PROC. 167-93.2013.8.10.0038
Vistos em
Correição.
O Município de João Lisboa/MA moveu ação de RESSARCIMENTO DE DANO
C/C IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA contra FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, já
qualificado, alegando que este, na condição de ex-prefeito municipal do
município de João Lisboa/MA, não prestou contas referentes ao convênio nº 91/2012
celebrado com a Secretaria Estadual de Cultura que teve por objeto a realização
do Carnaval de 2012 no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
Às fls. 30-31-v, a liminar quanto à determinação da exclusão do
nome do município do cadastro de inadimplentes foi indeferida.
Às fls. 33-34 consta um pedido de reconsideração que também foi
indeferido às fls. 38.
Às fls. 39 este juízo determinou a notificação do requerido para
apresentação de manifestação escrita.
Às fls. 44-45-v, o requerido apresenta defesa prévia, oportunidade
em que sustenta inépcia da inicial uma vez que a verba foi usada e as contas
foram prestadas; no mérito, sustenta que toda a documentação referente ao
convenio questionado será juntada oportundamente; que o requerido não praticou
qualquer conduta que caracterize improbidade administrativa; que não há
demonstração do dolo como elemento subjetivo da conduta imputada ao agente;
finaliza requerendo a rejeição da inicial. Juntou documentos de fls. 46-88.
Às fls. 92, a inicial foi recebida tendo sido determinada a
citação do réu para oferecer contestação.
Às fls. 94, o advogado do réu renuncia ao mandato às fls. 95,
determinou-se a intimação do réu para constituir novo advogado.
Às fls. 98-103, o réu, por sua nova advogada, apresentou
contestação oportunidade em que alegou em preliminar a inépcia da inicial
alegando inexistir na inicial uma causa de pedir, pois as contas foram
prestadas, ainda que tardiamente, conforme se verifica do protocolo de fls. 46;
no mérito, sustenta que o pedido encontra-se prejudicado, já que não mais
subsiste a ausência de prestação de contas; que inexiste a demonstração do dolo
como elemento subjetivo da conduta imputada ao agente; que não há prova da
improbidade administrativa; que o atraso na prestação de contas não induz a
ocorrência de fraude; que inexiste dano ao erário; finaliza requerendo a
improcedência da ação.
Ás fls. 106, este juízo determinou a intimação do autor para
réplica e do MP para intervir no feito.
Às fls. 108-113, o município de João Lisboa apresenta réplica,
oportunidade em que refuta a preliminar e no mérito questiona a validade dos
documentos apresentados nos autos.
Às fls. 120, o MP manifesta-se nos autos requerendo que seja
oficiado às Secretaria de Cultura para que a mesma informe o recebimento ou não
da prestação de contas relativa ao convênio.
Às fls. 121, foi deferida a cota ministerial.
Às fls. 123-140, a Secretaria Estadual de Cultura encaminha documentação
informando que as contas referentes ao Convênio nº 91/2012 SECMA informando que
as contas foram apresentadas em atraso e reprovadas, tendo sido tomadas
providências para a Tomada de Contas Especial.
Às fls. 141, este juízo afastou a preliminar de inépcia da inicial
e determinou diligências, intimando-se ainda as partes para especificarem as
provas que pretendem produzir.
Às fls. 145-210, a Secretaria de Cultura encaminha cópia integral
da prestação de contas do convênio.
Às fls. 212 consta certidão da inercia das partes quanto à
especificação das provas.
Às fls. 214-216, o Ministério Público oferta parecer pugnando pela
procedência da demanda.
É o relatório. DECIDO.
FUNDAMENTAÇÃO
DA PRELIMINAR
INÉPCIA
Suscita o réu a inépcia da presente ação tendo em vista que as
contas foram prestadas, ainda que tardiamente, no curso do processo.
Sem razão.
O alegado abandono da causa não guarda nenhuma relação com a
inépcia da inicial cujas causas encontram-se elencadas taxativamente no art. 295,
§ único do CPC:
Art. 295. A petição inicial será
indeferida:
I – quando for inepta;
(...)
