Processo
n° 0800280-72.2017.8.10.0038
ANULATÓRIA
DE REGISTRO DE DESMEMBRAMENTO
SENTENÇA
MARIA DA LUZ
CASTRO CARVALHO, já qualificada, ingressou com a presente ação ANULATÓRIA DE
REGISTRO DE DESMEBRAMENTO IMOBILIÁRIO em face de ADÃO DO NASCIMENTO CARVALHO e
O CARTÓRIO DO 1º OFÍCIO EXTRAJUDICIAL DE JOÃO LISBOA, também já qualificado,
pleiteando a nulidade absoluta do registro de desmebramento imobiliário levado
a efeito no imóvel matricula nº 5008, livro 2, ficha 1-F, com uma área total de
3.531,10 m², local onde reside com o primeiro requerido e seus filhos e quea,
assim, seria um bem de família.
Sucede que o
primeiro requerido, no ano de 2012 teria iniciado um procedimento de
desmembramento de parte da área do terreno, mais precisamente 314m², o qual
teria sido registrado no 2º requerido sem a necessária autorização da autora,
motivo pelo qual seria nulo, requerendo a autora a declaração judicial de tal
nulidade através desta ação ajuizada em 31.01.2017.
O imóvel
desmembrado gerou a matrícula nº 6337, livro 2, ficha 1-F, protocolo 13950,
datada de 07.02.2013.
Determinada a
citação, os requeridos compareceram à audiência de mediação e concordaram com a
declaração de nulidade do desmembramento.
O primeiro
requerido apresentou resposta alegando ilegitimidade passiva e atribuindo todo
o erro ao segundo requerido, mas no mérito requereu a declaração de nulidade do
registro público.
O segundo
requerido não apresentou resposta.
O Ministério
Público requereu a juntada atualizada da certidão do registro imobiliário questionado.
Em ofício de id.
13786930, o Cartório junta cópia da certidão de inteiro teor do registro
imobiliário do imóvel-mãe, tratando-se de um imóvel urbano de área superior a
3.500m², adquirido pelo primeiro requerido e pela autora em registrado em 26.07.2006;
bem como da averbação do desmembramento feita pelo primeiro requerido em
07.02.2013, referente a uma área de 314m².
Consta ainda do
mesmo documento quatro outras averbações referentes à penhora do imóvel
desmembrado relativas às Ações Civis Pùblicas do Ministério Público
(547-58.2009.8.10.0038, 246-77.2010.8.10.0038, 388-18.2009.8.10.0038), e uma
ação de execução fiscal da União nº 538-91.2012.8.10.0038.
Com vistas, o MP
ofereceu parecer pela improcedência da demanda sob a alegação de que o patrimonio
familiar não fora colocado em risco e permaneceu sob o domínio da família.
CONSIDERANDO OS
EFEITOS DE EVENTUAL SENTENÇA NOS PRESENTES AUTOS EM RELAÇÃO À UNIÃO (através da
Procuradoria da Fazenda Nacional) EM FACE DA penhora realizada sobre a área
desmembrada nos autos da execução fiscal
da União nº 538-91.2012.8.10.0038, determinei a intimação da União para
querendo manifestar-se nos autos no prazo de 10 dias.
A União, através
da PFN, disse que como não era parte, não tinha interesse no feito!
Vieram os autos
conclusos.
É O RELATÓRIO.
DECIDO.
O cerne da
questão é saber se a ausência de outorga uxória é causa suficiente para
anulação de um desmembramento da matrícula de um imóvel quando esse imóvel não
chega a sair do patrimônio da família.
O Código Civil de 2002
determina a necessidade de outorga conjugal (anuência
do cônjuge) para a validade de determinados atos e negócios jurídicos, restando
como anulável o ato que a outorga faltar e não for suprida judicialmente.
A
outorga conjugal existe no ordenamento jurídico com a finalidade de controle
patrimonial, isto é, a fim de evitar prejuízo pela disposição
imobiliária por um dos cônjuges ao outro que não é titular do bem. Tal
preocupação se dá considerando que em eventual dissolução da sociedade
conjugal, terá que ser preservada a meação do cônjuge.
Assim, dispõe o artigo
1.647 do Código Civil de 2002:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art.
1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da
separação absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real os
bens imóveis;
II - pleitear, como autor ou réu,
acerca desses bens ou direitos;
III - prestar fiança ou aval;
IV - fazer doação, não sendo
remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as doações
nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.
Da
leitura do artigo anterior é possível notar que a regra não aplica a todos os
regimes de bens. Isto é, a outorga
conjugal é dispensada nos casos de separação total de bens (convencional ou
legal, já que a lei não distingue), e também no regime da participação final
nos aquestos, quanto aos bens particulares, desde que haja pacto antenupcial
neste sentido (art. 1.656 CC).
Tal
fato reforça a idéia de que a outurga uxória somente tem lugar para fins de
evitar um prejuízo patrimonial ao cônjuge inocente com benefício exclusivo para
o cônjuge alienante, tudo visando à harmonia e segurança da vida conjugal e a
preservação do patrimônio.
É certo
que a ausência da outorga uxória nos casos de alienação ou dação do bem imóvel
do casal para ser gravado de ônus real tem como consequência a anulabilidade do
negócio jurídico. (CC, art. 1649):
Art. 1.649. A
falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária ( art.
1.647 ), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge
pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade
conjugal.
Parágrafo único. A
aprovação torna válido o ato, desde que feita por instrumento público, ou
particular, autenticado.
Se é verdade que a
esposa que não consentiu com o desmembramento do imóvel em outro ajuizou a
presente ação dentro do prazo decadencial de 2 anos, chama a atenção o fato de
ambos ainda materem sociedade conjugal e o imóvel desmembrado ter sido
penhorado para pagamento de dívidas do casal.
Sucede que, como
bem pontuado pelo representante ministerial, o desmebramento do imóvel maior
não pode ser carcterizado tecnicamente como uma alienação.
Alienação de bens
é a transferência de domínio de bens de um indivíduo para terceiros.
No caso dos
autos, houve um desmembramento, mas tanto o imovel-mãe quanto o imóvel
desmembrado permaneceram no nome do réu ADÃO NASCIMENTO CARVALHO (id. 48754443
e id. 13786930).
Assim, o
patrimonio familiar não foi posto em risco por qualquer ato.
Importante
destacar que a resente ação somente fora ajuizada pela esposa depois de 4 anos
do desmebramento, que teve como consequencia a retirada da qualidade de bem de
família do imóvel questionado, já que passaram a existir dois imóveis, e
posteriormente um deles sofreu penhoras em ações civis de improbidade administrativa
propostas pelo MP e ação de execução fiscal proposta pela PFN, todas contra a
pessoa de ADÃO NASCIMENTO CARVALHO, ex-presidente da Câmara municipal.
Resta evidente,
portanto, o abuso do direito da autora de agora vir a juízo alegar anulação do
negócio jurídico, pois este, por si só, não lhe causou diminuição patrimonial,
não se podendo falar, tecnicamente, em alienação.
Portanto, o uso
da presente ação é abusivo e visa, em verdade, frustrar as ações Ações Civis Públicas do
Ministério Público (547-58.2009.8.10.0038, 246-77.2010.8.10.0038,
388-18.2009.8.10.0038), e uma ação de execução fiscal da União nº
538-91.2012.8.10.0038, todas garantidas por penhora (id. 13786930).
Com tal conduta
não pode compactuar o Poder Judiciário.
DISPOSITIVO
ANTE
O EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE
a presente ação.
Condeno a autora em custas e despesas
processuais
Condeno, ainda, o requerido em custas
e despesas processuais.
Certifique-se o teor da presente
sentença nas Ações Civis Públicas do Ministério Público
(547-58.2009.8.10.0038, 246-77.2010.8.10.0038, 388-18.2009.8.10.0038), e uma
ação de execução fiscal da União nº 538-91.2012.8.10.0038, bem como eventuais
embargos de terceiros propostos pela autora nas ações acima identificadas.
.
P. R. I.
João Lisboa, 16 de março de 2020.
Juiz Glender
Malheiros Guimarães
Titular
da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa