Autos nº. 1659-36.2013.8.10.0066 – Ação de Reintegração
de Posse
Requerente:
ANTONIO AUGUSTO NASCIMENTO MACHADO e MARIA CLÉLIA FALCÃO MACHADO
Requerido: ADÃO
ORQUISA SOARES e outros
DECISÃO
ANTONIO
AUGUSTO NASCIMENTO MACHADO e MARIA CLÉLIA FALCÃO MACHADO, qualificados à fl.
02, ajuizaram a presente ação de Reintegração de Posse em desfavor de ADÃO
ORQUISA SOARES e outros, alegando, em síntese, que são legítimos possuidores e
proprietários do imóvel descrito à fl. 03 e que estão sofrendo esbulho
possessório por parte dos requeridos, que, a partir do mês de abril do ano de
2013.
Relatam
que foram até a área conversar com os requeridos, que concordaram em se
retirar, requerendo um prazo, não tendo, entretanto, até o mês de setembro de
2013, cumprido o acordado.
Em razão
disso, entregaram ao Sr. FRANCISCO DE ASSIS BATISTA MOURA uma notificação para
que os réus deixassem a área (fl. 16), porém, somente o próprio notificado
teria se retirado da área, permanecendo os demais no local. Posteriormente, em
outubro de 2013, novos esbulhadores teriam se instalado no local.
Postula
a concessão de liminar com o fim de ver resguardado o seu direito à posse.
Requer,
igualmente, a antecipação da tutela, com a determinação da demolição das
construções realizadas das construções realizadas irregularmente, bem como, ao
final da ação, a cominação de pena para o caso de novo esbulho.
Instruiu
o pedido com certidão do registro do imóvel, cadeia dominial, certidão de ônus,
notificação para desocupação, declaração da Associação de Pequenos Produtores e
Produtoras Rurais do Projeto de Assentamento Belo Monte III, bem como ofícios
que requerem o encaminhamento da proposta de compra e venda do imóvel.
À
fl. 27, este juízo negou o benefício da justiça gratuita e determinou o
recolhimento das custas.
Custas
recolhidas à fl. 29.
Vieram
os autos conclusos.
É o
relatório. Decido.
A reintegração de posse é o remédio
processual adequado à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão
de um esbulho, sendo privado de seu poder físico sobre a coisa. Não é
suficiente o incômodo; essencial é que a agressão provoque a perda da
possibilidade de controle e atuação material no bem antes possuído, uma vez que
nos termos do art. 926 do CPC: “o possuidor tem o direito de ser mantido na
posse em caso de turbação e reintegrado no caso de esbulho”.
O esbulho se caracteriza em situações em que
a posse é subtraída por qualquer dos vícios objetivos, enumerados no art. 1200
do Código Civil, quais sejam: a
violência, precariedade e clandestinidade.
O autor, titular da posse, assim como o nu proprietário, tanto pode ser
autor como réu nas ações possessórias, segundo interpretação do art. 1.197 do Código Civil e art. 95 e ss. do
Estatuto da Terra, in verbis:
Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em
seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a
indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua
posse contra o indireto.
Em seus comentários ao Código Civil, NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE
ANDRADE NERY esclarecem que "tanto o possuidor direto
quanto o possuidor indireto – como, por exemplo, o
nu-proprietário, o dono da coisa
empenhada, o locador etc. - têm
direito à defesa de sua posse,
contra terceiros, por meio dos interditos
possessórios".
No presente caso, resta evidenciado que os autores tinham a posse do
imóvel, a qual foi adquirida por sucessão universal já que a litisconsorte
MARIA CLÉLIA FALCÃO MACHADO é herdeira necessária do anterior proprietário MECENAS
PEREIRA FALCÃO sendo tal domínio devidamente registrado no Cartório de Registro
de Imóveis desde 15.01.1992 (fls. 10).
Feitas tais
considerações, analisando os autos, a luz da documentação que instrui a
inicial, pode-se constatar que os autores provaram a posse justa, nos
termos do art. 1200 do CC (Art. 1.200. É justa a posse que não for
violenta, clandestina ou precária.), do
imóvel FAZENDA BELO MONTE, adquirida em 15.01.1992 (fls. 26-29), demonstrando a
tradição da posse por sucessão universal.