Parágrafo único. Considera-se inepta a petição inicial quando:
I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
III – o pedido for juridicamente impossível;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.
Não sendo o caso de qualquer das hipóteses enumeradas, a
preliminar não merece acolhida.
DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE
Entendo
que o caso é de julgamento antecipado da lide, uma vez que a questão de mérito,
em que pese ser de fato e direito, está provada documentalmente sendo
desnecessária a produção de qualquer outra prova em audiência a teor do
disposto no art. 330, I do CPC.
Importante
frisar, ainda, que em que pese intimadas, as partes não requereram a produção
de provas em audiências.
MÉRITO
DO
ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA QUE VIOLOU PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
Primeiramente,
impende ressaltar que a improbidade administrativa é um dos maiores males
envolvendo a máquina administrativa de nosso país e um dos aspectos negativos
da má administração que mais justificam a implementação de um maior controle
social. A expressão designa, tecnicamente, a chamada corrupção administrativa,
que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da administração pública de
seus preceitos basilares de moralidade, legalidade e impessoalidade, ferindo de
morte os princípios da Carta Republicana.
O
conceito de improbidade é bem mais amplo do que o de ato lesivo ou ilegal em
si. É o contrário de probidade, que significa qualidade de probo, integridade
de caráter, honradez. Logo, improbidade é o mesmo que desonestidade, falta de
probidade.
A
Lei Federal nº 8.429/92 disciplina a matéria em questão, estabelecendo que
configura improbidade administrativa o ato praticado por agente público que
importe (i) enriquecimento ilícito, (ii) prejuízo ao erário e (iii) violação
aos princípios da administração pública (arts. 9, 10 e 11 da Lei nº. 8.429/92).
Ressalte-se
que o referido diploma legal abrange todas as pessoas nomeadas como agentes
públicos, quer integrantes da administração direta, indireta e fundacional,
ainda que no exercício da função em caráter transitório ou sem remuneração.
O
douto José Afonso da Silva assim descreve:
14.
ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. (...) Cuida-se de uma imoralidade
administrativa qualificada pelo dano ao erário e corresponde vantagem ao
ímprobo ou a outrem (...). O grave desvio de conduta do agente público é que dá
à improbidade administrativa uma qualificação especial, que ultrapassa a
simples imoralidade por desvio de finalidade[1].
Como
se vê, o renomado constitucionalista destaca a importância do princípio
constitucional previsto no art. 37 da Carta Magna na determinação do que seja
imoralidade administrativa, lembrando que não basta apenas a ilegalidade para
que reste configurada.
Já
Maria Sylvia Zanella di Pietro
ensina que, para que um ato possa acarretar a incidência das penalidades
estabelecidas na Lei de Improbidade Administrativa, são necessários os
seguintes elementos:
a) sujeito passivo: uma das entidades mencionadas no art.
1º da Lei nº 8.429;
b) sujeito ativo: o agente público ou terceiro que induza
ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer
forma direta ou indireta (arts. 1º e 3º);
c) ocorrência do ato danoso descrito na lei, causador de
enriquecimento ilícito para o sujeito ativo, prejuízo para o erário ou atentado
contrato os princípios da Administração Pública; o enquadramento do ato pode
dar-se isoladamente, em uma das três hipóteses, ou, cumulativamente, em duas ou
nas três;
d) elemento subjetivo: dolo ou culpa.[2]
Ao
discorrer sobre o elemento volitivo, anota, ainda, a referida autora:
O enquadramento na lei de improbidade
exige culpa ou dolo por parte do sujeito ativo. Mesmo quando algum ato ilegal
seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo
de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto. (...) a
aplicação da lei de improbidade exige bom-senso, pesquisa da intenção do
agente, sob pena de sobrecarregar-se inutilmente o judiciário com questões
irrelevantes, que podem ser adequadamente resolvidas na própria esfera
administrativa. A própria severidade das sanções previstas na Constituição está
a demonstrar que o objetivo foi de punir infrações que tenham um mínimo de
gravidade, por apresentarem conseqüências danosas para o patrimônio público (em
sentido amplo), ou propiciarem benefícios indevidos para o agente ou para
terceiros. A aplicação das medidas previstas na lei exige observância do
princípio da razoabilidade, sob o seu aspecto da proporcionalidade entre meios
e fins.[3]
A
doutrina direciona-se, portanto, sobre a necessidade de se extrair da conduta
um elemento volitivo, rechaçando-se a possibilidade de responsabilidade civil
objetiva, decorrente, pura e simplesmente, da infringência à norma jurídica. Em
igual sentido, posicionou-se a jurisprudência, a exemplo das ementas abaixo
transcritas:
ADMINISTRATIVO.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1. Embora tenha havido
discrepância inicial, pacificou a jurisprudência desta Corte em reconhecer que
as condutas descritas no art. 11 da Lei de Improbidade dependem da presença do
dolo, ainda que genérico. Consequentemente, afasta-se a responsabilidade
objetiva dos administradores, não se fazendo necessária a demonstração da
ocorrência de dano para a Administração
Pública. Precedentes. 2. Embargos de divergência não providos. (STJ – Primeira
Seção. EREsp 917437/MG – Embargos de Divergência em Recurso Especial
2008/0236837-6. Relator: Min. Castro Meira. DJe 22/10/2010).
PROCESSUAL
CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
TIPIFICAÇÃO. INDISPENSABILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO, NAS HIPÓTESES DOS
ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10)
PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. RECURSO PROVIDO (STJ - Primeira
Seção. EREsp 479812/SP Embargos de Divergência em Recurso Especial
2007/0294026-8 – Relator: Min. Teori Albino Zavascki. DJE 27/09/2010).
De outro viés, anoto ainda que a Administração Pública é
informada por vários princípios constitucionais, entre os quais se destaca o da
legalidade administrativa, o que implica afirmar que toda ação do agente
público deve estar expressamente prevista em lei.
Compulsando
os autos, extraio que o requerido FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, na
condição de prefeito do município de JOÃO LISBOA, celebrou, na data de 15 de
fevereiro de 2012, convênio com o Estado do Maranhão, através da Secretaria
Estadual de Cultura, cujo objeto era execução do projeto “Carnaval 2012”, conforme instrumento contratual
colacionado às fls.21-29.
Examinando
o referido instrumento do convênio, verifico que FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE
MENEZES obrigou-se, mediante o recebimento do importe de R$ 40.000,00 (quarenta
mil reais), a executar o objeto do convênio. A vigência do convênio era da data
da assinatura (15.02.2012) até 30.05.2012, tendo a convenente o prazo de 60
dias, após o término da vigência, para prestação de contas dos recursos
recebidos da concedente.
Em sua defesa prévia e contestação, sustenta o réu a carência da
ação por perda do objeto, pois junta prova de que enviou as prestações de
contas à Secretaria de Cultura referente ao convênio nº 91/2012 conforme
protocolo e ofícios de fls. 46.
Nesse aspecto, cabe ressaltar que a prestação de contas foi
enviada com atraso de mais de 01 (um) ano, pois segundo a cláusula oitava do
convênio (fls. 153) as contas deveriam ser prestadas em 60 dias do término da
vigência do convênio, seja, considerando que a vigência do convênio estava
compreendida no período de 15.02.2012 a 30.05.2012 (cláusula décima primeira),
tais contas deveriam ser prestadas até 30.07.2012, mas somente foram
protocoladas em 21.08.2013 (fls.46), ou seja, com mais de um ano de atraso e
seis meses após o ajuizamento da presente ação (25.02.2013).
Dessarte, não há dúvida de que o réu
infringiu as normas que o obrigavam, na qualidade de administrador da coisa
pública, a prestar contas tempestivamente de numerários repassados pelo Governo
Federal para ser investido em benefício das comunidades locais, inclusive
causando embaraços ao Município quando da realização de novos convênios.
Note-se
que não se aplica ao caso vertente o posicionamento jurisprudencial que isenta
da incidência da Lei de Improbidade o mero atraso na prestação de contas, haja
vista que houve injustificada delonga: a prestação relativa a 2012 veio a ser
apresentada ao órgão competente da SECRETARIA ESTADUAL DE CULTURA após mais de
um ano, e isso depois de provocação do ex-gestor por via judicial (6 meses após
o ajuizamento da demanda).
Ratifico
que o STJ, guardião da lei federal, tem entendido que o simples atraso na
prestação de Contas não configura ato de improbidade administrativa, todavia a
hipótese em exame é distinta. No caso, a prestação de contas somente ocorreu
após o ajuizamento da ação, quando já exauridos seus efeitos nefastos à
municipalidade, ou seja, após o Município se encontrar inadimplente perante o Estado
e, conseqüentemente, com os repasses de verbas suspensos. Assim, adotar esse
fundamento constituiria a criação de causa extintiva da improbidade administrativa
(como o pagamento na esfera penal dos crimes tributários), o que, efetivamente,
não me parece possível tendo em vista que a ação visa tutelar direitos
indisponíveis (LIA, art. 17, § 1º).
Neste diapasão:
APELAÇÃO
CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CONVÊNIO. ATRASO
DESPROPORCIONAL. DOLO DO AGENTE CARACTERIZADO. I - O atraso desproporcional e desarrazoado na apresentação das
contas, que ocorreu apenas após a propositura da ação originária e mais de 8
(oito) meses após encerrado o prazo para a sua devida prestação, caracteriza
ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/92.
II - A conduta dolosa do agente público está caracterizada, in casu, pela
inexistência de justificativa para o atraso na prestação de contas e, por via
de consequência, pela vontade livre e consciente de agir em desacordo com a
lei. III - Apelo provido. (Apelação
Cível nº 30659/2011 (115268/2012), 1ª Câmara Cível do TJMA, Rel. Raimunda
Santos Bezerra. j. 26.04.2012, DJe 29.05.2012).
CONSTITUCIONAL,
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
EX-PREFEITO. LEI 8.429/1992 ART. 11, VI. PRESTAÇÃO DE CONTAS APÓS O AJUIZAMENTO
DA AÇÃO. ATRASO. OMISSÃO. ATO DE IMPROBIDADE. RAZOABILIDADE. REJEIÇÃO DA
INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em que
pese haver entendimento jurisprudencial de que a prestação de contas tardia
afasta a hipótese de ato de improbidade nos termos do art. 11, inc. IV, da Lei
8.429/1992, o atraso desproporcional e desarrazoado caracteriza ato ímprobo,
uma vez que a apresentação das contas ocorreu só após a propositura da demanda
e mais de 1 (um) ano e meio após o termo final para a sua devida prestação.
2. Para a caracterização de ato de improbidade, o Superior Tribunal de Justiça
já se manifestou ser necessário, tão somente, comprovar a ocorrência de culpa
"lato sensu" (dolo direto ou eventual ou culpa) para a caracterização
de ato de improbidade. Restariam feridos os preceitos principiológicos da Lei
de Improbidade Administrativa caso fosse exigido 'dolo direto' na hipótese, na
medida em que ficaria por demais dificultada a prova da conduta, mediante
necessidade de ser demonstrado o agir com propósito lesivo (ao patrimônio ou
aos princípios). 3. Está caracterizado, em tese, na hipótese, ato de
improbidade que atentou contra os Princípios da Administração Pública, não
sendo cabível, portanto, a rejeição da inicial, com fundamento no § 8º do
artigo 17 da LIA. 4. Apelações providas. (Apelação
Cível nº 2007.37.00.004400-0/MA, 4ª Turma do TRF da 1ª Região, Rel. Mário César
Ribeiro, Rel. Convocado Guilherme Mendonça Doehler. j. 16.01.2012, unânime, DJ
30.01.2012).
