quinta-feira, 27 de junho de 2013

"SENTENÇA". PRONUNCIA. RECONHECIMENTO DE QUALIFICADORA DE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU DEFESA.

Processo n° 383/2013
Autor: Ministério Público Estadual
Réu: ELNATAN BARBOSA DE MORAIS
Vítima: JOSEMAR ALVES DOS SANTOS


SENTENÇA
I – RELATÓRIO

O Ministério Público Estadual ofereceu denúncia contra o réu ELNATAN BARBOSA DE MORAIS, imputando-lhe a conduta delituosa descrita no art. 121, §2º, IV do CPB, pelo seguintes fatos:

“Consta do procedimento que serve de base ao presente(..) que na manhã do dia 29 de abril de 2013, pro volta das 06:05horas, no leito da Rua Bonfim Teixeira, sn, bairro centro, nesta cidade, o denunciado matou com tiros de arma de fogo a vítima Josemar Alves Santos, consoante atesta os depoimentos encartados e as fotografias de fls. 05/11.
A vítima caminhava no leito da Rua Bonfim Teixeira, nesta cidade, quando foi abordada pelo denunciado que de arma em punho desferiu vários disparos, vindo a ocasionar resultado morte. Após alvejar a vítima, o denunciado tentou dar partida na motocicleta que conduzia – motocicleta Yamaha YBR 125 Factor, cor preta, ano 2010, placa NWW 3937/MA, mas diante da falta de ignição deixou referido veículo no local e saiu correndo com a arma em punho
(...)
Na ocasião a vítima de dirigia da delegacia de Polícia – local onde passava a noite cumprido pena decorrente de condenação criminal- quando foi abordada e executada pelo denunciado em situação que não lhe permitiu o esboço de qualquer reação ou defesa, pois diante da enérgica e repentina ação do denunciado não teve a menor possibilidade de se defender (...)”

A denúncia fora recebida em 09.05.2013, fls. 72.

O réu foi citado tendo apresentado defesa preliminar às fls. 75-81, onde inicialmente alegou ausência de justa causa para a ação penal, uma vez que inexistiria nos autos indícios de autoria, que inexistia estado de flagrância a justificar a prisão e reservou-se para apreciação aprofundada do mérito quando das alegações finais. Arrolou testemunhas.
Às fls. 92, foi mantido o recebimento da denúncia, tendo este juízo designado audiência de instrução.
Às fls. 105-119, procedeu-se à audiência de instrução, oportunidade em que foram ouvidas 07 testemunhas de acusação e 02 de defesa e 02 do juízo, procedendo-se em seguida ao interrogatório do acusado, oportunidade em que o mesmo negou a autoria do delito em tela e manteve a versão de que teve subtraída a moto na noite anterior.
Em sede de diligências a defesa insistiu na oitiva da testemunha ARLETE DE TAL, tendo este juízo deferido o pedido. Às fls. 128, a defesa afirma que a testemunha não mudou de endereço, mas sim estava com medo de vir prestar depoimento.
Foi designada audiência de continuação às fls. 131, a qual se realizou às fls. 137-138, oportunidade em que fora ouvida a testemunha ANTONIA ARLETE ASSUNÇÃO BARBOSA.
Às fls. 141, o ICRIM informa que o laudo de exame pericial residuográfico ainda não ficou pronto.
O Ministério Público ofereceu alegações finais às fls. 142-144, oportunidade em que requereu a pronúncia do acusado, no tipo previsto no art. 121, §2º, IV do CPB.
A defesa apresentou alegações finais às fls. 146-164, oportunidade em que continuou a sustentar a ilegalidade da prisão em flagrante e no mérito sustentou a ausência de indícios de autoria e requereu a IMPRONUNCIA do acusado e a revogação de sua prisão preventiva.
Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

A pronúncia é um mero juízo de admissibilidade da acusação, adstrito à existência de prova da materialidade do delito e suficientes indícios da autoria, evitando-se um exame aprofundado da prova a fim de não influir indevidamente no convencimento dos jurados, que são os juízes naturais da causa.
Mesmo sendo uma espécie de decisão na qual não há necessidade de o juiz proceder a análise aprofundada das provas, curial se faz que existam provas da existência do crime e indícios suficientes de autoria.
Quanto a materialidade, tenho que a mesma é inconteste, uma vez que consta dos autos laudo de necropsia (fls. 87-90), fotografias da cena do crime (fls. 05-11) fotografias do corpo da vítima (fls. 05-11), que constatam que induvidosamente a vítima foi morta a tiros de arma de fogo.

                        Da análise dos autos, observo que o réu deve ser pronunciado para ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri pela prática do crime de homicídio, visto que estão presentes nos autos os pressupostos da decisão de pronúncia, constantes no art. 413, do Código de Processo Penal. Senão vejamos:
Os depoimentos das testemunhas apontam que existem indícios de autoria do delito em relação ao acusado.
Tais indícios emanam do fato do acusado encontrar-se, desde a noite anterior ao delito, de posse da moto e do capacete encontrados no local do delito, somados aos depoimento de diversas testemunhas oculares do delito, dentre os quais o irmão da vítima OSVAN o qual reconhece o acusado como sendo a pessoa que passou correndo ao lado do seu carro, nas proximidades do local do delito e no mesmo horário do crime, portando uma arma de fogo:

