Processo nº 1440-73.2014.8.10.0038
Autor: ADENYLSON VALARIANO QUARESMA
Réus: CONSÓRCIO NACIONAL HONDA LTDA e MOTOCA
MOTORES TOCANTINS LTDA
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS.
SENTENÇA
RELATÓRIO
Dispensado
o relatório na forma do art. 38 da Lei nº 9099/95.
DA FUNDAMENTAÇÃO E DECISÃO.
Preliminares:
CARÊNCIA DE AÇÃO
Em
sua resposta, a primeira requerida suscita preliminar de carência de ação uma
vez que o reclamante não teria juntado cumprido sua obrigação contratual
prevista na cláusula 12.1 e parágrafos primeiro e segundo correspondente à
comprovação de renda.
Sem
razão.
Com
efeito, observo que dos autos consta a declaração de renda assinada por
contador com firma reconhecida e identificação do respectivo número de
inscrição junto ao Conselho Regional de Contabilidade às fls. 74. Portanto,
diante da resistência da reclamada em disponibilizar o crédito ao reclamante,
resta evidenciada a pretensão resistida e a necessidade da presente demanda.
Afasto
a preliminar.
ILEGITIMIDADE PASSIVA DA
MOTOCA
Em
sua resposta, a segunda reclamada suscita sua ilegitimidade passiva uma vez que
o contrato foi assinado e criou obrigações entre o consorciado e a primeira
reclamada.
Com
razão a segunda requerida.
De
fato , a relação obrigacional foi formada entre o reclamante e o primeiro
reclamado, figurando a segunda reclamada como mera estipulante em favor de
terceiro.
Destaque-se
que a MOTOCA LTDA funcionou durante a fase das tratativas e a própria execução
do contrato de consorcio como estipulante do negócio jurídico e, portanto, com
aptidão e legitimidade para receber os documentos necessários e encaminhá-los
para a Administradora do Consórcio, porém, a obrigação de entrega do crédito
cabe à primeira reclamada tão-somente, a menos que fosse imputada à segunda
reclamada alguma omissão quanto ao seu dever de estipulante.
Sendo
assim, reconheço a ilegitimidade passiva da segunda reclamada, motivo pelo qual
extingo o processo sem resolução do mérito tão-somente quanto à segunda
reclamada, por ilegitimidade passiva, nos termos do art. 267, VI do CPC.
MÉRITO:
Narra o
autor que aderiu a um plano de consórcio oferecido pela ré, havendo efetuado o
pagamento de uma parcela, quando, então, foi sorteado em assembléia. Sustenta
que iniciou o procedimento para recebimento do crédito, apresentando a
documentação exigida conforme documentos de fls. 19. Aduz que quando foi
retirar o crédito foi surpreendido por exigência de avalista para a liberação
do crédito. Postulou a obrigação de entrega do veículo, bem como indenização
por danos morais.
No que
concerne a contratos de consórcio, vê-se que, em tese, não há ilicitude na
conduta das empresas administradoras ao exigir garantia para a liberação do
crédito. A retenção do crédito, mesmo após a contemplação do consorciado, constitui
ato de cautela permitido a tais instituições para a manutenção da saúde
financeira do grupo consortil, visando benefício maior à coletividade. Tal exigência,
inclusive, possui previsão legal no art. 14, §4º da Lei nº 11795/2008:
“Art. 14. No contrato de participação em grupo de consórcio, por adesão,
devem estar previstas, de forma clara, as garantias que serão exigidas do
consorciado para utilizar o crédito. (...)
§ 4o A administradora pode
exigir garantias complementares proporcionais ao valor das prestações
vincendas.”
No
entanto, no caso trazido aos autos, a exigência de fiador da forma que fora
feita pela demandada não consta do contrato firmado entre as partes (folhas 16/17).
É que
analisando o REGULAMENTO DE GRUPO DE CONSÓRCIO DESTINADO A AQUISIÇÃO DE
PRODUTOS HONDA (fls. 52-58), o parágrafo único do item 12.5, condiciona a
exigência da apresentação de um interveniente garantidor solidário ao não
cumprimento das condições exigidas no item 12.1:
“Cláusula 12.5 (...)
Parágrafo único: Caso não atendidas algumas das condições acima, como
complemento às exigências da alínea “c” e “d” do item 12.1, a Administradora
poderá exigir que o consorciado apresente interveniente garantidor solidário
que atenda aos mesmos requisitos especificados para o consorciado, podendo,
ainda a Administradora, a seu critério exclusivo, exigir qualquer outra
garantia complementar permitida em lei, proporcional ao valor do saldo devedor
da cota contemplada.”
Por sua
vez, a alínea “c” da clausula 12.1, refere-se à negativação do nome do autor, o
que não restou demonstrado nos autos.
A alínea
“d”, de outra banda, lista os documentos que o contemplado deve apresentar
dentre os quais o comprovante de renda, porém, o parágrafo segundo do mesmo
item, admite que a comprovação de renda possa ser feita através de declaração
de profissional de contabilidade:
“Cláusula 12.1 (...)
Paragrafo segundo: Para a aquisição do bem e liberação do crédito de contemplação,
deverá o consorciado contemplado também comprovar receber renda mensal de, no
mínimo, 3 (três) vezes o valor da prestação ou da soma das prestações de toda
as quotas não quitadas que o consorciado detiver junto à Administradora,
através de:
(...)
II – no caso de comerciante ou autônomo, declaração de rendimento
assinada pelo contador com firma reconhecida e identificação do respectivo CRC
(DECORE).”