Ademais, convém
destacar que a posse dos autores foi exteriorizada por diversas formas, dentre
as quais a tentativa de desocupação amigável da área supostamente efetuada em
abril de 2013, a própria notificação extrajudicial direcionada a um dos esbulhadores,
supostamente um dos líderes, efetuada em 06.09.2013, as tratativas com vistas a
alienação da área em litígio narradas nos documentos de fls. 17-25.
Das provas colhidas não
ocorre nenhum juízo, em sentido contrário, ou seja, de que os autores, por si
ou por prepostos, de alguma forma, não empreendesse qualquer conduta a
veicular, subjetiva ou objetivamente, traços
do exercício de uma posse.
A posse
exterioriza-se pelo exercício de poder sobre a coisa. Porém, a visibilidade de
que a pessoa está em contato com a coisa não é suficiente para caracterizar a
situação jurídica de possuidor. A qualificação de um fato como posse depende da
investigação de sua origem e do título em que se diz fundada.
Compulsando os autos, verifico que os autores foram legitimamente
investidos, na posse e domínio do imóvel por longo período, desde o dia 15.01.1992.
E somente foram desapossados no último mês de março de 2013, após serem
informados por vizinhos que os requeridos instalaram-se na área em litígio.
Portanto, a atual posse dos requeridos é inquinada de vício, na medida em
que as notificações verbal e escrita extrajudiciais anexados aos autos demonstram
que a mesma fora obtida de maneira clandestina, às escondidas, o que
caracteriza sua ilicitude, diante do ordenamento jurídico.
A posse é clandestina quando se adquire via processo de ocultamento em
relação àquele contra quem é praticado o apossamento. É um defeito relativo:
oculta-se da pessoa que tem interesse em retomar a posse, em bora possa ser ela
pública para os demais. Na clandestinidade, o possuidor não percebe a violação
de seus direitos e, por isso, não pode reagir.
A inicial narra atos de clandestinidade, já que os esbulhadores
aproveitaram-se da ausência física dos proprietários – residente em Barra do
Corda/MA - para instalarem-se no imóvel rural.
Acerca da liminar pleiteada, dispõe o art. 927 e 928 do CPC:
Art. 927. Incumbe ao autor provar:
I – a sua posse;
II – a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III – a data da turbação ou do esbulho;
IV – a
continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse,
na ação de reintegração.
Art. 928. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá,
sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de
reintegração; no caso contrário, determinará que o autor justifique previamente
o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada.
Por
tais argumentos, que demonstram satisfatoriamente, em juízo de cognição
sumária, mera prelibação, preenchimento dos pressupostos ao deferimento da
medida liminar de reintegração de posse, acrescidos da inclusão desta causa
àquelas que a doutrina convencionou chamar de ação de força nova, por estar
dentro do prazo de ano e dia da data do esbulho, autorizadora do deferimento da
medida antecipatória de reintegração, nos termos do artigo 924, 927 e 928 do
Código de Processo Civil, outra solução não há senão conceder preambularmente a
reintegração de posse ao autor.
Com efeito, observo que os
autores demonstraram estarem legitimamente investidos na POSSE do imóvel em litígio, seja pelos registros imobiliários
que indicam que a FAZENDA BELO MONTE fora adquirida
em 15.01.1992 (fls. 10), demonstrando a tradição da posse por sucessão
hereditária; notificações verbais e escritas demonstrando sua irresignação
desde o primento momento em que teve ciência da invasão (fls. 05).
O ESBULHO também restou
caracterizado sumariamente nos autos conforme notificação extrajudicial de fls.
05 e declaração da presidente da Associação de produtores Rurais do
Assentamento Belo Monte IIII (fls. 17-21; a data do esbulho também consta dos
autos, ou seja, ocorreu desde o mês de março de 2013, data em que o grupo
liderado pelos requeridos teria se instalado na FAZENDA BELO MONTE e
desapossado ilicitamente os autores, mediante atos de clandestinidade. Por fim,
a perda da posse remanesce até os dias atuais desde o desapossamento.
Portanto,
entendo devidamente preenchidos os requisitos para a concessão da liminar
pleiteada. Nesse mesmo sentido segue jurisprudência:
“MEDIDA CAUTELAR - Liminar - Deferimento -
Admissibilidade - Reintegração de posse - Irrelevância da alegada invalidade e inveracidade
do documento instrutório da inicial - Esbulho possessório verificado na
audiência de justificação de posse - Artigo 928 do Código de Processo Civil -
Fase procedimental, ademais, onde não é lícito ao demandado produzir provas,
limitando-se tão somente a fiscalizar a regularidade da audiência - Decisão summaria
cognitio mantida - Recurso não provido. A prova necessária e suficiente
para que o Juiz conceda a liminar de reintegração é apenas prova de
verossimilhança dos fatos alegados pelo autor.” (TJ/SP, Relator: Mohamed Amaro
- Agravo de Instrumento n. 232.531-2 - Campinas - 04.08.94)
Por tudo que se foi argumentado, bem com pelas provas
escorreitas colacionadas aos autos, resta delineada a posse, sua perda, o
esbulho e sua época, elementos tais indispensáveis ao deferimento da medida
liminar reintegratória e, analisados pelo magistrado e constatada suas
presenças, conduzem, invariavelmente, a concessão do pleito ao requerente.
Ante
o exposto, DEFIRO A REINTEGRAÇÃO LIMINAR pleiteada por
ANTONIO AUGUSTO NASCIMENTO MACHADO e MARIA CLELIA FALCAO MACHADO, em desfavor
de ADÃO
ORQUISA SOARES, CLEOMAR DE TAL, MARIA RAIMUNDA DOS SANTOS SILVA, JÂNIO DOS
SANTOS CONCEIÇÃO, EDIMILSON FERREIRA DA SILVA, REGIDA BENA DE SOUSA, MARILENE
MENDES DOS SANTOS, RAIMUNDO SANTOS RIBEIRO, ROBSON SOARES CALDAS, MARIA DA
CONCEIÇÃO SOUSA, DOMINGOS ORQUISA SOARES, ORIZAN DA SILVA SOUSA, ERISMAR DA
SILVA SOUSA, MILTON CARLOS DE OLIVEIRA, DEUZINELE DA SILVA SOUSA, ROMÁRIO
CARNEIRO DE SOUSA, ANTONIA GOMES DA SILVA e ESMERALDO PAÇA RODRIGUES, conhecido
como “PIMENTA”, e/ou quem os acompanhe no local, o fazendo
em virtude do preenchimento dos requisitos insculpidos no artigo 924, 927 e 928
do Código de Processo Civil, devendo o processo seguir em seus ulteriores
termos, intimando-se
o requerido desta decisão e para, querendo, apresentar contestação no prazo
legal de 15 (quinze) dias.
Outros pessoas instaladas na Fazenda Belo Monte, que
participaram do referido esbulho devem ser intimados
e citados por edital com prazo de 30 (trinta) dias, para querendo
apresentar contestação no mesmo prazo.
Sendo necessário, autorizo, desde já, o cumprimento da
medida liminar mediante arrombamento e com o uso de força policial.
Oficie-se À SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA, COMANDO DA
POLÍCIA MILITAR, 3º BATALHÃO DA POLÍCIA MILITAR E DELEGACIA REGIONAL DE POLÍCIA
CIVIL DE IMPERATRIZ a fim de que seja providenciado o efetivo cumprimento da
presente decisão.
Intime-se e Cumpra-se.
Amarante do Maranhão/MA, 07 de fevereiro de 2014.
Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da Comarca de Amarante do
Maranhão
Privilegiou-se pessoas que mantinham um imóvel abandonado e sem função social ao ponto de só perceberem uma ocupação um bom tempo depois?
ResponderExcluirNão me parece justo.
Enquanto o judiciário continuar tratando as terras do país como meras aquisições de papéis, legitimadas nas capitanias hereditárias da vida, teremos sem terras e sem tetos, o que é inadmissível num século de tanta abundância.