“(...)QUE no dia dos fatos o depoente estava indo para a delegacia pela Rua Bonfim Teixeira, por volta de 06:15h, quando ao cruzar com a Rua Nicolau Dino percebeu o acusado, com uma arma em punho, USANDO UMA CAMISA AZUL CLARA E UMA BERMUDA TIPO CAMUFLADA E SEM CAPACETE, passando correndo ao seu lado; QUE mais a frente observou uma aglomeração de pessoas; QUE antes de chegar na aglomeração um homem informou ao depoente que tinham acabado de matar o seu irmão; QUE o depoente parou no local e confirmou que a vítima era seu irmão e que nesse momento ainda agonizava mas logo depois morreu; QUE no local havia uma moto preta Yamaha com a chave na ignição caída no chão; QUE o depoente pegou a chave da ignição e bateu foto da placa e foi informado de que o capacete tinha sido jogado mais a frente num terreno de um antigo lava-jato na Rua Bonfim Teixeira; QUE foi a irmã do depoente que recolheu o capacete; QUE o depoente dirigiu-se para a delegacia onde comunicou o fato ao Escrivão Sutero; QUE o capacete foi entregue no mesmo dia na delegacia; QUE o depoente acompanhou os policiais até o local do crime; QUE o depoente esteve na delegacia nesse dia por outra duas vezes a segunda para entregar o capacete e a terceira para entregar o projétil no momento em que os agentes funerários deram um banho na vítima; QUE QUANDO FOI ENTREGAR O CAPACETE OBSERVOU O ACUSADO ELNATAN LÁ DETIDO E RECORDOU QUE TINHA SIDO AQUELE O HOMEM QUE PASSOU AO SEU LADO CORRENDO COM A ARMA NA MÃO; QUE CONHECEU O ACUSADO PELA SUA FISIONOMIA; QUE NESSE MOMENTO O ACUSADO AINDA VESTIA A MESMA ROUPA QUE USARA NO MOMENTO EM QUE CORRIA FUGINDO; QUE o seu irmão foi alvejado com quatro tiros, um na nuca, dois nas costas e um no pescoço; (...)QUE o acusado tanto na delegacia quanto no momento da fuga usava UMA CAMISA AZUL CLARA E UM SHORT CAMUFLADO; (...) QUE A TESTEMUNHA RAIMUNDA CONFIRMOU QUE VIU O EXECUTOR DO DELITO COM AS MESMAS ROUPAS QUE O DEPOENTE VIU MAS COM CAPACETE JÁ QUE RAIMUNDA MORA PRÓXIMO AO LOCAL DO CRIME e que inclusive foi ameaçada com a arma do crime. ÀS PERGUNTAS DO ADVOGADO, respondeu: QUE no momento em que viu o acusado passando com a arma estava no cruzamento da Rua Nicolau Dino com a Rua Bonfim Teixeira com o seu veículo praticamente parado; (...)QUE não chegou a declinar no momento do registro do B.O que o acusado era o autor do delito porque na verdade somente NA SEGUNDA VEZ QUE ESTEVE NA DELEGACIA E O VISUALIZOU CONCLUIU SEM SOMBRA DE DÚVIDAS QUE ELE ERA A MESMA PESSOA QUE HAVIA PASSADO AO SEU LADO CORRENDO COM UMA ARMA NA MÃO E CONCLUIU ISSO TANTO PELA FISIONOMIA QUANTO PELA ROUPA; (...) ” (Depoimento da testemunha – OSVAN ALVES SANTOS – fls. 108).

O policial que participou da investigação também noticiou indícios de autoria contra a pessoa do acusado, pois estava com ele a moto encontrada ao lado do corpo da vítima, bem como o capacete ambos emprestados na noite anterior ao delito:

“(...)QUE no dia dos fatos encontrava-se de plantão na delegacia local, quando populares lá chegaram, por volta de 6:30 h, com a informação de que haviam acabado de matar “Nego” com três tiros na Rua Bonfim Teixeira; QUE o depoente deslocou-se para o local em companhia de um policial militar Cabo Mendes; QUE lá chegando visualizou uma aglomerado de pessoas em volta do corpo da vítima e da moto que estava aproximadamente há 10 metros de distância, ambos no leito da rua; (...) QUE colheu informações da placa da moto junto ao banco de dados Infoseg, identificando que o veículo pertencia a uma mulher chamada Joseane, residente na Rua Dom Emiliano; QUE o depoente dirigiu-se até a casa de Joseane e lá indagou da mesma sobre a moto que havia abandonada próximo ao corpo da vítima pelo executor do delito; QUE Joseane informou que A MOTO HAVIA SIDO EMPRESTADA PARA ELNATAN NA NOITE ANTERIOR POR SEU MARIDO ANTONIO CARLOS POR VOLTA DE 23:00H; (...) QUE até aquele momento Elnatan não tinha feito qualquer contato com Joseane acerca de um eventual roubo da moto; (...) QUE em seguida o depoente retornou para a delegacia e lá chegando deparou-se com Elnatan; QUE ELNATAN VESTIA UMA CAMISA TIPO AZULADA COLADA AO CORPO E UMA BERMUDA QUE TINHA CORES CLARAS E ESCURAS, TIPO CAMUFLADA; QUE o depoente disse para Elnatan que estava vindo da sua casa; QUE Elnatan disse que estava ali para registrar um B.O de um roubo de uma moto que tinha ocorrido por volta de 00:00 do mesmo dia, na entrada da Vila Kennedy I; QUE o depoente perguntou para Elnatan porque não tinha procurado a polícia no momento do roubo; QUE Elnatan respondeu que estava meio atordoado e que também não tinha comunicado o fato ao dono da motocicleta Antonio Carlos marido de Joseane; QUE diante dessa situação o depoente deu voz de prisão ao acusado e aguardou a chegada da autoridade policial para a lavratura do auto de prisão; (...) ÀS PERGUNTAS DO ADVOGADO, respondeu: (...) QUE soube que o autor dos disparos após alvejar a vítima não conseguiu fazer a moto funcionar e saiu correndo com a arma na mão no sentido Câmara – MA 122; QUE Osvan chegou na delegacia para registrar o fato antes Elnatan; QUE posteriormente o depoente novamente esteve no local do crime e lá foi informado por Osvan que  Elnatan era o autor do delito; QUE não houve diligências para a localização da arma; QUE essa última informação foi obtida depois da 09:00h; QUE o depoente informou a Osvan que já havia dado voz de prisão para Elnatan; QUE Osvan disse que reconhecia Elnatan por tê-lo visto instantes depois do delito correndo pela rua com a arma na mão (...)”. (Declarações da testemunha ANTONIO SUTERO DE MORAIS NETO – fl. 107).

A roupa usada pelo executor também foi descrita por outras testemunhas ouvidas em juízo como sendo uma camisa azul ou cinza, com uma bandeira nas costas e uma bermuda camuflada do exercito, mesma roupa que o acusado usava quando de sua prisão em flagrante:

“(...) que quando passou em frente a residência da depoente o referido homem, que vestia UMA CAMISA AZUL CLARA, COLADA NO CORPO, E UMA BERMUDA QUE PARECIA SER CLARA e usava um capacete na cabeça, ainda apontou a arma na direção da depoente e disse para a mesma não olhar para ele (...) (...)” (depoimento de RAIMUNDA XAVIER RODRIGUES DE SOUSA, fls. 109)

“(...) QUE trabalha como empregada doméstica na casa de Elnatan; (...) que é responsável por lavar e passar roupas da família, inclusive de natan (...) Que Natan possui algumas camisetas que possuem detalhes nas costas (...) Que Natan possui uma bermuda camuflada, na altura do joelho e que possui bolsos laterais(...)” (depoimento de ANTONIA FERREIRA DA SILVA, fls. 113)