Portanto,
tendo o reclamante apresentado a referida documentação durante o procedimento
de pós-contemplação, indicando que possui uma renda mensal média de R$ 1500,00,
portanto, superior à exigência contratual de 3(três) vezes o valor da última
parcela, conforme verifico às fls. 74, não poderia a reclamada fazer exigências
complementares sem o atendimento da condição suspensiva prevista na cláusula
12.5, paragrafo único.
Destaco,
ainda, que o reclamante sequer foi informado da exigência de semelhante
garantia quando da contratação, o que poderia ser fator determinante para a não
realização do negócio, conforme infiro do próprio depoimento pessoal do
reclamante às fls. 134-135.
Dessa
forma tenho que a requerida faltou com dever de boa-fé, qual seja, necessidade
de prestar adequada informação à contraparte na relação comercial, no sentido
de colaborar com o correto cumprimento do contrato. A boa fé objetiva também
foi violada em sua vertente denominada pela doutrina de venire contra factum proprium, na medida em que a Administradora
adota um comportamento contraditório, pois permitiu a inclusão do reclamante no
grupo consorcial, vem recebendo o pagamento das prestações em dia, mas uma vez
verificada a contemplação por sorteio do mesmo, faz exigências abusivas para
cumprir com a sua contraprestação contratual.
No
entanto, embora a requerida tenha deixado de informar o autor sobre a exigência
de avalista para retirar o crédito, fazendo injusta retenção da carta, neste
caso, essa situação não caracteriza dano moral por si só.
Em
verdade, a situação dos autos caracteriza-se como mero inadimplemento
contratual, não restaram comprovadas circunstâncias que tenha afetado de modo
grave a esfera psíquica do autor, nem que pudessem ter violado os direitos da
personalidade. Deste modo, inexistem danos morais indenizáveis.
É de ser salientado que os transtornos
causados pelo inadimplemento estão dentro de uma linha de riscos de uma vida em
sociedade, não decorrendo nenhuma dor moral, pelo menos que seja passível de
indenização pecuniária.
Portanto,
não tendo sido comprovada a existência de dano moral indenizável indefiro a
condenação ao pagamento de indenização por danos morais.
DISPOSITIVO:
ANTE O
EXPOSTO, julgo parcialmente procedente a presente demanda para condenar o CONSÓRCIO
NACIONAL HONDA LTDA, a entregar ao
reclamante um veículo CG 150 FAN ESDI, novo, zero quilômetro, nas condições constantes
do contrato de fls. 16-17 e regulamento de fls. 52-57-v ou a respectiva carta
de crédito correspondente valor de mercado do referido bem, no prazo
máximo de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 1000,00 (mil reais),
nos termos do art. 461, §5º do CPC.
Sem
custas e sem honorários.(at. 54 e 55 da Lei nº 9099/95).
P.
R. I.
João
Lisboa/MA, 25 de novembro de 2014.
Juiz Glender
Malheiros Guimarães
Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirBom dia !
ResponderExcluirPrimeiramente quero de tecer elogio acerca do blog. Num segundo momento, a respeito da postagem acima, gostaria de dizer que, muito embora parcialmente discorde, achei interessante o entendimento de Vossa Excelência de que "os transtornos pelo inadimplememto estão dentro de uma linha de riscos de uma vida em sociedade".
De fato, no caso concreto vigora essa linha, pois o consorciado foi contemplado já no início do plano, o que a princípio eleva a necessidade da administradora munir-se de toda garantia,desde que possível, conforme previsão contratual.
Teria, assim por se dizer, minimizado o risco de não receber.
Diferente é o risco que assume quando não cumpre com o que especifica em suas cláusulas, surgindo assim a devida responsabilidade.
Ocorre que, de uma simples leitura do contrato conclui-se que a exigência da administradora era desconforme, o que leva a entender que a indenização seria cabível.
Acho um absurdo o requerimento de devedor solidário quando já presente o instituto da alienação fiduciária, que por si só já é uma garantia.
Pior, em algumas situações requerem nota promissória em conjunto,
Nesse passo, tenho por mim que a contemplação (que devia ser um momento de alegria) passa a ser de amargura, mesmo que momentânea.
Por fim, ressalto que não vejo o dano moral como algo que mereça ser facilmente afastado, em específico na situação acima onde se deu o mover do aparato estatal como necessário a solução da controvérsia.
Aproveitando a deixa, lanço mão do entendimento de que situação outra ocorre quando o consorciado possui um histórico de pagamento avançado, onde boa parte do saldo devedor, para não se dizer do valor do crédito (pois o saldo devedor engloba a taxa de administração e seguro), já encontra-se quitado.
Neste último caso, não vejo necessidade sequer da comprovação da renda, pois o consorciado, conforme se vê, já comprovou ter capacidade financeira para tanto, de modo que ao aderir ao grupo firmou termo de que teria condições de pagar as parcelas contratuais, e de fato o vem fazendo.
Por fim, lanço mão em meu comentário da seguinte frase, a qual utilizo sempre que conveniente as peças que redijo:
"Em uma sociedade capitalista, separar a moral e a ética do dinheiro, seria o mesmo que separar o ar dos que respiram. E se o ar é essencial à vida; também a moral e a ética, bem como a moeda, são a pressupostos para uma sociedade economicamente equilibrada, o que leva a conclusão de aausência de um deles diante de qualquer ente, significa submetê-lo a prejuízos de ordem financeira"
Abraço.
OBRIGADO PELA CONTRIBUIÇÃO!
Excluir