sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

DECISÃO. INDEFERE TUTELA ANTECIPADA. ANULAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO.

Proc. 338-79.2015.8.10.0038

Autor: ETEVALDO CARNEIRO FERREIRA FILHO
Réu: MUNICIPIO DE JOÃO LISBOA

DECISÃO

                                      ETEVALDO CARNEIRO FERREIRA FILHO, qualificado às fls. 02 dos autos, representado por advogado, ajuizou a presente ação COM PEDIDO DE LIMINAR com o fito de obter a unificação de suas duas matrículas no cargo de professor que ocupa no município de João Lisboa fato que, em tese, permitiria a manutenção de sua acumulação com um terceiro cargo de professor que ocupa no município de Davinópolis/MA.
Requer liminar no sentido de obter a suspensão do processo administrativo disciplinar que apura tal irregularidade junto ao município de João Lisboa/MA, sustentando ainda irregularidade formais no referido procedimento, tais como: ilegalidade na formação da comissão processante, por não indicar o cargo ou nível de escolaridade dos seus membros; ilegalidade na alteração dos membros de tal comissão, uma vez que não houve publicação; existência de documentos sem as assinaturas de todos os membros; ausência de notificação do servidor, através de seu chefe imediato para optar pelo cargo que deseja manter; e que não foi respeitado o prazo de 60 dias prorrogáveis por igual período para a duração do processo que já perfaz 01 ano.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. DECIDO.
DA LIMINAR PLEITEADA

          Para a concessão da liminar faz-se imprescindível a presença de requisitos previsto em lei, quais sejam, a prova inequívoca que conduza à verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou o abuso do direito de defesa. Necessário, ainda, que não haja perigo de irreversibilidade da medida, consoante previsão do art. 273 do Código de Processo Civil.
          Tendo em vista a medida acaba por suprimir, de início, o contraditório, deve restar devidamente claro ao magistrado o preenchimento das exigências legais, o que demanda parcimônia e equilíbrio na análise do feito, sob pena de banalização da medida.

          No tocante ao requisito da relevância do fundamento da demanda, deve ser entendido como a existência de prova inequívoca, capaz de convencer o juízo da verossimilhança da alegação contida no pedido, ou seja, suficiente para fazer o magistrado chegar à conclusão de que as afirmações expostas na petição inicial provavelmente correspondem à realidade.

Por relevância do fundamento da demanda, temos que exista prova inequívoca, capaz de convencer o juízo da verossimilhança da alegação contida no pedido. Ressalte-se, contudo, que a locução prova inequívoca não pode ser interpretada de forma rigorosa e absoluta, o que será necessário apenas na fase do provimento judicial final (sentença), mas sim como a prova suficiente a convencer o juiz de que as afirmações expostas na petição inicial são passíveis de corresponder à realidade, hábil a convencer o magistrado da verossimilhança da alegação (Fumaça do Bom Direito).

          No que tange ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, tal requisito, para que reste configurado, faz-se necessário: a) que seja impossível o retorno ao status quo ante (dano irreparável); b) que, mesmo sendo possível o retorno ao status quo ante, a condição econômica do réu não garanta que isso ocorrerá ou os bens lesados não sejam passíveis de quantificação de maneira a viabilizar a restituição integral dos danos causados, tal como ocorre com as lesões aos direitos da personalidade, v.g, a honra, a integridade moral, o bom nome, entre outros (dano de difícil reparação).

          No caso em análise verifico que as razões invocadas pelo autor não são suficientes para concessão de liminar. A alegação de violação ao princípio do Devido Processo Legal é impertinente, senão vejamos:


1)    Quanto à suposta ilegalidade na formação da Comissão Processante por não indicar o cargo ou nível de escolaridade dos seus membros, observo que às fls. 12 consta cópia da Portaria nº 03/2014 – SEAMO, a qual indica claramente o nome e os cargos com as respectivas matrículas dos servidores que constituíram a Comissão Processante do respectivo processo administrativo, de forma que tal alegação não merece prosperar.
Da análise da documentação juntada (fls. 12), observo que todos os membros da comissão ocupam no mínimo cargo de mesmo nível do autor, sendo servidores estáveis, não havendo, portanto, a irregularidade apontada, que se houvesse conduziria à anulação da comissão, conforme assentou o STJ:

ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL - PROCURADOR AUTÁRQUICO - PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - COMISSÃO- CONSTITUIÇÃO IRREGULAR (ARTS. 149, C/C 150, LEI 8.112/90) - NULIDADE.
1 - É nulo o processo administrativo disciplinar cuja comissão seja constituída por servidores que, apesar de estáveis, não sejam de grau hierárquico superior ou igual ao indiciado. Preserva-se, com isso, o princípio da hierarquia que rege a Administração Pública, bem como a independência e a imparcialidade do conselho processante, resguardando-se, ainda, a boa técnica processual. Inteligência dos arts. 149 e 150, ambos da Lei nº 8.112/90, com as alterações trazidas pela Lei nº 9.527/97" (STJ - RESP 152224/PB - DJ: 07/08/2000 - p. 00126 - Relator Min. JORGE SCARTEZZINI - j. 16/05/2000 - 5ª Turma).

2)    Quanto à suposta ilegalidade na mudança dos membros da comissão processante sem a devida publicação, inclusive com mudança do presidente da comissão, observo que às fls. 18, consta o ato administrativo que constituiu a nova comissão, qual seja, a PORTARIA Nº 11/2015- SEAMO, com certidão de que a referida portaria foi devidamente publicada no Mural de Publicação da Prefeitura em 23.01.2015, atingindo desta forma a finalidade de publicidade do referido ato, motivo pelo qual também afasto a referida argumentação.
3)    Quanto à suposta ausência de notificação do servidor, por seu chefe imediato, para opção pelo cargo que pretendia manter, entendo que tal notificação está prevista no estatuto próprio do Servidor Público Federal, não sendo possível afirmar se foi ou não repetido no Estatuto Local – uma vez que tratando-se de lei municipal caberia à parte a sua juntada aos autos nos termos do art. 337 do CPC – mas, ainda que tivesse, verifico à partir da PORTARIA Nº 03/2014-SEAMO de fls. 12, que houve uma prévia notificação nº 01/2014, datada de 22.01.2014 (cujo teor não é possível aferir a partir dos autos), e que, portanto, antecedeu a instauração do processo administrativo questionado (16.04.2015), a qual não foram juntada aos autos o que dificulta a cognição deste juízo.
Entretanto, ainda que não tenha havido tal oportunidade ao autor, colho a partir da cópia do seu próprio interrogatório de fls. 32 (devidamente acompanhando de seu advogado) que o mesmo fez clara opção pela manutenção dos cargos que ocupa em João Lisboa em detrimento daquela que ocupa em Davinópolis, comprometendo-se, inclusive, a juntar nos autos do processo administrativo a cópia do respectivo pedido de exoneração. Sendo assim, não reconheço o vício apontado, uma vez que, ainda que tenha existido, tal irregularidade foi suprida com a manifestação do servidor conforme previsão do art. 133, §5º da Lei nº 8112/90:

“Art. 133. Detectada a qualquer tempo a acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas, a autoridade a que se refere o art. 143 notificará o servidor, por intermédio de sua chefia imediata, para apresentar opção no prazo improrrogável de 10 (dez) dias, contados da data da ciência e, na hipótese de omissão, adotará procedimento sumário para a sua apuração e regularização imediata, cujo processo administrativo disciplinar se desenvolverá nas seguintes fases:
(...)
§ 5º A opção pelo servidor até o último dia de prazo para defesa configurará sua boafé, hipótese em que se converterá automaticamente em pedido de exoneração do outro cargo.”

4)    Quanto à alegação de existência de documentos sem as assinaturas de todos os membros, observo que se trata de mera irregularidade uma vez que apesar de não constar a assinatura de um dos membros na audiência de instrução do respectivo processo administrativo (fls. 32-37), em todos os seus termos consta a presença de todos os membros da comissão processante, o que não foi questionado em qualquer momento da instrução e nem mesmo nas alegações finais do referido procedimento.
5)    Quanto à alegação de que não foi respeitado o prazo de 60 dias prorrogáveis por igual período para a duração do processo que já perfaz 01 ano. Essa questão ao longo do tempo vem suscitando embaraços, pois, nem sempre se mostra possível a conclusão do processo administrativo disciplinar no prazo em lei estabelecido.

A tese esposada não é de todo ignorada e sem fundamento, especialmente quando se consulta a doutrina especializada e se observa que a orientação expedida a respeito desse tema é no sentido de que: "Não tendo sido cumprido o prazo, nem mesmo com a prorrogação, a autoridade instauradora tem o dever de destituir a comissão, nomeando-se outra para prosseguir os trabalhos" (conforme PALHARES MOREIRA REIS, "Manual do Servidor Público", Brasília (DF): CTA, 1993, página 210). Sustenta, ademais, o ilustrado autor que, ultrapassado o prazo legal estabelecido para a conclusão da sindicância ou do processo disciplinar, ter-se-á como nulo o trabalho realizado.

Além dessa orientação induvidosamente abalizada, colhe-se aquela externada por JOSÉ ARMANDO DA COSTA (in, "Teoria e Prática do Processo Administrativo Disciplinar", Brasília (DF): Editora Brasília Jurídica, 1996, página 194) nos seguintes termos: "O processo deverá ser relatado e concluído à autoridade instauradora, para julgamento, no prazo de sessenta dias. Esse prazo, nos casos de força maior, ou em que as circunstâncias o exigirem, poderá ser prorrogado por igual prazo. Não sendo os trabalhos concluídos nessa prorrogação, deverá a comissão ser redesignada para, no lapso de sessenta dias, ultimar essa tarefa".

Ao se referir ao prazo de conclusão da sindicância da Lei nº 8112/90, reafirma ainda o insigne doutrinador que "Pela cogência da disposição contida no artigo 145, parágrafo único, o prazo originário de 30 dias somente admite uma prorrogação por igual período. Fora dessa expressão temporal de 60 dias, deverá ser designada nova comissão sindicante".

A tese, não há dúvida, resulta de uma avaliação literal das disposições legais contidas no artigo 145, parágrafo único, e artigo 152, da Lei nº 8.112/90, já que em tais dispositivos se fixa, de modo taxativo, o prazo de conclusão dos trabalhos processantes, neles não se vendo quaisquer ressalvas alusivas à possibilidade de dilação de tal prazo por período superior ao previsto.

Visto desse modo o alcance de tais dispositivos, cumpre indagar-se acerca da razoabilidade dessa interpretação que, privilegiando excessivamente a formalidade em detrimento do fim a ser alcançado, nega a possibilidade de, mediante justificativas hábeis, conceder-se as dilatações de prazo pelos períodos necessários à apuração do fato que originou a instauração do procedimento.

A despeito da autoridade dos ilustres doutrinadores citados, entendo, maxima data venia, que não há qualquer sentido prático na adoção do conteúdo literal dos dispositivos em comento, mostrando-se mais adequado à realidade jurídica o entendimento que se colhe nos arestos que vão a seguir transcritos:

ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.  ULTRAPASSAGEM DO PRAZO FIXADO PARA O TÉRMINO DO PROCESSO. NULIDADE. NÃO-OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. RECURSO IMPROVIDO.
i. a ultrapassagem do prazo fixado para o encerramento do processo administrativo disciplinar não conduz à nulidade, mas tão-somente à cessação da medida cautelar do afastamento preventivo do cargo do servidor público acusado.
(Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, Recurso em Mandado de Segurança nº 455 (90.005123-1) - Bahia, Relator Ministro ADHEMAR MACIEL, julgamento em 15 de maio de 1997, publicado no Diário da Justiça de 23.06.97.)

ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRAZO DE CONCLUSÃO. SUPERAÇÃO.
1. a superação de prazo fixado legalmente, sem previsão de sanção, para que a autoridade administrativa decida sobre processo disciplinar, não importa na sua extinção e nem em perdão tácito.
2. à parte aproveita apenas a invocação de norma disciplinadora da prescrição das sanções administrativas.
(Superior Tribunal de Justiça, 6ª Turma, Recurso em Mandado de Segurança nº 7.791 - Minas Gerais (96/0068056-6), Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, julgamento em 12 de agosto de 1997, publicado no Diário da Justiça de 01.09.97.)

"ATO DEMISSÓRIO DE RESPONSABILIDADE DA MESA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. PRETENSÃO ANULATÓRIA DO ATO, À LUZ DO EXCESSO VERIFICADO NO PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DO INQUÉRITO. INCONSISTÊNCIA DA ARGUMENTAÇÃO, VISTO QUE O ARTIGO 169, § 1º, DA LEI 8.112/90 PROCLAMA NÃO SER, SEMELHANTE DEMORA, FATOR NULIFICANTE DO PROCESSO."
(Mandado de Segurança nº 21.949/DF, Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, por maioria absoluta - 8 votos vencedores, contra o voto-vencido do Ministro MARCO AURÉLIO, relator para o acórdão Ministro FRANCISCO REZEK, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência 142/804).

Versando ainda essa questão específica, mostra-se de todo oportuna a preleção feita pelo ilustre Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, do Colendo Supremo Tribunal Federal, nos seguintes moldes:
"Estou convencido de que o único efeito da superação dos prazos, tanto para o encerramento de processo administrativo, quanto do seu julgamento pela autoridade competente, é a cessação da medida cautelar da suspensão preventiva do funcionário, acaso aplicada. O eminente Ministro CARLOS MÁRIO mostrou que, tanto no regime da Lei nº 1.711 - que creio corresponder a resolução específica da Câmara dos Deputados - quanto na atual lei chamada do Regime Jurídico, é isso o que está expresso, não apenas com relação ao prazo de julgamento mas também ao do término do inquérito (Lei 8.112/90, artigos 169, § 1º, e 147, parágrafo único; Lei nº 1.711/52, artigos 225, § 1º, e 215, § 1º). O paralelo evidente é com o Processo Penal: a superação dos prazos de desenvolvimento do processo gera seus efeitos unicamente com relação às medidas cautelares, com maior freqüência, no processo criminal, sobre a prisão preventiva, e nada mais" (in Revista Trimestral de Jurisprudência 142/815).

Sendo assim, não há como ser acolhido o pleito de extinção do processo administrativo, ressalvando, entretanto, a desconstituição de qualquer medida de natureza cautelar que tenha sido imposta ao autor, durante o curso do processo administrativo, a exemplo de eventual afastamento cautelar de servidor.

                                      Ante o exposto, INDEFIRO A LIMINAR pleiteada pelo autor, por ausência de fumus boni iuris.
Cite-se o MUNICÍPIO DE JOÃO LISBOA para, querendo, oferecerem resposta no prazo legal.
Intimem-se as partes da presente decisão.
Ciência ao Ministério Público.

João Lisboa/MA, 20 de fevereiro de 2015.



Juiz Glender Malheiros Guimarães
Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa


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