“(...) QUE recorda que Natan ao se dirigir para a casa da depoente vestia uma camisa cinza ou verde com um símbolo atrás que parecia uma bandeira do Estados Unidos e uma bermuda na altura dos joelhos com bolsos laterais de sarja tipo do exército(...)” (depoimento de SALMA DE SOUSA SANTOS, fls. 115)

“(...) QUE CONHECE o acusado há aproximadamente 05 meses e tem um envolvimento amoroso como o mesmo; que na noite dos fatos encontrou-se com o acusado(...) que a moto era preta; que o casal foi para o motel Boiadeiros; Que quanto a roupa que Natan usava recorda que era uma bermuda de bolso lateral na altura do joelho e uma camiseta que não recorda a cor(...)” (depoimento de MONICA SILVA DE OLIVEIRA, fls. 116)

“(...)QUE o acusado retornou por volta de 00:30h e 01:00h; QUE nesse momento o acusado já estava nervoso e disse que tinha sido roubado na entrada da Vila Kennedy; QUE o acusado disse que levaram a moto e o capacete; QUE nesse momento não cogitaram procurar a polícia e nem o dono da moto; QUE O ACUSADO DORMIU EM CASA E O DESPERTADOR TOCOU AS 06:00H DA MANHÃ COMO DE COSTUME; QUE O ACUSADO SE ARRUMOU E SAIU DE CASA; QUE O ACUSADO VESTIU UMA BERMUDA NA ALTURA DO JOELHO COM BOLSOS LATERAIS E CAMUFLADA TIPO EXÉRCITO E UMA CAMISETA COR CINZA COM DETALHES NAS COSTA SEMELHANTE A UMA BANDEIRA QUE A DECLARANTE ACREDITA SER DA ALEMANHA; QUE por volta de 06:35h o acusado retornou pra casa com a informação de que a moto roubada havia sido localizada ao lado do corpo da vítima que tinha sido assassinado na Rua Bonfim Teixeira e resolveram pedir orientação para Salma; QUE antes ligaram e avisaram que iriam na casa de Salma; QUE COM ESSA MESMA ROUPA O ACUSADO FOI NA CASA DA IRMÃ DA DECLARANTE SALMA; QUE lá chegando Salma orientou o acusado a ir registrar boletim de ocorrência; QUE a depoente retornou para a sua casa; QUE quando a empregada Toinha chegou a declarante já estava em casa, mas Elnatan não. (...)” (depoimento de SOLANGE VIEIRA DE SOUSA, fls. 118)

Em sede de inquérito policial, os indícios de autoria sobre a pessoa do acusado são reforçados com o depoimento de testemunha que em que pese não o tenha reconhecido formalmente, descreveu a roupa usada pelo acusado:

“(...) que viu na Rua Bonfim Teixeira um sujeito deitando a moto no chão e correndo passando em frente a sua casa usando uma CAMISA CINZENTINHA, APERTADA, E UM SHORT QUE IA ATÉ O JOELHO(...)” (depoimento POLICIAL de RAIMUNDA XAVIER RODRIGUES DE SOUSA, fls. 12)

Em seu interrogatório, o acusado nega as imputações que lhe foram feitas e reafirma a ocorrência de crime de roubo da motocicleta na noite anterior, que  entretanto, não encontra respaldo em qualquer das provas colacionadas aos autos e, portanto, não merece maior credibilidade:

 “(...)QUE não é verdadeira a imputação que lhe é feita; QUE acredita que está sendo acusado porque a moto utilizada no delito se encontrava em sua responsabilidade; QUE não sabe quem matou Josemar; QUE não tinha qualquer problema com Josemar; QUE conhecia a vítima de vista; QUE no dia do fato saiu de casa após se arrumar como de costume, e foi dar uma volta na Vila Kennedy; QUE costuma acordar as 06:00h horário em que sua esposa Solange marca no despertador; QUE logo após se arrumar saiu de casa e quando dava a volta passou em frente a padaria e nesse instante foi acompanhado pela sua vizinha Sandra a qual lhe disse que havia ocorrido um assassinato na Rua Bonfim Teixeira e que o assassino tinha deixado uma moto preta e pequena no local; QUE ficou assustado com a informação e dirigiu-se para a sua casa; QUE nesse instante já havia comentários pela rua; QUE chegando em casa contou para a sua mulher Solange; QUE nesse momento já sabia que a moto encontrada do lado do corpo era a moto que tinha sido roubada pelas suas característica era uma moto preta YBR segundo os comentários de rua; QUE MESMO DIANTE DESSA INFORMAÇÃO NÃO FOI CONFIRMAR SE A MOTO UTILIZADA NO ASSASSINATO DE FATO ERA A MOTO ROUBADA; QUE em conjunto com a sua esposa resolveram ligar para a sua cunhada Salma; QUE se dirigiram até a casa de Salma, ainda antes das 07:00h e pediram conselho sobre o fato tendo sido o interrogando orientado a registrar boletim de ocorrência; QUE foi Solange que levou o interrogando a delegacia; QUE antes Solange já tinha voltado em casa; QUE O INTERROGANDO VESTIA UMA BERMUDA NA ALTURA DO JOELHO COM BOLSOS LATERAIS CAMUFLADA TIPO EXÉRCITO E UMA CAMISA COR CINZA, GOLA PÓLO COM A BANDEIRA NAS COSTAS; QUE após ser lhe apresentado fotos da bandeira dos Estados Unidos e da Inglaterra, nesta audiência o interrogando reconheceu a figura de sua camisa como sendo A BANDEIRA DA INGLATERRA; QUE NÃO SABE EXPLICAR PORQUE NÃO FOI NO LOCAL DO CRIME PARA RECONHECER A MOTO E TAMPOUCO LIGOU PARA O DONO DA MOTO PARA COMUNICAR O ASSALTO(...) (interrogatório do acusado ELNATAN BARBOSA DE MORAES, fls. 119)


Portanto, ao contrário do que alega a defesa, existem vários indícios de autoria que recaem sobre a pessoa do acusado.

A qualificadora contida na denúncia deve ser mantida na pronúncia, salvo quando manifestamente improcedentes, sob pena de afronta à competência constitucional do Tribunal do Júri.

Considera-se manifestamente improcedente apenas aquela qualificadora que se revele, primo ictu oculi, inadmissível frente às provas dos autos, situação que não se demonstra quando há indícios mínimos aptos a justificar a procedência daquelas narradas na denúncia.

A qualificadora de utilização de meio que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima não pode ser afirmada apenas pelo auto de corpo de delito, mas deve ser aferida por todo o contexto probatório existente nos autos da ação penal e a mesma restou demonstrada em face do caráter de execução sumária do delito a curta distância, mediante arma de fogo e tomando a vítima de surpresa.

Em suma: as provas trazidas aos autos são suficientes para pronunciar o réu, uma vez que há indícios suficientes de autoria e não exsurge, na hipótese, de maneira inequívoca qualquer excludente de ilicitude. Além disso, a tese defensiva postulada não merece acolhida, eis que inopera, quanto à pronúncia o provérbio in dubio pro reo, incidindo a regra in dubio pro societate.

ANTE O EXPOSTO, com fundamento no art. 413, do Código de Processo Penal, PRONUNCIO o acusado ELNATAN BARBOSA DE MORAES, a fim de que seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, como incursos nas sanções do art. 121, §2º, IV,  do CPB.

Tendo réu respondido ao processo preso, uma vez demonstrada a necessidade da prisão cautelar para a garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal, conforme decisões de fls. 28-32 e 105-106, a superveniente de decisão de pronuncia em nada altera a situação fática que determinou o ergástulo do acusado motivo pela qual presentes os demais requisitos do art. 312 e 313 do CPP, MANTENHO A PRISÃO PREVENTIVA DO ACUSADO uma vez que foram demonstrados os indícios de autoria e provada a materialidade, além de tratar-se de delito com pena em abstrato superior a 04 anos, de natureza hedionda e grande clamor social.
RECOMENDE-SE O RÉU NA PRISÃO.

Nos termos do art. 420, I, do CPP, o réu deve ser pessoalmente intimado da presente decisão, sem prejuízo da intimação do seu defensor.

                        P.R.I.C.

Amarante do Maranhão /MA, 25 de junho de 2013.


Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão




terça-feira, 11 de junho de 2013

DECISÃO. LIMINAR PARA TRATAMENTO CIRURGICO. DEFERIMENTO.

Proc. 525/2013 - AÇÃO CAUTELAR INOMINADA
Autor: NATANAEL DA SILVA ROMA
Réu: MUNICÍPIO DE AMARANTE DO MARANHÃO

Vistos, etc.

Defiro os benefícios da justiça gratuita (LEI 1060/50, Art. 5º).

NATANAEL DA SILVA ROMA, já qualificado, através de advogado, ingressou com a presente ação cautelar inominada em face do município de Amarante do Maranhão alegando em síntese que fraturou o nariz em acidente automobilístico e que atualmente sente dificuldades respiratórias, necessitando com urgência de cirurgia nasal.
Afirma que tentou viabilizar o seu tratamento fora do município pela Secretaria de Saúde local, porém, até a presente data não obteve êxito.
Insiste na necessidade do tratamento uma vez que diante de sua dificuldade respiratória está impedido de exercer suas funções de ajudante de pedreiro com graves prejuízos para a sua subsistência. Juntou documentos comprobatórios de suas alegações. (fls. 08-22).

É o relatório. DECIDO.

Ante o princípio da Fungibilidade e tendo em vista a natureza satisfativa da presente ação, bem como o princípio da Instrumentalidade das formas, recebo a presente ação como ação ordinária com pedido de tutela antecipada, nos termos do art. 273, §7º do CPC, DEVENDO A SECRETARIA PROCEDER À ALTERAÇÃO NO ROSTO DOS AUTOS. Cito precedente: STJ, RESP 653.381/RJ, REL. NANCY ANDRIGHI, 21.02.2006.

O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela Constituição da República (art. 196).

Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular — e implementar — políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles em condições especiais, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar.

O direito à saúde — além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas — representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida.

O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional — situação peculiar àquela apresentada no caso sub-judice, mormente quando o Município de Amarante do Maranhão, faltando com planejamento de suas atividades, não tendo uma estrutura médico-hospitalar para atender necessidades cirúrgicas como a que se apresenta no caso sub análise, deixa de garantir meios para a realização de uma CIRURGIA NASAL CID 10J 34,2. V98., com efeitos indispensáveis à sobrevivência do autor NATANAEL DA SILVA ROMA, em que pese gozando de verba vinculada à espécie.

Destarte, a interpretação da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente. O caráter programático da regra inscrita no art. 196, caput,  da Carta Política — que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro — não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Constituição Federal.

 O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas públicos  de atendimento a pessoas carentes, notadamente quanto ao auto presumivelmente necessitado (CF, art. 196), o qual se encontra sob risco de perecimento de saúde e vida, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade, desprestigiados pela omissão do Poder Público.

E por assim ocorrer, mostrando-se plausíveis os elementos de cognição constantes dos autos (doc. 08-21), de rigor tomar em evidência os argumentos expendidos para dar relevo ao interesse primário do autor, evidenciado pelo direito indisponível à vida (e à saúde como seu consectário lógico), em prejuízo do interesse público, deveras tripudiado pelo Município de Amarante do Maranhão.

O documento de fl. 19, “ATESTADO MÉDICO”, ORIUNDO DE MÉDICO ESPECIALISTA EM CIRURGIA DE NARIZ, a qual acompanha o autor, afirma que  “ATESTO PARA OS DEVIDOS FINS QUE O PACIENTE COMPARECEU NESTE CONSULTÓRIO COM QUEIXA DE OBSTRUÇÃO NASAL IMPORTANTE, APÓS TRAUMA NASAL POR ACIDENTE DE TRÂNSITO (COM MOTOCICLETA). APÓS ANALISAR O PACIENTE, FOI CONSTATADO: CICATRIZ RETILÍNEA EM DORSO NASAL POR TRAUMA CONTUSO, NARIZ COM QUEDA DO DORSO (DEFORMIDADE ESTÉTICA) E IMPORTANTE DESVIO DO SEPTO OBSTRUTIVO. O PACIENTE NECESSITA DE CIRURGIA NASAL CID 10J 34,2. V 98.”


Sob o pálio destas informações, razoável ANTECIPAR OS EFEITOS DA TUTELA, nos termos do art. 273, I e art. 461, §3º, todos do CPC, eis que plausíveis a verossimilhança das alegações aferidas a partir dos diversos laudos e atestados médicos anexados aos autos, bem como do direito constitucional do autor à vida e saúde  e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, aferidos ante a dificuldade respiratória do autor que tem comprometido sua função vital e o exercício de sua profissão, fundamento pelos quais DETERMINO que o município de AMARANTE DO MARANHÃO providencie a realização da cirurgia do autor NATANAEL DA SILVA ROMA, já qualificado, em HOSPITAL PÚBLICO LIGADO AO SUS OU PARTICULAR, ÀS CUSTAS DO MUNICÍPIO DE AMARANTE DO MARANHÃO, no prazo de 05 (cinco) dias úteis, devendo fornecer, ainda, passagem ou transporte para o autor e para seu acompanhante até o local do tratamento médico, além de estadia e ajuda de custo no valor de R$ 50,00 (cinquenta) reais, pelo período que se fizer necessário, eis que indispensável à sobrevivência do menor, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, nos termos do art. 461, caput, do CPC.

NOTIFIQUE-SE o DD. Secretário Municipal de Saúde de AMARANTE DO MARANHÃO, para que providencie o cumprimento da presente decisão.

CITE-SE o Município para apresentar contestação no prazo de 60 dias e, no mesmo ato INTIME-SE-LHE  desta decisão,  servindo a mesma de mandado.
Cumpra-se.

Amarante do Maranhão/MA, 11 de junho de 2013.


Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão

segunda-feira, 10 de junho de 2013

DECISÃO. COMPETÊNCIA CRIMINAL. CONEXÃO INTERSUBJETIVA. PREVENÇÃO. PREVIA DECRETAÇÃO DE PREVENTIVA. PRORROGAÇÃO DE COMPETÊNCIA.

IP Nº 451/2013
INDICIADO: PAULO CESAR SANTOS REGO


Vistos etc.

PAULO CESAR SANTOS REGO, já qualificado nos autos, ingressou perante este Juízo, através de advogado, com Pedido de Revogação de Prisão Preventiva decretada pelo juízo de Açailândia/MA, em razão de se encontrar preso pela suposta prática de crime previsto no art. 171, do CPB, uma vez que:

1) O autuado teria vendido coisa alheia como própria, qual seja uma CAMINHONETE D20 GM, PLACA JMK 5592/MA, COR VERMELHA, em nome de EVERALDO LIMA DE SILVEIRA à vítima LEANDRO CHAVES DA CONCEIÇÃO, vulgo LORINHO, recebendo em troca uma Saveiro, placa KDM 2607/MA, UMA MOTO TITAN, PLACA NHS 4266/MA , além da quantia de R$ 1000,00 e três cheques (dois de R$ 1000,00 e um de R$ 3000,00), fatos ocorridos no MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA/MA

2) O autuado, em companhia de um terceiro chamado DANIEL, teria cometido estelionato nesta cidade de Amarante do Maranhão adquirindo uma caminhonete GM D20, COR VERDE, PLACA HOX 7241/MA com cheques sem fundos e posteriormente vendida para RAIMUNDON RODRIGUES DE PAIVA, vulgo “MICHAEL JACKSON”, residente em Açailândia/MA.
                  
O presente IP teve início por APF realizado na cidade de Açailândia/MA.
Após a comunicação da prisão, o juízo de AÇAILANDIA, homologou a prisão em flagrante e converteu-a em Prisão Preventiva.
Em seguida, segue manifestação do Ministério Público no sentido de que fosse declinado o feito para esta Comarca de Amarante do Maranhão, tendo em vista que em tese um dos delitos teria ocorrido nesta jurisdição.
Às fls. 40-41, o juízo de Açailândia declina de sua competência mantendo a a prisão cautelar decretada anteriormente.
Com vistas o MP local manifestou-se pela declinação da competência para a Comarca de Presidente Dutra/MA.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. DECIDO.
Trata-se de típico caso de conexão intersubjetiva entre os delitos apurados no inquérito policial em referência, prevista no art. 76, I do CPP:

Art. 76. A competência será determinada pela conexão:
I – se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;
                  
Com efeito foram praticadas duas ou mais infrações, pelos mesmos agentes sendo uma na cidade de Amarante e outra em Açailândia, sendo ambos os juízo, a princípio competentes para apreciação do feito, uma vez que se tratam de jurisdições de mesma categoria:

Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras:
(...)
II – no concurso de jurisdições da mesma categoria:
a) preponderará a do lugar da infração, à qual for cominada a pena mais grave;
b) prevalecerá a do lugar em que houver ocorrido o maior número de infrações, se as respectivas penas forem de igual gravidade;
c) firmarsea a competência pela prevenção, nos outros casos;
                  
Portanto, o caso de fixação da competência pela prevenção conforme dispõe o art. 83 do CPP, uma vez que a conexão pressupõe a unidade de processo e julgamento, nos termos do art. 79 do CPP.
Art. 79. A conexão e a continência importarão unidade de processo e julgamento, salvo:
I – no concurso entre a jurisdição comum e a militar;
II – no concurso entre a jurisdição comum e a do juízo de menores.

Art. 83. Verificarsea a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa (artigos 70, § 3o, 71, 72, § 2o, e 78, II , c).
                   Nesse sentido colaciono precedentes do STF:

"A prevenção não é mero critério para decidir um conflito positivo entre dois juízos igualmente competentes. Ela também possui a função de impedir que se demore na propositura da ação penal, sob o pretexto de não se saber qual o juízo competente. Quando já existente um juízo prevento, não se aplica a regra do art. 72 do CPP." (HC 103.510, rel. min. Ellen Gracie, julgamento em 30-11-2010, Segunda Turma, DJE de 17-12-2010.) No mesmo sentido: HC 93.368, rel. min. Luiz Fux, julgamento em 9-8-2011, Primeira Turma, DJE de 25-8-2011.

"Tendo o juiz-auditor titular praticado atos decisórios no feito, mesmo que em fase pré-processual, está ele prevento para o processo, nos termos dos arts. 94 e 98, parágrafo único, do CPPM. O fato de haver uma portaria do juízo de origem indicando o contrário é irrelevante, uma vez que tal ato não pode, à evidência, sobrepor-se à legislação federal. Ordem concedida para declarar a prevenção do juiz-auditor titular da 3ª Auditoria da 3ª Circunscrição Judiciária Militar, com a anulação do ato de recebimento da denúncia e de todos os demais atos decisórios decorrentes desse recebimento." (HC 99.403, rel. min. Joaquim Barbosa, julgamento em 10-8-2010, Segunda Turma, DJE de 10-9-2010.)

"Incompetência do juízo. Improcedência: competência firmada por prevenção em virtude de o juiz ter decidido medida cautelar em mandado de segurança pelo qual a defesa visava ao acesso dos autos do inquérito policial. Ainda que assim não fosse, a incompetência por ausência de prevenção geraria nulidade relativa, fazendo-se necessária a demonstração de prejuízo." (HC 99.353, rel. min. Eros Grau, julgamento em 18-8-2009, Segunda Turma, DJE de 23-10-2009.) No mesmo sentido: HC 83.086, rel. min. Carlos Velloso, julgamento em 16-12-2003, Segunda Turma, DJ de 12-3- 2004.

"Tem prevenção para a ação penal o juiz que primeiro toma conhecimento da causa e examina a representação policial relativa aos pedidos de prisão temporária, busca e apreensão e interceptação telefônica, nos termos do art. 75, parágrafo único, c/c o art. 83 do CPP." (HC 88.214, rel. p/ o ac. min. Menezes Direito, julgamento em 28-4-2009, Primeira Turma, DJE de 14-8-2009.)

"Quando o tráfico ilícito de entorpecentes se estende por mais de uma jurisdição, é competente, pelo princípio da prevenção, o juiz que primeiro toma conhecimento da infração e pratica qualquer ato processual. No caso, o ato que fixou a competência do juiz foi a autorização para proceder à escuta telefônica das conversas do paciente." (HC 82.009, rel. min. Nelson Jobim, julgamento em 12-11-2002, Segunda Turma, DJ de 19-12-2002.)

Também assim tem decidido outros Tribunais:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIME DE TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INQUÉRITO POLICIAL. DECRETADAS PRISÕES PREVENTIVAS E BUSCA E APREENSÃO. ATOS DE CUNHO DECISÓRIOS. CRIMES PERMANENTES. CONFIGURADA A PREVENÇÃO - ART. 71 C.C. ART. 83, AMBOS DO CPP. CONFLITO PROCEDENTE.1. Os crimes permanentes se caracterizam por terem seu momento consumativo prolongado no tempo. Tratando- se de infração continuada ou permanente, praticada em território de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção (art. 71, CPP).
2. A prática de atos judiciais de cunho decisórios, tais como, decretação de prisão preventiva e a busca e apreensão em sede de inquérito policial, 
previnem a jurisdição por força do artigo 83, do Código de Processo Penal. (TJ-PR - Conflito de Competência Crime : CC 4747233 PR 0474723-3)

Portanto, analisando os autos resta evidenciado que o juízo da Comarca de AÇAILANDIA/MA, local do cometido de um dos delitos, de mesma gravidade, encontra-se prevento para a apreciação e julgamento do feito, uma vez que ao ser comunicado da prisão em flagrante do acusado, homologou-a e converteu-a em prisão preventiva praticando ato processual de natureza cautelar que o tornou prevento, fixando a sua competência para o processamento e julgamento do presente feito, nos termos do art. 83 do CPP.
Tendo em vista que se trata de juízo de mesma categoria, declaro a minha incompetência para a apreciação do pedido de revogação de prisão preventiva, não sem antes explicitar a minha perplexidade diante da manutenção da prisão do indiciado, por mais de 30 dias, sem que o mesmo sequer esteja denunciado.
ANTE O EXPOSTO, DECLARO A INCOMPETÊNCIA DESTE JUÍZO e determino a devolução dos autos para a COMARCA DE AÇAILÂNDIA, com baixa na distribuição, a quem caberá – se assim desejar – suscitar eventual conflito negativo de competência.
Cópia da presente decisão deve ser encartada nos autos do pedido de revogação de prisão preventiva nº 507/2013.

Amarante do Maranhão/MA, 07 de junho de 2013.



Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão


terça-feira, 4 de junho de 2013

SENTENÇA. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ACCESSIO POSSESSIONIS X ATOS MERA TOLERÂNCIA. PROCEDÊNCIA.

Autos n°. 6642011
Ação de Reintegração de Posse
Requerente: GERSON GOMES MARQUES
Requerido: EDIVALDO LEITÃO GOMES, vulgo “CAÇADOR” E OUTROS

Vistos etc,

GERSON GOMES MARQUES, já qualificado, ajuizou a presente ação de Reintegração de Posse em desfavor de EDIVALDO LEITÃO GOMES, vulgo “CAÇADOR” E OUTROS, alegando, em síntese, que é legítimo proprietário do imóvel descrito à fl. 08 e que foi esbulhado da sua posse.
Afirma que teve sua posse esbulhada por ato praticado pelos requeridos, pois teriam impedido a entrada de um trator e de seu tratorista na sua propriedade na data de 10.08.2011.
Aduz ainda que os requeridos passaram a ocupar em fins de semana um barraco velho que consta da propriedade do requerente, fazendo-o de abrigo.
Alega que tentou de forma amigável a retirada dos requeridos de dentro de sua propriedade, tendo restado infrutífera, razão pela qual ajuizou a presente ação.
Audiência de justificação às fls. 29-30, oportunidade que tomou-se por termo o depoimento pessoal do autor, tendo a parte requerida postulado juntada de cópia de sentença de anterior ação possessória ajuizada pelos requeridos, transitada em julgado, na qual as partes figuram em pólos invertidos (fls. 32-33).
Decisão Liminar às fls. 35-40 determinando a reintegração de posse ao autor, sob a condição de pagamento da diferença do ITBI e de custas em relação ao valor real do imóvel, o que foi cumprido pelo autor (fls. 41-45).
Auto de Reintegração na posse do autor à fl. 49, cumprido em sua totalidade.
Contestação às fls.52-57 alegando inicialmente que todos os requeridos detinham a posse pacífica das terras em questão, e que sobreviviam com a lavroura da mesma.
Ademais, argumentam que são herdeiros de Raimunda Leitão Gomes, e que tomaram posse da área em litígio desde a década de 1970, sobrevivendo do trabalho comum entre pais e filhos, e que o ora requerente foi quem teria na verdade esbulhado os mesmos da posse do imóvel na data de 08.11.2006 tendo originado ação de reintegração de posse registrada sob o número 1018/2006 neste juízo em desfavor do requerente, tendo sido concedida liminar e posterior confirmação de reintegração de posse aos ora requeridos, consoante cópia da sentença anexada às fls. 32-33.
Propalam ainda os ora requeridos que com o falecimento da matriarca da família, Raimunda Leitão Gomes, o irmão mais instruído dentre os herdeiros, o primogênito, Sr. Antônio Leitão Gomes, e que habitava na cidade teve em seu nome titulado a terra, por ter, supostamente, maior esclarecimento na época da titulação, que não poderia ser feita em nome de todos os irmãos, tendo posteriormente vendido a mesma terra para o ora requerente.
Destarte, ante a notícia de venda da terra os ora requeridos ajuízaram  em 14.07.2011 ação de usucapião em desfavor do ora requerente (proc. N.º 522-87.2011.8.10.0066), no qual afirmam a posse mansa e pacífica do imóvel por mais de 40 (quarenta) anos.
Relatam que este juízo realizou audiência de justificação com oitiva apenas do autor, sem colher depoimento de testemunhas e dos próprios requeridos, tendo os mesmos requerido a juntada de sentença de mérito (fls. 32-33).
Aduzem por fim que o mesmo nunca deteve a posse direta do imóvel, tendo realizado compra do imóvel enquanto este estava pendente de litígio judicial.
Os requeridos agravaram a decisão de fls. 35-40, tendo juntado cópia do agravo às fls. 60-70, que foi deferido no juízo ad quem tendo sido expedido novo mandado de integração de posse, desta vez, aos requeridos às fls.
Audiência de Instrução às fls. 109-116 com oitiva de testemunhas.
Alegações finais pelo autor às fls. 119-123, e pelos réus às fls. 126-127.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. Decido.
A reintegração de posse é o remédio processual adequado à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado de seu poder fisico sobre a coisa. Não é suficiente o incômodo; essencial é que a agressão provoque a perda da possibilidade de controle e atuação material no bem antes possuido, uma vez que nos termos do art. 926 do CPC: “o possuidor tem o direito de ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no caso de esbulho.”
Para tanto, há que se provar nos autos a efetiva posse, direta ou indireta do autor para que se possa reintegra-lo a um status quo ante que é a posse do imóvel, sob pena de não falar-se em ação de reintegração de posse e sim de imissão na posse, por tal motivo, cabal é conhecer a definição de posse segundo o Código Civil, em seu Livro III (Do Direito das Coisas), Título I (Da posse), art. 1.196, in verbis:
Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de alguns dos poderes inerentes à propriedade.
 Tal definição é fundamental para a perseguição de um direito possessório, pois sem posse, como se poderia falar de ação possessória? Disto provém, portanto, que a ação possessória só pode prosperar sob o pálio da comprovação da posse, direta ou indireta.
É necessário atinar que a posse é diferente de propriedade, na lição de ANTONIO CARLOS MARCATO, “enquanto a propriedade é o poder de direito sobre a coisa, a posse é o poder de fato, ou seja, a exteriorização de um direito sobre o bem possuído, importando para sua caracterização, a utilização econômica da coisa, ainda que exercida in nomine alieno
Destarte, a posse está mais ligada ao uso de fato, pleno ou não, de um bem, móvel ou imóvel, do que o título ou registro cartorário do mesmo, sendo que, eventualmente, pode haver simbiose entre a propriedade (domínio) e posse (exercício de poder de fato sobre a coisa), o que também pode não ocorrer simultâneamente, necessariamente.
Assim traçada a definição de posse, resta perseguir no bojo de uma ação possessória, que é o caso presente, a efetiva posse do autor para o fim de ser reintegrado na posse da mesma, restando as questões dominiais para outros foros de debate.
Deste modo, verifico que a prova efetiva da posse é requisito essencial da ação, restando ser esclarecida mediante análise detida dos elementos probatórios coligidos ao longo da instrução processual, mormente testemunhal.
Passo a analisar a presença dos requisitos necessários para o julgamento da presente ação possessória, nos termos do art. 927 do CPC:
Art. 927. Incumbe ao autor provar:
I – a sua posse;
II – a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III – a data da turbação ou do esbulho;
IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração.
Com relação aos pressupostos para a procedência do pedido na ação de reintegração de posse, enfatiza Arnaldo Rizzato:
“Três pressupostos sobressaem: a)deverá o possuidor esbulhado ter exercido uma posse anterior; b)a ocorrência do esbulho da posse que alguém provoca; c) a perda da posse em razão do esbulho.“Pratica esbulho quem priva outrem da posse, de modo violento ou clandestino, ou com abuso de confiança.” (Direito das Coisas, Forense, 1ª ed., p. 105).
Na ação de reintegração de posse, incumbe ao autor provar a sua posse, a turbação ou o esbulho praticado pelo réu, a data da turbação ou do esbulho e a continuação da posse, embora turbada (CPC, art. 927).

QUANTO A POSSE

É necessário registrar que a área em litígio foi ocupada mansamente e sem oposição durante mais de 30 (trinta) anos conforme aduz o próprio ex-titular da terra:

Que o depoente foi beneficiado com o título da área em litígio; Que somente depois desse fato, e passados 02 anos que o depoente já residia nesta cidade, os pais do depoente vieram para Amarante oriundos de Chapadinha; Que aos poucos os demais irmãos, (...), também vieram morar na cidade de Amarante(...) Que os pais do depoente ao chegarem nesta cidade não tinham aonde morar tendo passado alguns dias com Maria Deusa, mas posteriormente foram residir na fazenda objeto do presente processo; Que ninguém pediu autorização para o depoente para irem morar no local; Que aos poucos os demais irmãos foram chegando e também passaram a residir na área; Que como se tratava de familiares o depoente não se opôs; (...) Que essa situação perdurou do final da década de 70 até o ano de 2000; que entretanto os irmãos do depoente aos poucos foram arrumando suas casas no centro da cidade e depois de alguns anos os pais do depoente mudaram-se para uma casa na Rua Coelho Neto: Que entretanto tanto os pais como os irmão do depoente costumavam passar fins de semana na fazenda(...) que jamais fez qualquer doação da a´rea para seus pais ou irmãos (...)que antes de efetuar a venda para o SR. Gerson nenhum dos irmãos residia na fazenda; Que era comum seus irmãos reunirem-se na fazenda para beberem, comerem e caçarem; que não é veradade que tenha vendido a terra para Gerson de maneira escondida, pois na época conversou com sua irmã Francisca comunicando que venderia para fazr tratamento de saúde seu e de sua filha (...) Que foi Dominguinhos que ofereceu a terra para o Sr. Gerson(...) (Depoimento de ANTONIO LEITÃO GOMES, fl. 111)

Analisando o referido depoimento observo que desde há muito o antigo proprietário, irmão dos requeridos, possuia o imóvel sob litígio e que, por ATO DE MERA PERMISSÃO OU TOLERÂNCIA, deu abrigo aos seus pais e irmão que chegaram a esta cidade oriundos da cidade de Chapadinha/MA.
Segundo o Código Civil, os atos de mera permissão ou tolerância não induzem posse:
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.

A tolerância é um comportamento de inação, omissivo, consciente ou não do possuidor, que, sem renunciar à posse, admite a atividade de terceiro em relação à coisa e não intervém quando ela acontece. Sendo uma mera indulgência, uma simples condescedência, não implica transferência de direitos.
Nos autos há outros indícios de que os requeridos reconheciam no seu irmão ANTONIO LEITÃO o verdadeiro proprietário do imóvel, conforme se observa: 1) do depoimento pessoal do autor GERSON GOMES, onde o mesmo afirma que foi procurado para requerido DOMINGUINHOS lhe oferecendo a área para compra uma vez que ANTONIO LEITÃO, irmão deste, estaria doente em Palmas/TO e endividado nesta cidade (fls. 30), fato também confirmado por PERCILIANO LOPES (fls. 113); 2) é o que se depreende também do depoimento de ANTONIO LEITÃO quando o mesmo oferece a terra com preferencia para a requerida FRANCISCA (SUA IRMÃ) e esta afirma que “iriam vê se dava pra comprar”(fls. 111)
Por outro lado, colho do depoimento da referida testemunha, bem como do próprio registro imobiliário do imóvel em referência que ANTONIO LEITÃO GOMES, de fato alienou o imóvel em referência para o autor, transferindo a posse e propriedade que detinha  com as mesmas qualidade e vícios que existiam à época da alienação, conforme preceitua o art. 1207 do CC:

Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.