Com efeito, verifico que as prestações de contas, ao contrário do
que afirmado na inicial, foram enviadas para os órgãos de controle interno da
Secretaria de Cultura do Estado nos dias 21.08.2013, conforme protocolo e
ofícios de fls. 46, fato confirmado pela própria Secretaria de Estado em ofício
de fls. 124.
Compulsando os autos,
extrai-se que o promovido, que na época dos fatos exercia o cargo de Prefeito
Municipal de João Lisboa/MA, e tinha o dever de apresentar prestação de Contas
referente ao convenio em análise junto à Secretaria de Cultura do Estado.
No entanto, o requerido
descumpriu com o ônus, posto que não
prestou contas no momento oportuno, cujo prazo expirou em 30.07.2012,
apresentando a prestação de contas de forma extemporânea em 21.08.2013.
Assim sendo, verifica-se que
o ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração púbica encontra-se devidamente configurado, uma vez que o
promovido, na condição de Prefeito de João Lisboa/MA, deixou de prestar contas,
no tempo e forma devidos, referentes ao Convenio nº 91/2012 junto à Secretaria
de Cultura do Estado.
Neste particular, insta
pontuar que a Constituição Federal, em seu art.70, fixa o dever genérico de
prestação de contas a todo aquele, pessoa física ou jurídica, que utilize,
arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens ou valores de natureza
pública.
Infere-se, portanto, que a apresentação da
prestação de contas, no tempo exigido por lei, permite à
Administração aferir a legalidade dos atos praticados e comprovar o efetivo
cumprimento do convênio firmado.
Outrossim, o art. 11, inciso
VI, da Lei nº. 8.429/92 estabelece que constitui ato de improbidade
administrativa deixar de prestar contas no prazo e condições fixados em lei. Vejamos :
Art.
11-
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente:
VI-
deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo.
Frise-se,
por oportuno, que o ato de improbidade administrativa em questão se consuma na
atuação omissiva do gestor público em deixar de prestar contas no prazo e na
forma disciplinados em lei, apresentando-se como ação de natureza formal, a
qual se integraliza a despeito de qualquer resultado futuro.
A
ausência de prestação de contas é tão grave que a lei a erigiu à condição de
ato de improbidade administrativa, em outras palavras, em ato que fere a moral
e probidade da Administração pública, princípios constitucionais que devem ser
seguidos por aqueles que representam o Poder Público.
No
dizer do doutrinador Silvio Antonio Marques (in Improbidade Administrativa, Ed. Saraiva, 2010, p. 125)
Pratica ato ímprobo que
infringe princípios o agente público que deixar de prestar contas quando esteja
obrigado a fazê-lo (art. 11, VI, da Lei n. 8.429/92). [...] A caracterização do
ato ímprobo ocorrerá na hipótese de o agente ter a obrigação funcional de
prestar contas e, dolosamente, deixar transcorrer o prazo previsto na norma
específica do órgão ou entidade pública.
Nesse
sentido, segue jurisprudência de nossos tribunais:
ADMINISTRATIVO.
PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92, ART. 11, VI. ATOS
QUE ATENTAM CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DESNECESSIDADE DE
OCORRÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. - Os atos que atentam contra os princípios da
Administração Pública são condutas ímprobas previstas no art. 11 da Lei
8.429/92 e independem de demonstração de dano aos cofres públicos ou
enriquecimento ilícito. II - Deixar de prestar contas quando esteja obrigado a
fazê-lo constitui ato violador dos deveres de honestidade, imparcialidade,
legalidade e de lealdade do servidor, que lesam a moralidade administrativa,
enquadrando-se na hipótese de improbidade tipificada no inc. VI do art. 11 da
Lei 8.429/92. III - Como não houve comprovação de dano aos cofres públicos ou
enriquecimento ilícito, o quantum da multa civil deve ser reduzido. IV - Apelo
provido em parte apenas para reduzir a multa civil. (TRF1 – Terceira Turma. AC
20051 BA 2003.33.00.020051-9. Relator: Des. Federal Cândido Ribeiro.
Julgamento: 03/11/2009)
CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN
MORA. REQUISITOS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. AÇÃO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N.º 10.628/2002. INCONSTITUCIONALIDADE DE
FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO DE CHEFE DO EXECUTIVO MUNICIPAL, NO EXERCÍCIO
DO CARGO. NÃO CABIMENTO. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
ATRASO NO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DOS SERVIDORES MUNICIPAIS. AUSÊNCIA DE
DIVULGAÇÃO DAS CONTAS NA CÂMARA MUNICIPAL. ARTS. 48 E 49 DA LEI COMPLEMENTAR
N.º 101/2000. ATOS DE IMPROBIDADE. ART. 10, CAPUT E ART. 11, II, IV E VI DA LEI
N.º 8.429/92. ENQUADRAMENTO. INICIAL. RECEBIMENTO. – (...) III - o atraso no
pagamento do funcionalismo público municipal, bem como a ausência total de
divulgação da disponibilização das contas perante a Câmara Municipal, são
condutas atentatórias aos princípios da administração pública, suficientes para
o enquadramento nos arts. 10 e 11, II, IV e VI, da Lei n.º 8.429/92, não
exigindo a produção de resultado para restar evidenciada a prática de ato de
improbidade. Ação que deve ser recebida para o fato ser devidamente apurado na
instrução processual; - ação de improbidade administrativa recebida. (TJMA – Tribunal Pleno. Ação de
Improbidade Administrativa 162162004 MA. Relator: Dês. Cleones Carvalho Cunha.
Data de Julgamento: 09/12/2004)
Desta
feita, após a análise acurada dos meios de provas coligidos aos autos, tem-se
por demonstrado que o promovido ao deixar de prestar contas referentes ao Convênio
nº 91/2012, praticou ato de improbidade administrativa consubstanciado em
violação a princípios constitucionais, perfazendo, com este comportamento, o
ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11, VI, da Lei 8.429/1992.
Quanto ao elemento subjetivo,
vislumbro que restou demonstrada o dolo consistente na vontade livre e
consciente do réu de deixa de prestar contas no tempo e forma devidos mesmo
estando obrigado a fazê-lo. Portanto, diante da inércia do demandado em cumprir
com o seu dever constitucional de prestação de contas relativas ao referido
convênio, enquanto destinatário de recursos públicos vinculados a finalidade
específica, resta evidenciada a vontade livre e consciente do requerido em não
fazê-lo, fato que configura o dolo
enquanto elemento subjetivo da conduta ímproba que lhe é imputada.
Nesse
aspecto, necessário destacar que o ora requerido deixou de prestar contas no
tempo e forma devidos inviabilizando o exame comparativo das despesas
supostamente realizadas, e dificultando a fiscalização da efetiva aplicação dos
recursos que lhe foram destinados por intermédio do convênio objeto do presente
feito, violando dever funcional que lhe competia, já que exercia a titularidade
do Poder Legislativo Municipal à época dos fatos.
Tal
inviabilidade, inclusive foi corroborada pelo próprio sistema de controle
interno da Secretaria de Cultura que após analise da documentação enviada,
concluiu pela desaprovação das contas
com encaminhamento para Tomada de Contas Especial, conforme ofício e documentação
de fls. 123-140 e fls. 145-210.
Com
efeito, a ausência de prestação de contas fere o princípio da publicidade que
deve nortear a atividade dos gestores públicos. De outra banda a sua
desaprovação revela aplicação indevida e espúria das referidas verbas,
inviabilizando o controle dos gastos do administrador público, em afronta ao
princípio da Moralidade Administrativa, revelando imperiosa a condenação
daquele que o pratica, nas penas do art. 12, III, da Lei n.º 8.429/92
Ademais,
tinha pleno conhecimento da obrigação que lhe era imposta, e detinha os
elementos materiais para viabilizar o cumprimento do dever de prestar contas,
dentro do prazo estipulado pela legislação vigente. Portanto, o descumprimento
do ônus de sua responsabilidade caracteriza o ato de improbidade por ele
praticado.
Nesse
sentido, é a orientação jurisprudencial:
APELAÇAO
CÍVEL. EX -PREFEITO. AÇAO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE. PRESTAÇAO DE
CONTAS EXTEMPORÂNEA. LESAO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS.
1.Os agentes públicos
no exercício de mandato, independentemente das sanções penais, civis e
administrativas, previstas na legislação específica, estão submetidos às penas
previstas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade), fato que, evidentemente, conduz
à subsunção de ex-prefeitos aos preceitos da referida legislação.
2. Pode o Parquet, a
qualquer momento, ressalvado o lapso prescricional para aplicação de sanções, ajuizar ação para combater suposta
improbidade por apresentação tardia de prestação de contas, bem como por
eventual enriquecimento ilícito e dano ao Erário daí decorrentes.
4.Recurso conhecido e
improvido. (APC 201000010050318 PI, Relator: Des. José Ribamar Oliveira, Data
de Julgamento: 28/06/2011, 2a. Câmara Especializada Cível)
“[...] Atraso na prestação de contas de
candidato. Rejeição de contas pelo TCU. Inelegibilidade. [...] I - A prestação extemporânea de contas pelo
candidato ao cargo de Prefeito configura hipótese de crime de responsabilidade
e ato de improbidade administrativa, além de acarretar prejuízos à municipalidade,
impedida de celebrar novos convênios de transferência de recursos. (Ac.
de 25.8.2009 no AgR-AgR-REspe nº 33.292, rel. Min. Ricardo Lewandowski.)
Registre-se,
por oportuno, que nos casos do artigo
11, a Primeira Seção do STJ unificou a tese de que o elemento subjetivo
necessário para caracterizar a improbidade é o dolo genérico, ou seja, a
vontade de realizar ato que atente contra os princípios da administração
pública.
Diante
das argumentações acima postas, assiste razão ao autor, devendo o requerido ser
condenado nas penas impostas no art. 12 da Lei nº. 8.429/92, por ter praticado
ato de improbidade administrativa.
A
respeito desta temática, apresentamos os seguintes julgados do STJ, que
corroboram o entendimento ora exposto:
ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
SECRETÁRIO DE FAZENDA MUNICIPAL. APLICABILIDADE
DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA A AGENTES POLÍTICOS MUNICIPAIS. USO
INDEVIDO DE VERBA PÚBLICA. OMISSÃO QUANTO À PRESTAÇÃO DE CONTAS.
1. A jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que se aplicam a agentes
políticos municipais, tais como prefeitos e secretários municipais, as sanções
previstas na Lei 8.429/1992.
3. Omissão do agravante em
instaurar Tomada de Contas Especial, para cobrança do que foi gasto
indevidamente, configurando ofensa aos princípios da Administração Pública, nos
termos do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa.
(AgRg no Ag 1286329/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado
em 17/08/2010, DJe 28/04/2011).
ADMINISTRATIVO
– AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – FALTA DE PRESTAÇÃO
DE CONTAS – AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS
ADMINISTRATIVOS – ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92.
1.
O art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/92
prevê, expressamente, que constitui ato de improbidade administrativo
deixar de prestar contas quando o agente estiver obrigado a fazê-lo.
2.
A jurisprudência desta Corte, quanto ao resultado do ato, firmou-se no sentido
de que se configura ato de improbidade a lesão a princípios administrativos, o
que, em princípio, independe da ocorrência de dano ou lesão ao erário público.
(REsp 852.671/BA, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
20/04/2010, DJe 03/05/2010).
Nesses
termos, resta efetivamente demonstrada a caracterização do ato de improbidade
administrativa pelo ex-gestor municipal, passível de aplicação das sanções
cominadas na Lei de Improbidade Administrativa.
DAS
PENALIDADES APLICÁVEIS
Nos termos do artigo 12, I, II e III da LIA (Lei 8.429/92),
são penalidade aplicáveis aos agentes públicos que, no exercício de suas
funções, pratiquem atos de improbidade administrativa: (i) o ressarcimento do
dano; (ii) multa civil; (iii) perda dos valores ilicitamente incorporados ao
patrimônio do agente, (iv) perda da função pública; (v) proibição de contratar
com o poder público e (vi) suspensão dos direitos políticos.
Assim sendo, verificada a conduta ímproba e desonesta de
agente público na condução de interesses públicos, caberá ao Judiciário a
aplicação das reprimendas designadas no citado artigo 12 da Lei 8.429/92.
Observe-se que as penalidades deverão ser aplicadas
obedecendo a parâmetros de proporcionalidade entre a natureza do ato de
improbidade e a extensão do dano causado à coletividade, sob pena de serem
inquinadas de inconstitucionais.
Na hipótese em apreço, verifica-se que o prejuízo causado
à coletividade foi relevante, mas de pequena monta uma vez que o promovido
deixou de prestar contas de convenio nº 91/2012 junto à SECMA, no momento oportuno,
bem como, suas contas foram rejeitadas, consoante PARECER TECNICO
SCC/SUFIN/SECMA Nº 329/2013 e DECISÃO da Secretária de Estado de Cultura datada
de 18.12.2013. (fls. 207-2010)
Diante de todos esses fatores, deverá o promovido
receber censura deste juízo, ficando condenado nas sanções de ressarcimento ao
erário, suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o poder
público, nos patamares a seguir fixados.
Mostra-se incabível, in
casu, a condenação à perda da função pública, uma vez que prejudicada pelo
transcurso do prazo de seu mandato.
Quanto ao pedido de retirada da negativação do Município
de João Lisboa/MA do sistema de inadimplência da Secretaria Estadual de
Cultura, não o conheço, já que o Estado do Maranhão não figurou no pólo passivo
da presente demanda.
DISPOSITIVO:
Por todo o exposto, e por tudo mais que dos autos consta,
JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a
pretensão condenatória deduzida na inicial e, por consequência, CONDENO o requerido, FRANCISCO EMILIANO RIBEIRO DE MENEZES, ex-Prefeito Municipal de
João Lisboa, por violação à norma contida no art. 11, inciso VI, da Lei
8.429/92 (LIA).
Outrossim,
considerando a extensão do dano causado à coletividade, a gradação da
improbidade praticada, sua repercussão no erário público, bem como as demais
diretrizes normativas insculpidas no artigo 12, inciso III e parágrafo único da
Lei 8.429/1992, APLICO AO REQUERIDO AS SEGUINTES PENALIDADES:
I) Suspensão dos direitos
políticos pelo período de 03 (três) anos;
II) Ressarcimento integral do Dano no valor de
R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) devidamente atualizado pelo INPC;
III) Proibição
de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que seja por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo período de 03 (três) anos.
Outras
Diligências:
a) Notifique-se o Ministério Público
Estadual.
b) Intime-se o Município de João Lisboa/MA, a
fim de que tome conhecimento da presente sentença.
c) Custas processuais por conta do condenado.
d) Após o trânsito em julgado da sentença,
oficie-se à Câmara Municipal, remetendo-lhes cópia dessa decisão, para os fins
de direito e, especialmente, para as anotações, nos registros respectivos, da
proibição acima determinada, bem como ao Tribunal
Regional Eleitoral – TRE/MA e ao Cartório da 58ª Zona Eleitoral, acerca da
suspensão dos direitos políticos pelo prazo epigrafado, nos termos do art. 15,
V, e art. 37, § 4º, da Constituição Federal e art. 71, inciso II, do Código
Eleitoral.
e) Com
o trânsito em julgado, inclua-se a presente condenação no Cadastro do CNJ de
condenados por atos de improbidade (Resolução nº 44 de 20 de novembro de 2007).
Publique-se.
Registre-se. Intimem-se as partes.
Após
o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição.
Cumpra-se.
João Lisboa/MA, 13 de janeiro de 2016.
Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa
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