terça-feira, 19 de janeiro de 2016

SENTENÇA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APROPRIAÇÃO DE VERBAS E FRUSTRAÇÃO DA LICITUDE DA LICITAÇÃO. ATOS QUE GERAM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E VIOLAM PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO. CONDENAÇÃO.

Proc. 203-72.2012.8.10.0038
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO
RÉUS: FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, GENILDO JOÃO MAIA e ELINELSON PIMENTA DIAS


SENTENÇA

O Ministério Público Estadual moveu AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA contra FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, GENILDO JOÃO MACHADO MAIA e ELINELSON PIMENTA DIAS, já qualificados, alegando que os requeridos praticaram condutas ilegais de forma deliberada, consciente e meticulosamente planejadas consistentes em:
1.     Apropriação de recursos públicos provenientes do Convênio nº 864/2006 – SES.
2.     Aquisição de bens sem processo licitatório regular;

Sustenta suas afirmações em procedimento investigatório realizado na promotoria de Justiça de João Lisboa/MA tendo por objeto de investigação o Convênio nº 864/2006/SES destinado a aquisição de medicamentos para a municipalidade restaram evidenciadas irregularidades, descritas nas fls. 03/04 da petição inicial, a partir da prestação de contas de fls. 92-146.
Segundo o autor, tais fatos constituem atos de improbidade administrativa que geraram enriquecimento ilícito e violaram princípios da administração pública.
Ao final requer a concessão de medida cautelar de afastamento dos cargos dos dois primeiros réus e de indisponibilidade dos bens dos réus e sequestro de valores até o montante de R$ 132.316,77 atualizados monetariamente, que corresponderia ao menor valor que o requerido teria que devolver aos cofres públicos, correspondente ao somatório dos valores por si incorporados com dispêndio de dinheiro público sem licitação; e a procedência da ação para condená-lo a devolver ao Município de João Lisboa/MA, a importância de R$ 132.316,77 atualizados monetariamente, bem como a condenação dos requeridos nos termos do art. 9º, XII (uma vez), 10, VIII (uma vez), aplicando-lhe as cominações descritas no art. 12, I e II da Lei nº 8429/92 e o ônus da sucumbência.
Foi deferida liminar às fls.254-255, determinando o afastamento cautelar do primeiro requerido do Cargo de Prefeito de João Lisboa e do segundo requerido do cargo de Diretor de Compras da Prefeitura de João Lisboa, bem como foi decretada a indisponibilidade e sequestro dos bens de todos os requeridos até o montante de R$ 132.316,77.
A decisão de afastamento do prefeito foi suspensa pelo Presidente do TJMA nos autos da Suspensão de Liminar nº 15372/2012 às fls. 282-285.
Notificados pessoalmente o primeiro e segundo requeridos e, por edital, o terceiro, para apresentarem defesa preliminar, todos quedaram-se inertes, conforme certidão de fls. 414.
Às fls. 415, a inicial foi recebida e determinei a citação dos réus.
Às fls. 428, o réu GENILDO JOÃO MACHADO MAIA foi citado, tendo apresentado contestação às fls. 431-442, oportunidade em que alegou que o autor não especificou qual a conduta ímproba que teria praticado o requerido; que o requerido não teria condições de saber se as notas fiscais que lhes foram apresentadas eram falsas ou a empresa inidônea; que não está presente o dolo como elemento subjetivo da conduta; que trata-se de mera irregularidade e não de improbidade; que a prova testemunhal colhida em sede extrajudicial é frágil; que não há prova de que os medicamentos não tenham sido recebidos no hospital municipal; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Às fls. 449, o réu FRANCISCO EMILIANO R. MENEZES foi citado tendo apresentado contestação às fls. 451-463 oportunidade em que sustentou em preliminar a inépcia da inicial uma vez que o autor não teria individualizado as condutas ímprobas que imputa ao requerido dificultando sua ampla defesa; no mérito, afirma a inexistência de fraude à licitação e ausência de dolo como elemento subjetivo do tipo; que na época dos fatos o prefeito não era ordenador de despesas, mas sim sua esposa; que a responsabilidade deve ser imputada aos membros da CPL e à Assessoria Jurídica; que não há prova do ato improbo e que não houve prejuízo ao erário; que a prova testemunhal é frágil quanto ao não-recebimento dos medicamentos; que a empresa estaria com situação cadastral ativa em 26.07.2010; finaliza requerendo o acolhimento da preliminar e a improcedência da ação.
Às fls. 464, consta certidão de que o réu ELINELSON PIMENTA DIAS foi citado por edital e não apresentou contestação.
Às fls. 466-468, o Ministério Público apresentou réplica.
ÀS fls. 475 foi decretada a revelia do réu ELINELSON PIMENTA DIAS tendo-lhe sido nomeada curadora à lide a qual apresentou contestação por negativa geral (fls. 476). Na mesma oportunidade foi afasta a preliminar arguida pela réu FRANCISCO EMILIANO e fixados os pontos controvertidos para em seguida ser designada audiência de instrução.
Às fls. 484-488, foi realizada audiência de instrução, oportunidade em que foram ouvidas 04 testemunhas arroladas pelos requeridos.
Às fls. 491, o Banco do Brasil informa que o cheque de nº 850001, no valor de R$ 99.600,00 foi depositado na conta corrente da empresa E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESENTAÇÃO.
ÀS FLS. 514 foi juntado o termo de depoimento da testemunha ANA PAULA MARQUES OLIVEIRA tomado via precatória na Comarca de São Luís/MA.
Às fls. 57-60, o Ministério Público apresentou alegações finais, oportunidade em que requereu a procedência da demanda.
Às fls. 63-76, O réu Francisco Emiliano apresentou alegações finais, oportunidade em que sustentou: a fragilidade das provas da existência de ato de improbidade administrativa; que a prova testemunhal não comprova o desvio de verbas públicas; que é natural que a testemunha NILVAMAR nunca tivesse ouvido falar da empresa E Pimenta Dias, pois sua função se limitava a receber os medicamentos na farmácia do hospital; que não é verdade que o dinheiro não tenha sido usado para pagar o fornecedor; que eventual estorno do cheque não implica dizer que posteriormente tais valores não tenham sido entregues ao fornecedor; que não restou evidenciado o elemento subjetivo; que o requerido não era ordenador de despesas no município; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Às fls. 80, o réu GENILDO JOÃO MACHADO MAIA apresentou alegações finais oportunidade em que sustentou a fragilidade das provas que embasam a presente ação; que a prova testemunhal também é frágil; que as testemunhas não provaram que a mercadoria não foi entregue; que a testemunha NILVAMAR recorda da entrega de medicamentos em 2006 ou 2007 por uma empresa de São Luís e, assim, inexistindo outra empresa de São Luís noticiada nos autos, deduz que a testemuna está se referindo à E. PIMENTA DIAS; que o Banco do Brasil informa que o cheque foi pago para o fornecedor e assim, não há sentido em dizer que houve apropriação dos valores pelo réu EMILIANO; que não restou evidenciado o elemento subjetivo do tipo; que não houve dano ao erário público; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Às fls. 95-99, o réu ELINELSON PIMENTA DIAS, através de curador à lide, apresenta alegações finais, oportunidade em que sustenta que não houve a individualização da conduta do réu; que a situação cadastral da empresa em 26.07.2010 era ATIVA; que a empresa existia e forneceu os medicamentos indicados no contrato; que inexiste ato ilícito imputável ao requerido; que a secretaria de Saúde do Estado emitiu parecer técnico pela aprovação das contas do convênio; finaliza requerendo a improcedência da ação.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. DECIDO
FUNDAMENTAÇÃO
PRELIMINAR DE INÉPCIA

                                   A preliminar já foi analisada e afastada no despacho saneador de fls. 469.
                                  
DO MÉRITO

                                   A Improbidade administrativa tem fundamento no art. 37, parágrafo 4º da Constituição Federal tendo sido regulamentada pela Lei nº 8.429/92 legislação essa que tipificou em numerus apertus várias condutas que constituem atos de improbidade administrativa dividindo-as em três grandes grupos.
                                   O primeiro grupo é previsto no art. 9º e engloba os atos que causam enriquecimento ilícito.
                                   O segundo grupo está previsto no art. 10 e refere-se aos atos que causam prejuízo ao erário.
                                   O terceiro, por sua vez, está previsto no art. 11 e diz respeito aos atos que atentam contra os princípios da administração pública.
                                   O Ministério Público imputa ao réu a prática de atos de improbidade administrativa descritos nos artigos 9º, XII (uma vez) e 10, VIII (uma vez) do referido diploma legal.
                                  
DA APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE RECURSOS PÚBLICOS
           
                                   O art. 9º, XI, da Lei nº 8429/92 dispõe que constitui ato de improbidade administrativa que gera enriquecimento ilícito a incorporação ao próprio patrimônio de valores ou verbas públicas:

Art. 9º. Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei, e notadamente:
(...)
XI – incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no artigo 1º desta Lei;

                                   Analisando os autos verifico que o Ministério Público imputa aos requeridos FRANCISCO EMILIANO um conluio com os corréus GENILDO MAIA E ELINELSON DIAS com o objetivo da apropriação do valor de R$ 99.600,00 (noventa e seis mil e seiscentos reais) relativo à importância constante de três notas fiscais ideologicamente falsas, emitidas pela empresa E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESENTAÇÃO, datadas de 19.01.2007, de propriedade do terceiro requerido ELINELSON PIMENTA DIAS, nos valores de R$ 34.199,40 (fls. 107), R$ 36.886,00 (fls. 109) e R$ 33.514,60 (fls. 111), as quais foram utilizadas na prestação de contas do CONVÊNIO Nº 864/2006 – SES, celebrado entre o Município de João Lisboa e o Estado do Maranhão, através da Secretaria de Saúde.
A participação do segundo requerido GENILDO JOÃO MACHADO LIMA, que exercia o cargo de CHEFE DO DEPARTAMENTO DE COMPRAS DO MUNICÍPIO, consistiria em atestar falsamente o recebimento do material (recebimento dos medicamentos), conforme carimbo nas notas fiscais de fls. 107,109,111.
                                  
Segundo a inicial, tal empresa já se encontrava “INATIVA” e com “BAIXA DE OFÍCIO” desde 27.10.2005, motivo pelo qual as notas fiscais acima identificadas são inidôneas, nos termos do art. 27, §1º da Lei Estadual nº 7799/2002, uma vez que “emitidas por contribuinte de ICMS com inscrição baixada, suspensa ou cancelada”.

Analisando as provas, constato que às fls. 107, foi anexada aos autos a nota fiscal nº 233, emitida pela empresa E. PIMENTA DIAS COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES, relativa a compra de medicamentos, datada de 19.01.2007, num total de R$ 34.199,40 (trinta e quatro mil, cento e noventa e nove reais e quarenta centavos). Às fls. 109, foi anexada aos autos a nota fiscal nº 231, emitida pela empresa E. PIMENTA DIAS COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES, relativa a compra de medicamentos, datada de 19.01.2007, num total de R$ 36.886,00 (trinta e seis mil, oitocentos e oitenta e seis reais). Às fls. 111, foi anexada aos autos a nota fiscal nº 229, emitida pela empresa E. PIMENTA DIAS COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES, relativa a compra de medicamentos, datada de 19.01.2007, num total de R$ 33.514,60 (trinta e três mil, quinhentos e quatorze reais e sessenta centavos). Constato, ainda, que nas três notas fiscais questionadas foram apostos o carimbo e assinatura do segundo requerido GENILDO JOÃO atestando o recebimento do material.
Por outro lado, às fls. 156-169, a Secretaria de Estado da Fazenda, por sua vez, em resposta ao ofício nº 61/2011 – 1ªPJJL, subscrito pelo promotor de justiça, Dr. Tarcísio Bonfim, informa que após análise das notas fiscais e das informações disponíveis no SISTEMA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA – SIAT da Secretaria, encaminhou um relatório circunstanciado de verificação fiscal e regularidade das operações da empresa E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESENTAÇÃO onde constatou que, em 15 de setembro de 2011: consultando nosso SIAT (SISTEMA INTEGRADO DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA), a empresa encontrava-se “SUSPENSO DE OFÍCIO” desde 10/2005 em nosso cadastro. Hoje a situação fiscal é INATIVO, com status de BAIXA DE OFÍCIO (comprovantes anexos); (...) As notas fiscais 229, 231 e 233, todas de 19.01.2007 são consideradas inidôneas conforme art. 27, §1º, VII da Lei nº 7799/02 (notas emitidas após baixa do contribuinte); A empresa não efetuou qualquer recolhimento de ICMS entre 2006 e 2007; Não fora apresentada, entre 2006 e 2007, qualquer nota fiscal emitida ou destinada para o contribuinte aos postos fiscais do Maranhão. Também não há registros de notas emitidas por este, de diefs de outros contribuintes do Maranhão; Não há notas fiscais eletrônicas emitidas para este contribuinte; O contribuinte não foi localizado no endereço que consta da FAC.”(fls. 157)

Portanto, a prova anexada aos autos é robusta quanto à utilização de Notas Fiscais ideologicamente falsas com o objetivo de tentar justificar supostas despesas, num total de R$ 99.600,00, efetivadas com recursos públicos quando da prestação de contas junto a Secretaria de Saúde do Estado, de forma que se permitisse o desvio e apropriação de tais valores, em proveito próprio e dos demais réus, destacando-se que o mesmo os possuía sob sua guarda e responsabilidade em decorrência de ocupar o cargo de prefeito, no exercício de 2006/2007.
Observe-se que é a própria Receita Estadual que descarta a possibilidade de ter havido entrega dos medicamentos citados nas notas fiscais um vez que a empresa não estava em atividade, não adquiriu nenhuma mercadoria vinda de outro Estado da Federação ou do exterior e nem de outra empresa do Maranhão, pois “(...) A empresa não efetuou qualquer recolhimento de ICMS entre 2006 e 2007; Não fora apresentada, entre 2006 e 2007, qualquer nota fiscal emitida ou destinada para o contribuinte aos postos fiscais do Maranhão. Também não há registros de notas emitidas por este, de diefs de outros contribuintes do Maranhão; Não há notas fiscais eletrônicas emitidas para este contribuinte(...)” (fls. 157).
Em complemento e corroborando a farsa descortinada na inicial, várias diligências efetuadas quer pela SEFAZ/MA (fls. 158), quer pelo próprio Ministério Público (fls. 241/243) e até mesmo por oitiva da testemunha ANA PAULA MARQUES OLIVEIRA (FLS. 514) demonstram que a empresa jamais funcionou no endereço constante da sua ficha de cadastro junto à JUCEMA e à SEFAZ, tudo apontando para a fraude apontada pelo Ministério Público.
Não fosse o suficiente, nenhuma das demais testemunhas foi capaz de atestar o recebimento dos medicamentos no hospital municipal, ao contrário do que consta da resposta ao item 10 do parecer técnico de aquisição de medicamentos de fls. 145-146, pois são as próprias THAIS A. XAVIER MENEZES e SUELENE SANTOS NEVES que negam ou não recordam dos referidos recebimentos, conforme depoimentos de fls. 486 e 488.

O elemento subjetivo do tipo também restou demonstrado uma vez que agindo como agiu, restou evidenciado o dolo dos agentes, caracterizado pela livre e consciente vontade de primeiro como ex-gestor incorporar ao seu patrimônio e dos demais requeridos verbas públicas, mediante a utilização de notas fiscais falsas na respectiva prestação de contas. Para o êxito do plano, contou com as participações decisivas, conscientes e voluntárias de GENILSON JOÃO MACHADO MAIA que na condição de CHEFE DE COMPRAS DO MUNICÍPIO atestou falsamente o recebimento dos produtos para justificar o pagamento feito para ELINELSON PIMENTA DIAS, administrador da empresa E. PIMENTA DIAS que emitiu as notas fiscais falsas usadas para burlar a fiscalização e justificar as despesas.
Frise-se que a participação deste último foi decisiva para o “sucesso” da empreitada improba e criminosa, no que deve ser responsabilizado nos termos do art. 3º da LIA.
Quanto a alegação constante da contestação e alegações finais de que o réu FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES não poderia ser responsabilizado já que no ano de 2007 não atuava como ordenador de despesas, mas sim, a sua esposa ANTONIA MARIA CARNEIRO DE MENEZES, então SECRETÁRIA DE FINANÇAS DO MUNICÍPIO que inclusive foi quem assinou o cheque de fls. 149, a mesma não pode prosperar, pois, ainda que, de fato, o Sr. Prefeito não tivesse ciência dos atos ímprobos efetuados por um de seus Secretários, nem mesmo isso poderia isentá-lo de ser responsabilizado, haja vista ter sido, no mínimo, negligente.
Assim, tem-se que, não obstante a necessidade de descentralizar a administração do município, para melhor atender à população e aos serviços públicos dos quais ela se utiliza, as atividades do Executivo são de responsabilidade do Prefeito, direta ou indiretamente, seja pelo desempenho de suas funções, seja pelo dever de direção ou supervisão de sua equipe de trabalho.
Nesse sentido é muito claro o magistério de Hely Lopes Meirelles: “As atribuições do prefeito são de natureza governamental e administrativa; governamentais são todas aquelas de condução dos negócios públicos, de opções políticas de conveniência e oportunidade na sua realização, e, por isso mesmo, insuscetíveis de controle por qualquer outro agente, órgão ou Poder.”
Claro está que o prefeito não realiza pessoalmente todas as funções do cargo, executando aquelas que lhe são privativas e indelegáveis e traspassando as demais aos seus auxiliares e técnicos da Prefeitura (secretários municipais, diretores de departamentos, chefes de serviços e outros subordinados). Mas todas as atividades do Executivo são de sua responsabilidade direta ou indireta, quer pela sua execução pessoal, quer pela sua direção ou supervisão hierárquica.
Nesse sentido, colaciono o Processo Crime Nº 699801395, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Gaspar Marques Batista, Julgado em 29/06/2006:
"PREFEITO MUNICIPAL - LICITAÇÃO - FRAUDE - EMPRESAS LICITANTES PERTENCENTES A UMA MESMA PESSOA FÍSICA.
1. Fica frustrado o caráter competitivo do procedimento licitatório, se são convidados a participar do certame, três empresas de propriedade de uma mesma pessoa física, a qual mantinha estreitas relações comerciais com um dos secretários municipais, a ponto de manterem, as empresas do proponente e a do secretário, a mesma sala, para suas operações negociais.
2. Nessas circunstâncias, não há como excluir-se a responsabilidade do prefeito, pois é certo que tinha conhecimento da fraude, tratando-se de obra de vulto para um município de pequeno porte, já que consistia na reforma de prédio que serviu para sede da Prefeitura. Parcial procedência da ação penal, para condenação do prefeito e do empresário licitante." (grifei)
Também os Tribunais de Contas tem jurisprudência no mesmo sentido:

Acórdão 1.247/2006-TCU-1ª Câmara
TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DE CONVÊNIO.
1. A delegação de competência não transfere a responsabilidade para fiscalizar e revisar os atos praticados.
2.O Prefeito é responsável pela escolha de seus subordinados e pela fiscalização dos atos por estes praticados. Culpa in eligendo e in vigilando.

Acórdão 1.843/2005-TCU-Plenário

LICITAÇÃO. PEDIDO DE REEXAME. AUSÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO DE ATOS DELEGADOS. (...)
A delegação de competência não exime o responsável de exercer o controle adequado sobre seus subordinados incumbidos da fiscalização do contrato.
Suas argumentações não obtiveram êxito na pretensão de afastar sua responsabilidade. A delegação de competência não exime o responsável de exercer o controle adequado sobre seus subordinados incumbidos da fiscalização do contrato. É obrigação do ordenador de despesas supervisionar todos os atos praticados pelos membros de sua equipe, a fim de assegurar a legalidade e a regularidade das despesas, pelas quais é sempre (naquilo que estiver a seu alcance) o responsável inafastável.

Acórdão 1.619/2004-TCU-Plenário

É entendimento pacífico no Tribunal que o instrumento da delegação de competência não retira a responsabilidade de quem delega, visto que remanesce a responsabilidade no nível delegante em relação aos atos do delegado (v.g. Acórdão 56/1992 - Plenário, in Ata 40/1992; Acórdão 54/1999 - Plenário, in Ata 19/1999; Acórdão 153/2001 - Segunda Câmara, in Ata 10/2001). Cabe, por conseguinte, à autoridade delegante a fiscalização subordinados, diante da culpa in eligendo e da culpa in vigilando.

Acórdão 1.432/2006-TCU-PLENÁRIO

(...) RESPONSABILIZAÇÃO DO GESTOR PELAS ATRIBUIÇÕES DELEGADAS. FISCALIZAÇÃO DEVIDA. (…)
(...) 2. Atribui-se a culpa in vigilando do Ordenador de Despesas quando o mesmo delega funções que lhe são exclusivas sem exercer a devida fiscalização sobre a atuação do seu delegado.
Por fim o próprio STF já enfrentou a questão:
"Os Secretários exercem cargos de confiança para praticarem atos delegados pelo Prefeito, que os escolhe direta e imediatamente e tem a responsabilidade não somente pela escolha, mas também de fiscalizar diretamente seus atos. Por consequência, mostra-se inaceitável que, pelas dimensões da máquina administrativa e relacionamento direto, o Prefeito desconhecesse a liberação ilegal de pagamentos." (AI 631841/SP, Relator Min. Celso de Melo, Julgamento 24/04/2009 (Dje – 082 05/05/2009)

Quanto a alegações de que o Ministério Público não teria individualizado as condutas de cada requerido a mesma não prospera, pois, ao contrário do alegado, a inicial imputa o conluio entre os requeridos na divisão de tarefas cabendo ao FRANCISCO EMILIADO, como prefeito à época, autorizar o pagamento, ao GENILDO MAIA como Chefe de Compras atestar falsamente o recebimento do material e ELINELSON PIMENTA DIAS, como sócio-proprietário da empresa fornecer das notas falsas para justificar a despesa, em prejuízo do patrimônio público, a qual foi utilizada na prestação de contas com o fim de incorporar verba pública ao patrimônio do requeridos.

Ademais, não se trata de responsabilidade objetiva, já que o mesmo, na condição de prefeito, participou ativamente da licitação, celebrou o contrato e atestou o cumprimento do objeto, além de autorizar o pagamento e utilizar os documentos falsos em sua prestação de contas junto a Secretaria de Saúde para justificar a despesa, de forma que se presume a incorporação da verba ao seu patrimônio e dos corréus.

Observe-se que nos termos do art. 9º, caput, da Lei nº 8429/92, o elemento subjetivo do tipo exige o dolo.

Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TIPIFICAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO, NAS HIPÓTESES DOS ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10). PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. RECURSO PROVIDO.

(STJ - EREsp: 479812 SP 2007/0294026-8, Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de Julgamento: 25/08/2010, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 27/09/2010)


QUANTO À AUSÊNCIA DE PROCESSO LICITATÓRIO

                                   Sustenta o Ministério Público que o requerido, durante a sua gestão no ano de 2006, não realizou licitação para a contratação da empresa E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESENTAÇÕES com o fim de aquisição de medicamentos para a execução do CONVENIO Nº 864/06 – SES.
                                   O art. 10, VIII da Lei nº 8429/92 dispõe que constitui ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao Erário frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá­lo indevidamente:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no artigo 1º desta Lei, e notadamente:
(...)
 VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá­lo indevidamente;

                                   “Frustrar a licitação, para a Lei nº 8429/92, compreende qualquer conduta de agente público e/ou competidor, individual ou plural, destinada a desviar a competição pública pré-processual, transformando o certame de seleção de eventuais contratantes com o Poder Público em ocasião para favorecimentos, fraudes e toda espécie de expedientes ilícitos tendentes a prestigiar os interesses particulares em prejuízo do interesse público.” (FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade Administrativa. 2ª Ed.São Paulo: Atlas, 2014, p.264)
                                   Analisando os autos verifico que o Ministério Público imputa ao requerido a fraude no procedimento licitatório da contratação de empresa para o fornecimento de medicamentos para a saúde pública de João Lisboa/MA, no ano de 2006, com recursos oriundos do convênio nº 864/2006 celebrado entre o município de João Lisboa e o Estado do Maranhão através da Secretaria Estadual de Saúde.
Segundo a inicial, o certame licitatório foi realizado com inúmeros vícios que macularam sua licitude, dentre os quais o fato de a empresa vencedora do certame E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESETAÇÕES não mais existia quando participou do processo licitatório deflagrado, autorizado e homologado por ato do primeiro requerido.

Apreciando as provas, constato que de fato a licitante vencedora não poderia ter participado da concorrência, pois não possuíam habilitação técnica e fiscal na época da licitação.
Tais fatos estão demonstrados nos autos a partir da simples verificação dos documentos de fls. 157/169, emanados da SEFAZ/MA que atestam que desde dois anos antes da licitação a empresa estava em situação de “SUSPENSO DE OFÍCIO” desde outubro de 2005, com situação fiscal de INATIVO junto ao SISTEMA INTEGRADO DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, no mínimo a partir de 15.09.2011 (fls. 157); bem como dos documentos de fls. 241-243, emanado do SETOR DE INTELIGENCIA do Ministério Público Estadual.
Portanto, as provas demonstram que houve, de fato, burla ao procedimento licitatório já que no mínimo a licitante vencedora não poderia participar do certame.
Lado outro, destaco que o dinheiro da licitação foi todo sacado de uma só vez, mediante cheque depositado na conta da empresa, conforme cópia do cheque (fls. 149) e extratos de fls.150-152, cujo sócio-administrador é o terceiro requerido.

O réu FRANCISCO EMILIANO possuía a guarda e responsabilidade dos recursos públicos em decorrência de ocupar o cargo de prefeito, no exercício de 2006.
Portanto, tenho como demonstrados os fatos constitutivos do direito do autor, na medida em que restou evidenciada a burla ao procedimento licitatório (CPC, art. 333, I), tendo, ainda, sido demonstrado o prejuízo ao erário público, motivo o caso é de procedência do pedido.

                                   O elemento subjetivo do tipo também restou demonstrado uma vez que agindo como agiu, restou evidenciado o dolo do réu FRANCISCO EMILIANO, caracterizado pela livre e consciente vontade de frustrar a licitude do procedimento licitatório, mediante a permissão e habilitação de empresa sem capacidade técnica e fiscal, maculando dessa forma os princípios da legalidade, moralidade e concorrência, inviabilizando a efetivação da eficiência administrativa. De igual forma restou demonstrada o dolo como elemento volitivo da conduta do requerido ELINELSON PIMENTA DIAS, o mesmo, na condição de sócio-administrador tinha plena ciência da situação fiscal e técnica da empresa E. PIMENTA DIAS COMERCIO E REPRESENTAÇÃO e, ainda assim participou da licitação ciente de que se tratava de mera formalidade, uma mera etapa da fraude.

Quanto a alegação constante da contestação de que a responsabilidade não seria do prefeito, mas sim de sua equipe técnica (Comissão Permanente de Licitação e Assessoria Jurídica), a mesma não prospera, pois, é o prefeito quem escolhe tais pessoas para ocupar tais cargos de confiança, motivo pelo qual, se eventualmente escolheu mal, incide em culpa in elegendo quanto à escolha de seus subornados para cargos de tamanho relevo e responsabilidade na Administração Pública. Além disso, o réu participa ativamente do processo licitatório, pois é ele quem homologa o procedimento (fls. 127), celebra o contrato (fls. 133-137) e determina os pagamentos.

Observe-se que nos termos do art. 10, VIII, da Lei nº 8429/92, o elemento subjetivo do tipo exige o dolo ou culpa.

Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TIPIFICAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO, NAS HIPÓTESES DOS ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10). PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. RECURSO PROVIDO.

(STJ - EREsp: 479812 SP 2007/0294026-8, Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de Julgamento: 25/08/2010, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 27/09/2010)


Por tais razões, tenho por configurado os atos ímprobos imputados ao requerido, previstos no art. 10, VIII, da Lei nº 8429/92.
                                  

DISPOSITIVO


Em razão do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação de improbidade administrativa para CONDENAR os réus  FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES e ELINELSON PIMENTA DIAS pelos atos descritos nos artigos 9º, XI e 10, VIII, todos da Lei 8.429/1992, e o réu GENILDO JOÃO MACHADO MAIA, pelo ato descrito nos artigos 9º, XI condenando-os solidariamente nas seguintes penas:
QUANTO AO RÉU FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES E ELINELSON PIMENTA DIAS
a)     Pelos atos descritos no art. 9º, XI, da Lei 8.429/1992, referentes a apropriação indevida de recursos públicos, a ressarcir ao MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA/MA a quantia correspondente ao prejuízo sofrido pela municipalidade, num total de R$ 99.600,00 (noventa e nove mil e seiscentos reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês, a contar desde a data das supostas compras (22.01.2007), a teor do art. 398 do CC e das Súmulas n. 43 e 54 do E. STJ. Condeno os réus ainda: à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos, pela gravidade do ato que configura inclusive delito de peculato-apropriação em prejuízo da saúde pública municipal; ao pagamento de multa civil no montante correspondente a duas vezes o valor do acréscimo patrimonial (prejuízo sofrido pelo município); e, por fim, à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.
b)    Pelos atos descritos no art. 10, VIII, da Lei 8.429/1992, referentes a ausência de processo licitatório (dispensa indevida de licitação), a ressarcir ao MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA/MA a quantia correspondente ao prejuízo sofrido pela municipalidade, num total de 99.600,00 (noventa e nove mil e seiscentos reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês, a contar desde a data de cada dispensa indevida de licitação, a teor do art. 398 do CC e das Súmulas n. 43 e 54 do E. STJ. Condeno os réus ainda: à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos, pela gravidade do ato que ofendeu o direito a livre concorrência, impedindo-a; ao pagamento de multa civil no montante correspondente a duas vezes o prejuízo sofrido pelo município; e, por fim, à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
QUANTO AO RÉU GENILDO JOÃO MACHADO MAIA
a)     Pelos atos descritos no art. 9º, XI, da Lei 8.429/1992, referentes a apropriação indevida de recursos públicos, a ressarcir ao MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA/MA a quantia correspondente ao prejuízo sofrido pela municipalidade, num total de R$ 99.600,00 (noventa e nove mil e seiscentos reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês, a contar desde a data das supostas compras (22.01.2007), a teor do art. 398 do CC e das Súmulas n. 43 e 54 do E. STJ. Condeno o réu ainda: à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de oito anos, pela gravidade do ato que configura inclusive delito de peculato-apropriação em prejuízo da saúde pública municipal; ao pagamento de multa civil no montante correspondente a duas vezes o valor do acréscimo patrimonial (prejuízo sofrido pelo município); e, por fim, à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

Em face do resultado do julgamento, confirmo os efeitos da cautelar de indisponibilidade dos bens dos requeridos deferida às fls. 254-255-v, fixando, entretanto, o quantum indisponível no valor de R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais), valor aproximado do somatório das condenações para tornar indisponíveis os bens imóveis dos réus, eventualmente existentes nesta comarca e em outras comarcas, para garantir eventual ressarcimento ao erário público, em montante suficiente para suportar o pagamento de R$ 600.000,00 (novecentos mil reais), valor aproximado do somatório das condenações.

Oficie-se ao cartório de registro de imóveis local, da Comarca de Imperatriz/MA, Grajaú/MA, Tocantinópolis/TO, Araguaína/TO, Palmas/TO e São Luís/MA para que averbe à margem dos registros de imóveis eventualmente em nome dos réus, a indisponibilidade dos referidos bens.

A liquidação da presente sentença dar-se-á por simples cálculos a cargo do autor.
Tendo em vista a sucumbência dos réus, condeno-os ao pagamento das custas processuais. Deixo de condenar em honorários tendo em vista que o autor é o Ministério Público Estadual.
 Outras Diligências:

a) Intime-se o Município de João Lisboa/MA, a fim de que tome conhecimento da presente sentença.
b) Após o trânsito em julgado da sentença, oficie-se à Câmara Municipal, remetendo-lhes cópia dessa decisão, para os fins de direito e, especialmente, para as anotações, nos registros respectivos, da proibição acima determinada, bem como ao Tribunal Regional Eleitoral – TRE/MA e ao Cartório da 58ª Zona Eleitoral, acerca da suspensão dos direitos políticos pelo prazo epigrafado, nos termos do art. 15, V, e art. 37, § 4º, da Constituição Federal e art. 71, inciso II, do Código Eleitoral.
c) Com o trânsito em julgado, inclua-se a presente condenação no Cadastro do CNJ de condenados por atos de improbidade (Resolução nº 44 de 20 de novembro de 2007).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se as partes.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
                         
João Lisboa/MA, 18 de janeiro de 2016.

 



Juiz Glender Malheiros Guimarães


Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa

SENTENÇA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CONVÊNIO COM ATRASO EXCESSIVO. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO. CONDENAÇÃO.

PROC. 167-93.2013.8.10.0038

Vistos em Correição.

O Município de João Lisboa/MA moveu ação de RESSARCIMENTO DE DANO C/C IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA contra FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, já qualificado, alegando que este, na condição de ex-prefeito municipal do município de João Lisboa/MA, não prestou contas referentes ao convênio nº 91/2012 celebrado com a Secretaria Estadual de Cultura que teve por objeto a realização do Carnaval de 2012 no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Às fls. 30-31-v, a liminar quanto à determinação da exclusão do nome do município do cadastro de inadimplentes foi indeferida.
Às fls. 33-34 consta um pedido de reconsideração que também foi indeferido às fls. 38.
Às fls. 39 este juízo determinou a notificação do requerido para apresentação de manifestação escrita.
Às fls. 44-45-v, o requerido apresenta defesa prévia, oportunidade em que sustenta inépcia da inicial uma vez que a verba foi usada e as contas foram prestadas; no mérito, sustenta que toda a documentação referente ao convenio questionado será juntada oportundamente; que o requerido não praticou qualquer conduta que caracterize improbidade administrativa; que não há demonstração do dolo como elemento subjetivo da conduta imputada ao agente; finaliza requerendo a rejeição da inicial. Juntou documentos de fls. 46-88.
Às fls. 92, a inicial foi recebida tendo sido determinada a citação do réu para oferecer contestação.
Às fls. 94, o advogado do réu renuncia ao mandato às fls. 95, determinou-se a intimação do réu para constituir novo advogado.
Às fls. 98-103, o réu, por sua nova advogada, apresentou contestação oportunidade em que alegou em preliminar a inépcia da inicial alegando inexistir na inicial uma causa de pedir, pois as contas foram prestadas, ainda que tardiamente, conforme se verifica do protocolo de fls. 46; no mérito, sustenta que o pedido encontra-se prejudicado, já que não mais subsiste a ausência de prestação de contas; que inexiste a demonstração do dolo como elemento subjetivo da conduta imputada ao agente; que não há prova da improbidade administrativa; que o atraso na prestação de contas não induz a ocorrência de fraude; que inexiste dano ao erário; finaliza requerendo a improcedência da ação.
Ás fls. 106, este juízo determinou a intimação do autor para réplica e do MP para intervir no feito.
Às fls. 108-113, o município de João Lisboa apresenta réplica, oportunidade em que refuta a preliminar e no mérito questiona a validade dos documentos apresentados nos autos.
Às fls. 120, o MP manifesta-se nos autos requerendo que seja oficiado às Secretaria de Cultura para que a mesma informe o recebimento ou não da prestação de contas relativa ao convênio.
Às fls. 121, foi deferida a cota ministerial.
Às fls. 123-140, a Secretaria Estadual de Cultura encaminha documentação informando que as contas referentes ao Convênio nº 91/2012 SECMA informando que as contas foram apresentadas em atraso e reprovadas, tendo sido tomadas providências para a Tomada de Contas Especial.
Às fls. 141, este juízo afastou a preliminar de inépcia da inicial e determinou diligências, intimando-se ainda as partes para especificarem as provas que pretendem produzir.
Às fls. 145-210, a Secretaria de Cultura encaminha cópia integral da prestação de contas do convênio.
Às fls. 212 consta certidão da inercia das partes quanto à especificação das provas.
Às fls. 214-216, o Ministério Público oferta parecer pugnando pela procedência da demanda.
É o relatório. DECIDO.

FUNDAMENTAÇÃO

DA PRELIMINAR

INÉPCIA

Suscita o réu a inépcia da presente ação tendo em vista que as contas foram prestadas, ainda que tardiamente, no curso do processo.

Sem razão.

O alegado abandono da causa não guarda nenhuma relação com a inépcia da inicial cujas causas encontram-se elencadas taxativamente no art. 295, § único do CPC:

Art. 295. A petição inicial será indeferida:
I – quando for inepta;
(...)
Parágrafo único. Considera-se inepta a petição inicial quando:
I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
III – o pedido for juridicamente impossível;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.

Não sendo o caso de qualquer das hipóteses enumeradas, a preliminar não merece acolhida.

DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE

                                   Entendo que o caso é de julgamento antecipado da lide, uma vez que a questão de mérito, em que pese ser de fato e direito, está provada documentalmente sendo desnecessária a produção de qualquer outra prova em audiência a teor do disposto no art. 330, I do CPC.
                                   Importante frisar, ainda, que em que pese intimadas, as partes não requereram a produção de provas em audiências.

MÉRITO

DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA QUE VIOLOU PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Primeiramente, impende ressaltar que a improbidade administrativa é um dos maiores males envolvendo a máquina administrativa de nosso país e um dos aspectos negativos da má administração que mais justificam a implementação de um maior controle social. A expressão designa, tecnicamente, a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da administração pública de seus preceitos basilares de moralidade, legalidade e impessoalidade, ferindo de morte os princípios da Carta Republicana.
O conceito de improbidade é bem mais amplo do que o de ato lesivo ou ilegal em si. É o contrário de probidade, que significa qualidade de probo, integridade de caráter, honradez. Logo, improbidade é o mesmo que desonestidade, falta de probidade.
A Lei Federal nº 8.429/92 disciplina a matéria em questão, estabelecendo que configura improbidade administrativa o ato praticado por agente público que importe (i) enriquecimento ilícito, (ii) prejuízo ao erário e (iii) violação aos princípios da administração pública (arts. 9, 10 e 11 da Lei nº. 8.429/92).
Ressalte-se que o referido diploma legal abrange todas as pessoas nomeadas como agentes públicos, quer integrantes da administração direta, indireta e fundacional, ainda que no exercício da função em caráter transitório ou sem remuneração.
O douto José Afonso da Silva assim descreve:
14. ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. (...) Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada pelo dano ao erário e corresponde vantagem ao ímprobo ou a outrem (...). O grave desvio de conduta do agente público é que dá à improbidade administrativa uma qualificação especial, que ultrapassa a simples imoralidade por desvio de finalidade[1].

Como se vê, o renomado constitucionalista destaca a importância do princípio constitucional previsto no art. 37 da Carta Magna na determinação do que seja imoralidade administrativa, lembrando que não basta apenas a ilegalidade para que reste configurada.
Já Maria Sylvia Zanella di Pietro ensina que, para que um ato possa acarretar a incidência das penalidades estabelecidas na Lei de Improbidade Administrativa, são necessários os seguintes elementos:
a) sujeito passivo: uma das entidades mencionadas no art. 1º da Lei nº 8.429;

b) sujeito ativo: o agente público ou terceiro que induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta (arts. 1º e 3º);

c) ocorrência do ato danoso descrito na lei, causador de enriquecimento ilícito para o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado contrato os princípios da Administração Pública; o enquadramento do ato pode dar-se isoladamente, em uma das três hipóteses, ou, cumulativamente, em duas ou nas três;

d) elemento subjetivo: dolo ou culpa.[2]

Ao discorrer sobre o elemento volitivo, anota, ainda, a referida autora:
O enquadramento na lei de improbidade exige culpa ou dolo por parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto. (...) a aplicação da lei de improbidade exige bom-senso, pesquisa da intenção do agente, sob pena de sobrecarregar-se inutilmente o judiciário com questões irrelevantes, que podem ser adequadamente resolvidas na própria esfera administrativa. A própria severidade das sanções previstas na Constituição está a demonstrar que o objetivo foi de punir infrações que tenham um mínimo de gravidade, por apresentarem conseqüências danosas para o patrimônio público (em sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para terceiros. A aplicação das medidas previstas na lei exige observância do princípio da razoabilidade, sob o seu aspecto da proporcionalidade entre meios e fins.[3]

A doutrina direciona-se, portanto, sobre a necessidade de se extrair da conduta um elemento volitivo, rechaçando-se a possibilidade de responsabilidade civil objetiva, decorrente, pura e simplesmente, da infringência à norma jurídica. Em igual sentido, posicionou-se a jurisprudência, a exemplo das ementas abaixo transcritas:
ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. Embora tenha havido discrepância inicial, pacificou a jurisprudência desta Corte em reconhecer que as condutas descritas no art. 11 da Lei de Improbidade dependem da presença do dolo, ainda que genérico. Consequentemente, afasta-se a responsabilidade objetiva dos administradores, não se fazendo necessária a demonstração da ocorrência de dano para a  Administração Pública. Precedentes. 2. Embargos de divergência não providos. (STJ – Primeira Seção. EREsp 917437/MG – Embargos de Divergência em Recurso Especial 2008/0236837-6. Relator: Min. Castro Meira. DJe 22/10/2010).


PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. TIPIFICAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO, NAS HIPÓTESES DOS ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10) PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. RECURSO PROVIDO (STJ - Primeira Seção. EREsp 479812/SP Embargos de Divergência em Recurso Especial 2007/0294026-8 – Relator: Min. Teori Albino Zavascki. DJE 27/09/2010).

De outro viés, anoto ainda que a Administração Pública é informada por vários princípios constitucionais, entre os quais se destaca o da legalidade administrativa, o que implica afirmar que toda ação do agente público deve estar expressamente prevista em lei.
Compulsando os autos, extraio que o requerido FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, na condição de prefeito do município de JOÃO LISBOA, celebrou, na data de 15 de fevereiro de 2012, convênio com o Estado do Maranhão, através da Secretaria Estadual de Cultura, cujo objeto era execução do projeto “Carnaval  2012”, conforme instrumento contratual colacionado às fls.21-29.
Examinando o referido instrumento do convênio, verifico que FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES obrigou-se, mediante o recebimento do importe de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), a executar o objeto do convênio. A vigência do convênio era da data da assinatura (15.02.2012) até 30.05.2012, tendo a convenente o prazo de 60 dias, após o término da vigência, para prestação de contas dos recursos recebidos da concedente.
Em sua defesa prévia e contestação, sustenta o réu a carência da ação por perda do objeto, pois junta prova de que enviou as prestações de contas à Secretaria de Cultura referente ao convênio nº 91/2012 conforme protocolo e ofícios de fls. 46.

Nesse aspecto, cabe ressaltar que a prestação de contas foi enviada com atraso de mais de 01 (um) ano, pois segundo a cláusula oitava do convênio (fls. 153) as contas deveriam ser prestadas em 60 dias do término da vigência do convênio, seja, considerando que a vigência do convênio estava compreendida no período de 15.02.2012 a 30.05.2012 (cláusula décima primeira), tais contas deveriam ser prestadas até 30.07.2012, mas somente foram protocoladas em 21.08.2013 (fls.46), ou seja, com mais de um ano de atraso e seis meses após o ajuizamento da presente ação (25.02.2013).

Dessarte, não há dúvida de que o réu infringiu as normas que o obrigavam, na qualidade de administrador da coisa pública, a prestar contas tempestivamente de numerários repassados pelo Governo Federal para ser investido em benefício das comunidades locais, inclusive causando embaraços ao Município quando da realização de novos convênios.

Note-se que não se aplica ao caso vertente o posicionamento jurisprudencial que isenta da incidência da Lei de Improbidade o mero atraso na prestação de contas, haja vista que houve injustificada delonga: a prestação relativa a 2012 veio a ser apresentada ao órgão competente da SECRETARIA ESTADUAL DE CULTURA após mais de um ano, e isso depois de provocação do ex-gestor por via judicial (6 meses após o ajuizamento da demanda).

Ratifico que o STJ, guardião da lei federal, tem entendido que o simples atraso na prestação de Contas não configura ato de improbidade administrativa, todavia a hipótese em exame é distinta. No caso, a prestação de contas somente ocorreu após o ajuizamento da ação, quando já exauridos seus efeitos nefastos à municipalidade, ou seja, após o Município se encontrar inadimplente perante o Estado e, conseqüentemente, com os repasses de verbas suspensos. Assim, adotar esse fundamento constituiria a criação de causa extintiva da improbidade administrativa (como o pagamento na esfera penal dos crimes tributários), o que, efetivamente, não me parece possível tendo em vista que a ação visa tutelar direitos indisponíveis (LIA, art. 17, § 1º).

Neste diapasão:

APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CONVÊNIO. ATRASO DESPROPORCIONAL. DOLO DO AGENTE CARACTERIZADO. I - O atraso desproporcional e desarrazoado na apresentação das contas, que ocorreu apenas após a propositura da ação originária e mais de 8 (oito) meses após encerrado o prazo para a sua devida prestação, caracteriza ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/92. II - A conduta dolosa do agente público está caracterizada, in casu, pela inexistência de justificativa para o atraso na prestação de contas e, por via de consequência, pela vontade livre e consciente de agir em desacordo com a lei. III - Apelo provido. (Apelação Cível nº 30659/2011 (115268/2012), 1ª Câmara Cível do TJMA, Rel. Raimunda Santos Bezerra. j. 26.04.2012, DJe 29.05.2012).

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. LEI 8.429/1992 ART. 11, VI. PRESTAÇÃO DE CONTAS APÓS O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. ATRASO. OMISSÃO. ATO DE IMPROBIDADE. RAZOABILIDADE. REJEIÇÃO DA INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em que pese haver entendimento jurisprudencial de que a prestação de contas tardia afasta a hipótese de ato de improbidade nos termos do art. 11, inc. IV, da Lei 8.429/1992, o atraso desproporcional e desarrazoado caracteriza ato ímprobo, uma vez que a apresentação das contas ocorreu só após a propositura da demanda e mais de 1 (um) ano e meio após o termo final para a sua devida prestação. 2. Para a caracterização de ato de improbidade, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou ser necessário, tão somente, comprovar a ocorrência de culpa "lato sensu" (dolo direto ou eventual ou culpa) para a caracterização de ato de improbidade. Restariam feridos os preceitos principiológicos da Lei de Improbidade Administrativa caso fosse exigido 'dolo direto' na hipótese, na medida em que ficaria por demais dificultada a prova da conduta, mediante necessidade de ser demonstrado o agir com propósito lesivo (ao patrimônio ou aos princípios). 3. Está caracterizado, em tese, na hipótese, ato de improbidade que atentou contra os Princípios da Administração Pública, não sendo cabível, portanto, a rejeição da inicial, com fundamento no § 8º do artigo 17 da LIA. 4. Apelações providas. (Apelação Cível nº 2007.37.00.004400-0/MA, 4ª Turma do TRF da 1ª Região, Rel. Mário César Ribeiro, Rel. Convocado Guilherme Mendonça Doehler. j. 16.01.2012, unânime, DJ 30.01.2012).

Com efeito, verifico que as prestações de contas, ao contrário do que afirmado na inicial, foram enviadas para os órgãos de controle interno da Secretaria de Cultura do Estado nos dias 21.08.2013, conforme protocolo e ofícios de fls. 46, fato confirmado pela própria Secretaria de Estado em ofício de fls. 124.

Compulsando os autos, extrai-se que o promovido, que na época dos fatos exercia o cargo de Prefeito Municipal de João Lisboa/MA, e tinha o dever de apresentar prestação de Contas referente ao convenio em análise junto à Secretaria de Cultura do Estado.
No entanto, o requerido descumpriu com o ônus, posto que não prestou contas no momento oportuno, cujo prazo expirou em 30.07.2012, apresentando a prestação de contas de forma extemporânea em 21.08.2013.

Assim sendo, verifica-se que o ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração púbica encontra-se devidamente configurado, uma vez que o promovido, na condição de Prefeito de João Lisboa/MA, deixou de prestar contas, no tempo e forma devidos, referentes ao Convenio nº 91/2012 junto à Secretaria de Cultura do Estado.

Neste particular, insta pontuar que a Constituição Federal, em seu art.70, fixa o dever genérico de prestação de contas a todo aquele, pessoa física ou jurídica, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens ou valores de natureza pública.
Infere-se, portanto, que a apresentação da prestação de contas, no tempo exigido por lei, permite à Administração aferir a legalidade dos atos praticados e comprovar o efetivo cumprimento do convênio firmado.

Outrossim, o art. 11, inciso VI, da Lei nº. 8.429/92 estabelece que constitui ato de improbidade administrativa deixar de prestar contas no prazo e condições fixados em lei. Vejamos:
Art. 11- Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente:
VI- deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo.

Frise-se, por oportuno, que o ato de improbidade administrativa em questão se consuma na atuação omissiva do gestor público em deixar de prestar contas no prazo e na forma disciplinados em lei, apresentando-se como ação de natureza formal, a qual se integraliza a despeito de qualquer resultado futuro.
A ausência de prestação de contas é tão grave que a lei a erigiu à condição de ato de improbidade administrativa, em outras palavras, em ato que fere a moral e probidade da Administração pública, princípios constitucionais que devem ser seguidos por aqueles que representam o Poder Público.
No dizer do doutrinador Silvio Antonio Marques (in Improbidade Administrativa, Ed. Saraiva, 2010, p. 125)

Pratica ato ímprobo que infringe princípios o agente público que deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo (art. 11, VI, da Lei n. 8.429/92). [...] A caracterização do ato ímprobo ocorrerá na hipótese de o agente ter a obrigação funcional de prestar contas e, dolosamente, deixar transcorrer o prazo previsto na norma específica do órgão ou entidade pública.

Nesse sentido, segue jurisprudência de nossos tribunais:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92, ART. 11, VI. ATOS QUE ATENTAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DESNECESSIDADE DE OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. - Os atos que atentam contra os princípios da Administração Pública são condutas ímprobas previstas no art. 11 da Lei 8.429/92 e independem de demonstração de dano aos cofres públicos ou enriquecimento ilícito. II - Deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo constitui ato violador dos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e de lealdade do servidor, que lesam a moralidade administrativa, enquadrando-se na hipótese de improbidade tipificada no inc. VI do art. 11 da Lei 8.429/92. III - Como não houve comprovação de dano aos cofres públicos ou enriquecimento ilícito, o quantum da multa civil deve ser reduzido. IV - Apelo provido em parte apenas para reduzir a multa civil. (TRF1 – Terceira Turma. AC 20051 BA 2003.33.00.020051-9. Relator: Des. Federal Cândido Ribeiro. Julgamento: 03/11/2009)

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. REQUISITOS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N.º 10.628/2002. INCONSTITUCIONALIDADE DE FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO DE CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL, NO EXERCÍCIO DO CARGO. NÃO CABIMENTO. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DOS SERVIDORES MUNICIPAIS. AUSÊNCIA DE DIVULGAÇÃO DAS CONTAS NA CÂMARA MUNICIPAL. ARTS. 48 E 49 DA LEI COMPLEMENTAR N.º 101/2000. ATOS DE IMPROBIDADE. ART. 10, CAPUT E ART. 11, II, IV E VI DA LEI N.º 8.429/92. ENQUADRAMENTO. INICIAL. RECEBIMENTO. – (...) III - o atraso no pagamento do funcionalismo público municipal, bem como a ausência total de divulgação da disponibilização das contas perante a Câmara Municipal, são condutas atentatórias aos princípios da administração pública, suficientes para o enquadramento nos arts. 10 e 11, II, IV e VI, da Lei n.º 8.429/92, não exigindo a produção de resultado para restar evidenciada a prática de ato de improbidade. Ação que deve ser recebida para o fato ser devidamente apurado na instrução processual; - ação de improbidade administrativa recebida. (TJMA – Tribunal Pleno. Ação de Improbidade Administrativa 162162004 MA. Relator: Dês. Cleones Carvalho Cunha. Data de Julgamento: 09/12/2004)

Desta feita, após a análise acurada dos meios de provas coligidos aos autos, tem-se por demonstrado que o promovido ao deixar de prestar contas referentes ao Convênio nº 91/2012, praticou ato de improbidade administrativa consubstanciado em violação a princípios constitucionais, perfazendo, com este comportamento, o ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11, VI, da Lei 8.429/1992.
Quanto ao elemento subjetivo, vislumbro que restou demonstrada o dolo consistente na vontade livre e consciente do réu de deixa de prestar contas no tempo e forma devidos mesmo estando obrigado a fazê-lo. Portanto, diante da inércia do demandado em cumprir com o seu dever constitucional de prestação de contas relativas ao referido convênio, enquanto destinatário de recursos públicos vinculados a finalidade específica, resta evidenciada a vontade livre e consciente do requerido em não fazê-lo, fato que configura o dolo enquanto elemento subjetivo da conduta ímproba que lhe é imputada.

Nesse aspecto, necessário destacar que o ora requerido deixou de prestar contas no tempo e forma devidos inviabilizando o exame comparativo das despesas supostamente realizadas, e dificultando a fiscalização da efetiva aplicação dos recursos que lhe foram destinados por intermédio do convênio objeto do presente feito, violando dever funcional que lhe competia, já que exercia a titularidade do Poder Legislativo Municipal à época dos fatos.
Tal inviabilidade, inclusive foi corroborada pelo próprio sistema de controle interno da Secretaria de Cultura que após analise da documentação enviada, concluiu pela desaprovação das contas com encaminhamento para Tomada de Contas Especial, conforme ofício e documentação de fls. 123-140 e fls. 145-210.

Com efeito, a ausência de prestação de contas fere o princípio da publicidade que deve nortear a atividade dos gestores públicos. De outra banda a sua desaprovação revela aplicação indevida e espúria das referidas verbas, inviabilizando o controle dos gastos do administrador público, em afronta ao princípio da Moralidade Administrativa, revelando imperiosa a condenação daquele que o pratica, nas penas do art. 12, III, da Lei n.º 8.429/92

Ademais, tinha pleno conhecimento da obrigação que lhe era imposta, e detinha os elementos materiais para viabilizar o cumprimento do dever de prestar contas, dentro do prazo estipulado pela legislação vigente. Portanto, o descumprimento do ônus de sua responsabilidade caracteriza o ato de improbidade por ele praticado.

Nesse sentido, é a orientação jurisprudencial:

APELAÇAO CÍVEL. EX -PREFEITO. AÇAO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE. PRESTAÇAO DE CONTAS EXTEMPORÂNEA. LESAO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS.
1.Os agentes públicos no exercício de mandato, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, estão submetidos às penas previstas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade), fato que, evidentemente, conduz à subsunção de ex-prefeitos aos preceitos da referida legislação.
2. Pode o Parquet, a qualquer momento, ressalvado o lapso prescricional para aplicação de sanções, ajuizar ação para combater suposta improbidade por apresentação tardia de prestação de contas, bem como por eventual enriquecimento ilícito e dano ao Erário daí decorrentes.
4.Recurso conhecido e improvido. (APC 201000010050318 PI, Relator: Des. José Ribamar Oliveira, Data de Julgamento: 28/06/2011, 2a. Câmara Especializada Cível)

“[...] Atraso na prestação de contas de candidato. Rejeição de contas pelo TCU. Inelegibilidade. [...] I - A prestação extemporânea de contas pelo candidato ao cargo de Prefeito configura hipótese de crime de responsabilidade e ato de improbidade administrativa, além de acarretar prejuízos à municipalidade, impedida de celebrar novos convênios de transferência de recursos. (Ac. de 25.8.2009 no AgR-AgR-REspe nº 33.292, rel. Min. Ricardo Lewandowski.)

Registre-se, por oportuno, que nos casos do artigo 11, a Primeira Seção do STJ unificou a tese de que o elemento subjetivo necessário para caracterizar a improbidade é o dolo genérico, ou seja, a vontade de realizar ato que atente contra os princípios da administração pública.

Diante das argumentações acima postas, assiste razão ao autor, devendo o requerido ser condenado nas penas impostas no art. 12 da Lei nº. 8.429/92, por ter praticado ato de improbidade administrativa.

A respeito desta temática, apresentamos os seguintes julgados do STJ, que corroboram o entendimento ora exposto:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SECRETÁRIO DE FAZENDA MUNICIPAL. APLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA A AGENTES POLÍTICOS MUNICIPAIS. USO INDEVIDO DE VERBA PÚBLICA. OMISSÃO QUANTO À PRESTAÇÃO DE CONTAS.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que se aplicam a agentes políticos municipais, tais como prefeitos e secretários municipais, as sanções previstas na Lei 8.429/1992.
3. Omissão do agravante em instaurar Tomada de Contas Especial, para cobrança do que foi gasto indevidamente, configurando ofensa aos princípios da Administração Pública, nos termos do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa. (AgRg no Ag 1286329/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 28/04/2011).
ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – FALTA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS – AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS – ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92.
1. O art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/92  prevê, expressamente, que constitui ato de improbidade administrativo deixar de prestar contas quando o agente estiver obrigado a fazê-lo.
2. A jurisprudência desta Corte, quanto ao resultado do ato, firmou-se no sentido de que se configura ato de improbidade a lesão a princípios administrativos, o que, em princípio, independe da ocorrência de dano ou lesão ao erário público. (REsp 852.671/BA, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 03/05/2010).

Nesses termos, resta efetivamente demonstrada a caracterização do ato de improbidade administrativa pelo ex-gestor municipal, passível de aplicação das sanções cominadas na Lei de Improbidade Administrativa.

DAS PENALIDADES APLICÁVEIS

Nos termos do artigo 12, I, II e III da LIA (Lei 8.429/92), são penalidade aplicáveis aos agentes públicos que, no exercício de suas funções, pratiquem atos de improbidade administrativa: (i) o ressarcimento do dano; (ii) multa civil; (iii) perda dos valores ilicitamente incorporados ao patrimônio do agente, (iv) perda da função pública; (v) proibição de contratar com o poder público e (vi) suspensão dos direitos políticos.

Assim sendo, verificada a conduta ímproba e desonesta de agente público na condução de interesses públicos, caberá ao Judiciário a aplicação das reprimendas designadas no citado artigo 12 da Lei 8.429/92.

Observe-se que as penalidades deverão ser aplicadas obedecendo a parâmetros de proporcionalidade entre a natureza do ato de improbidade e a extensão do dano causado à coletividade, sob pena de serem inquinadas de inconstitucionais.

Na hipótese em apreço, verifica-se que o prejuízo causado à coletividade foi relevante, mas de pequena monta uma vez que o promovido deixou de prestar contas de convenio nº 91/2012 junto à SECMA, no momento oportuno, bem como, suas contas foram rejeitadas, consoante PARECER TECNICO SCC/SUFIN/SECMA Nº 329/2013 e DECISÃO da Secretária de Estado de Cultura datada de 18.12.2013. (fls. 207-2010)
Diante de todos esses fatores, deverá o promovido receber censura deste juízo, ficando condenado nas sanções de ressarcimento ao erário, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o poder público, nos patamares a seguir fixados.
Mostra-se incabível, in casu, a condenação à perda da função pública, uma vez que prejudicada pelo transcurso do prazo de seu mandato.

Quanto ao pedido de retirada da negativação do Município de João Lisboa/MA do sistema de inadimplência da Secretaria Estadual de Cultura, não o conheço, já que o Estado do Maranhão não figurou no pólo passivo da presente demanda.

DISPOSITIVO:

Por todo o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão condenatória deduzida na inicial e, por consequência, CONDENO o requerido, FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, ex-Prefeito Municipal de João Lisboa, por violação à norma contida no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/92 (LIA).
Outrossim, considerando a extensão do dano causado à coletividade, a gradação da improbidade praticada, sua repercussão no erário público, bem como as demais diretrizes normativas insculpidas no artigo 12, inciso III e parágrafo único da Lei 8.429/1992, APLICO AO REQUERIDO AS SEGUINTES PENALIDADES:

I)       Suspensão dos direitos políticos pelo período de 03 (três) anos;
II)       Ressarcimento integral do Dano no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) devidamente atualizado pelo INPC;

III)     Proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que seja por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo período de 03 (três) anos.

Outras Diligências:

a) Notifique-se o Ministério Público Estadual.
b) Intime-se o Município de João Lisboa/MA, a fim de que tome conhecimento da presente sentença.
c) Custas processuais por conta do condenado.
d) Após o trânsito em julgado da sentença, oficie-se à Câmara Municipal, remetendo-lhes cópia dessa decisão, para os fins de direito e, especialmente, para as anotações, nos registros respectivos, da proibição acima determinada, bem como ao Tribunal Regional Eleitoral – TRE/MA e ao Cartório da 58ª Zona Eleitoral, acerca da suspensão dos direitos políticos pelo prazo epigrafado, nos termos do art. 15, V, e art. 37, § 4º, da Constituição Federal e art. 71, inciso II, do Código Eleitoral.
e) Com o trânsito em julgado, inclua-se a presente condenação no Cadastro do CNJ de condenados por atos de improbidade (Resolução nº 44 de 20 de novembro de 2007).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se as partes.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
Cumpra-se.
João Lisboa/MA, 13 de janeiro de 2016.

Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa




[1] DA SILVA, José Afonso. Comentário contextual à Constituição. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p.348.
[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22.ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 813.
[3] Idem. p.823.