Portanto, no momento da alienação da propriedade o vendedor transmitiu também ao adquirente, ora autor, a sua posse e a partir de então o autor ficou investido de poderes para ajuizar os interditos prossessórios.
É o que a doutrina chama de ACCESSIO POSSESSIONIS, modo de aquisição derivada da propriedade, a título singular, por ato inter vivos. O adquirente recebe a nova posse, podendo juntá-la ou não, à posse anterior do vendedor. Portanto, não se pode falar em inexistência de posse anterior pelo adquirente.
Compulsando os autos, verifico, ainda, que no momento do cumprimento da liminar concedida por este juízo, o Oficial de Justiça certificou que “no referido imóvel não encontramos nenhum dos requeridos, onde procedemos ao arrombamento da porta principal, recolhendo todos os pertences dos requeridos e deixandos os mesmos no endereço do requerido na Rua Coelho Neto”(fls. 49).
Posteriormente outra certidão do Oficial de Justiça descreve o estado de abandono do imóvel: “a única modificação feita no referido imóvel é uma plantação de milho feita pelo vaqueiro do agravado no lugar onde anteriomente era um curral, segundo informações dos agravantes, a terra encontra-se descuidada, tendo mato em todo o território, até em uma platação de arroz quejá havia no local”(fls. 96).
A testemunha PERCILIANO LOPES LIMA, afirma que possuiu uma propriedade vizinha a área em litígio durante 7 anos e que nesse período nunca observou os requeridos desenvolverem atividade produtiva na terra:
“(...) que adquiriu essa propriedade no ano de 2003 e vendeu no ano de 2010; (...) que observou muitas vezes a “irmandade”, referindo-se aos requeridos, no local especialmente aos finais de semana; Que durante esse periodo nunca observou uma plantação de roça na fazenda; (...) Que não sabe dizer se os itmãos desenvolviam alguma atividade produtiva na fazenda; (...) Que foi o próprio Gerson que informou para o depoente que havia comprado a fazenda e que foi um dos irmão, Domingos, que incentivou a compra (...) “(fls. 113)
Sendo assim, não socorre aos requeridos a alegação de que o autor não tinha posse da área em litígio, pois sendo o mesmo sucessor a título singular de ANTONIO LEITÃO GOMES, adquiriu a posse que aquele ostentava anteriormente.
Também não prospera a alegação de que a posse estava com os requeridos desde o ano de 2006 quando lhes fora deferida uma liminar na ação de reintegração de posse nº 1018/2006 que tramitou neste juízo, uma vez que houve substantiva alteração fática relacionada a aquisição da posse que antes, em 2006, pertencia de fato a ANTONIO LEITÃO GOMES.
Portanto, desde o meu olhar, há prova nos autos de transmissão da posse do vendedor ANTONIO LEITÃO GOMES para o autor GERSON GOMES MARQUES através de negócio jurídico válido e eficaz, capaz de tramitir o domínio e a posse do referido imóvel a este último.

QUANTO A PROVA DO ESBULHO, DA DATA DO ESBULHO E DEMONSTRAÇÃO DA PERDA DA POSSE:

Dispõe o art. 927 do CPC a necessidade do autor do presente procedimento especial demonstrar a turbação ou esbulho praticados pelos réus, a data de sua ocorrência e a prova da perda da posse.
Pois bem, quanto a demonstração do esbulho, ás fls. 09 dos autos repousa um boletim de ocorrência policial, onde o autor relata que “os irmãos do vendedor, após o lote vendido se apossaram da referida propriedade, fazendo ameaças ao comunicante, bem como fazendo disparos de armas de fogo em direção a sede da fazenda do comunicante”.
Colho ainda do depoimento pessoal do autor que “após os serviços de limpeza das divisas, observou que os requeridos adentraram na área adquirida pelo requerente e lá permaneceram sendo que no dia 10.08.2011 o requerente foi impedido de adentrar na área com uma trator para fazer beneficiamento (...) que foi avisado pelo Sr. Orlando que não era para pisar lá dentro da área, pois estava na Justiça e eles era quem mandavam lá dentro (...) que dois requeridos estavam na época no local, sendo que um deles, Edvaldo, portanto uma espingarda (...) (fls. 30)
A data do esbulho por sua vez, deu-se no dia 10.08.2011, quando o autor foi impedido de adentrar o imóvel com suas máquinas e sob ameaça.
A perda da posse restou evidenciada, por atos de grave ameaça, na medida em que os requeridos invocando a condição de posseiros e utlizando-se de arma de fogo, impediram o autor de adentrar o imóvel desde a data do esbulho.
Pelo já exposto e pela convicção formada neste juízo sob o pálio do contraditório entendo que o requerente preencheu os requisitos do art. 927 do CPC.
Assim, entendo que o autor faz jus à proteção possessória pretendida, uma vez que os fatos narrados foram corroborados com o conjunto probatório inserido nos autos dão conta de que houve indevido desapossamento do bem objeto da presente lide por atos de grave ameaça praticados pelos requeridos.
Vale lembrar que em ação de reintegração de posse não cabe a discussão sobre a titularidade do bem, pois o seu legítimo proprietário poderá retomá-lo, a qualquer tempo e na via processual adequada, daquele que eventualmente venha a possuí-lo indevidamente.

DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTE o pedido de reintegração de posse, confirmando a liminar anteriormente concedida, devendo o bem ser restituído definitivamente a GERSON GOMES MARQUES.
Considerando o caráter dúplice das ações possessórias, expeça-se mandado de reintegração definitiva de posse do bem objeto da presente lide em favor do demandante.
Condeno os réus no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que, com amparo no art. 20, § 4º, do CPC, fixo em R$ 678,00 (seiscentos e setenta e oito reais), porém, dispenso o pagamento tendo em vista que os mesmos são beneficiários da Justiça Gratuita.
Certificado o trânsito em julgado, arquive-se com baixa na distribuição.
P.R.I.C
Amarante do Maranhão, 04 de junho de 2013.

 


Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão