor que não excede ao que é praticado habitualmente para serviços da mesma natureza e que não resulte em enriquecimento sem causa ou prejuízo ao Erário.
Destaque-se, ainda, que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao julgar acumulação irregular de cargos em municípios distintos, reforça que a boa-fé do servidor é sempre presumida, uma vez que deve ser comprovada a má-fé de maneira inequívoca:
EMENTA: Remessa oficial e apelação cível voluntária. Ação civil pública. Acumulação indevida de cargos públicos. Má-fé ausente. Direito de opção. Falta de oportunidade para ser exercido. Improbidade administrativa não caracterizada. Sentença confirmada. 1. Rejeitada a petição inicial da ação civil pública na qual foi veiculada pretensão de ressarcimento do erário público, está presente o duplo grau de jurisdição obrigatório. A remessa deve ser, de ofício, conhecida. 2. A boa-fé sempre é presumida. Assim, a má-fé desafia comprovação. 3. O funcionário público que esteja acumulando mais de um cargo público de forma irregular tem o direito de optar por apenas um deles. 4. Ausente a prova da má-fé na acumulação indevida de cargos e não tendo sido ensejada oportunidade para a opção, resta afastada a suposta improbidade administrativa. Revela-se, portanto, correta a sentença que deixou de receber a petição inicial. 5. Remessa oficial conhecida de ofício. 6. Apelação cível voluntária conhecida. 7. Sentença que deixou de receber a petição inicial confirmada no reexame necessário, prejudicado o recurso voluntário. (Apelação Cível N° 1.0439.08.086621-3/001. Rel. Desembargador Caetano Levi Lopes. 2ª Câmara Cível. TJ-MG. Publicado em 05 de novembro de 2009.

Portanto, em que pese a indevida acumulação de cargos públicos pela requerida, houve a efetiva prestação de serviços, entendo que a Administração Pública não pode se locupletar da força de trabalho da ré, sob pena de configuração de enriquecimento sem causa da municipalidade, motivo pelo qual entendo indevido o pleito de ressarcimento dos salários pagos à EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES, até a presente data, motivo pelo qual indefiro o pleito.

III - DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, neste momento concedo a liminar requerida por reconhecer o fumus boni iuris consubstanciado no acúmulo de cargos públicos indevidamente e o periculum in mora na medida em que a manutenção do status quo obrigaria o município a permanecer pagando salários à requerida, para determinar a imediata suspensão de EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES das atividades que exerce na SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) sobre o patrimônio pessoal do prefeito municipal, nos termos do art. 5º, §4º da Lei nº 4717/65 c/c art. 536, §1º do CPC e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação popular para ANULAR O ATO DE NOMEAÇÃO DE EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES para o cargo de SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTENCIA SOCIAL, com efeitos ex nunc, tendo em vista a sua flagrante ilegalidade com fundamento no art. 2º, “c” da Lei nº 4717/65.

Deixo de condenar os requeridos JAIRO MADEIRA DE COIMBRA, EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES E MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA ao ressarcimento dos salários de Secretária Municipal de Agricultura, por reconhecer a boa-fé na sua percepção já que houve efetiva prestação dos serviços e inexistiu efetivo prejuízo ao Erário Municipal, nos termos da fundamentação supra.

Condeno os réus JAIRO MADEIRA DE COIMBRA e EDNA MARIA OLIVEIRA BRITO SOARES, solidariamente, em custas e despesas processuais e honorários advocatícios os quais, fixo desde logo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do art. 85, §8º do CPC.
Dispensada a remessa necessária no termos do art. 496, §3º, II do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.
João Lisboa/MA, 24 de agosto de 2017.

 

Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa