sexta-feira, 14 de setembro de 2012

SENTENÇA. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DEFERIMENTO.


Autos nº. 305/2012 – Ação de Reintegração de Posse

Requerente: MARIA MESSIAS FERREIRA DA SILVA
Requerido: CLÉSIO CARREIRO

Vistos etc,
MARIA MESSIAS FERREIRA DA SILVA, qualificado a fls. 02, ajuizou a presente ação de Reintegração de Posse em desfavor de CLÉSIO CARREIRO, alegando, em síntese, que é legítima possuidora do imóvel descrito às fls. 02, adquirido mediante instrumento particular de compra e venda, datado de 28.03.2010 porém, teve sua posse esbulhada por ato praticado pelo suplicado que no dia 02.04.2012 passou a roçar, cercar e queimar a área em que pese os protestos da autora. Requereu a concessão de liminar.
Instruiu o pedido com cópia dos seus documentos pessoais, cópia do boletim de ocorrência policial, da planta planimétrica da área, da declaração e recibos de compra e venda, cópia do registro do imóvel em nome de MARIA ESTELINA FERREIRA, bem como prova fotográfica do esbulho narrado.(fls. 09/18)    
Às fls. 20, este juízo indeferiu o pedido de Justiça Gratuita, e determinou o recolhimento das custas o que foi cumprido às fls. 22.
Às fls. 25-28, a liminar foi deferida tendo sido devidamente cumprida conforma auto de fls. 31.
O réu foi citado às fls. 30, tendo apresentado contestação às fls. 34-37, oportunidade em que arguiu em preliminar a ilegitimidade ativa da autora uma vez que a mesma não teria comprovado a sua posse pois esta teria adquirido o terreno de quem não possuía o domínio do mesmo uma vez que o contrato de compra e venda foi feito com ALDIMAR DE LIMA e não com a proprietária MARIA ESTELINA FERREIRA de forma que as contratantes praticaram negócio ilícito, violando direito de herdeiros; no mérito, afirma que a autora não externou atos de posse relativos ao referido imóvel não tendo cuidado e nem zelado pelo imóvel, sendo que este encontrava-se em estado de abandono, sujo e sem cerca; que a autora não deu função social ao imóvel e que o requerido adquiriu o imóvel através de sua compra nas mesmas condições que a autora. Finaliza requerendo o acolhimento da preliminar e a improcedência da ação. Juntou documentos de fls. 39-43.
Às fls. 46, foi designada audiência preliminar a qual restou infrutífera, motivo pelo qual seguiu-se para a instrução a qual realizou-se às fls. 52-55, oportunidade me que foram ouvidas duas testemunhas da parte autora e um testemunha do réu.
A parte autora apresentou alegações finais às fls. 59-62, oportunidade em que reafirmou a presença dos requisitos do art. 927 do CPC e requereu a procedência da ação.
O réu, por sua vez, em sede de alegações finais afirma que a autora não tem legitimidade para pleitear a possessória uma vez que adquiriu o imóvel de que não era seu dono; que não há prova de filiação da ALDIMAR DE LIMA e por isso a mesma não poderia ter vendido o terreno; que a venda é ilícita e portanto nula; que ambos os negócios praticados pelas partes são nulos; que assim, o imóvel restará por inteiro para MARIA DAS GRAÇAS DE LIMA, motivo pelo qual requereu a improcedência da ação.

Vieram os autos conclusos.
É o relatório. Decido.

DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA
Sustenta o réu, em preliminar, a ilegitimidade ativa da autora uma vez que não teria demonstrado a sua posse e que o negócio jurídico representado pelo documento de fls. 12-13 é ilícito uma vez que celebrado com pessoa diversa da proprietária do imóvel.
Sem razão.
Com efeito, observo que o réu confunde posse com domínio. É evidente que a declaração de compra e venda de fls. 12 não se presta para o fim de transmitir a propriedade do imóvel questionado uma vez que a alienação da propriedade de bens imóvel somente pode dar-se com a transcrição da escritura de compra e venda do mesmo no cartório de registro de imóveis.
Porém, não se pode olvidar que na ação de reintegração de posse não se discute propriedade, mas sim e tão somente a posse. Desta forma, é evidente que o documento supra cumpre com louvor a sua função de transmitir a posse pacifica e de boa fé do referido imóvel, colocando a autora, desde o ano de 2010, numa situação potestativa de ingerência sócio-econômica sobre o bem da vida em litígio, fato que foi plenamente desde a concessão da liminar.
Afasto a preliminar.

MÉRITO

A reintegração de posse é o remédio processual adequado à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado de seu poder físico sobre a coisa. Não é suficiente o incômodo; essencial é que a agressão provoque a perda da possibilidade de controle e atuação material no bem antes possuído, uma vez que nos termos do art. 926 do CPC: “o possuidor  tem o direito de ser mantido na posse em caso de turbação e  reintegrado no caso de esbulho.”

A ordem jurídica acautela o possuidor como forma de preservação de seu elementar direito ao desenvolvimento dos atributos de sua personalidade, pois o uso e fruição de bens tem em vista a satisfação das necessidades essenciais e acesso aos bens mínimos pela pessoa ou pela entidade familiar. Qualquer demanda possessória deve girar em torno de uma agressão material a uma relação possessória preexistente, sem qualquer vinculação com relações jurídicas que confiram eventual titularidade. Não por outro motivo não se admite a discussão de domínio em sede de ações possessórias.

O direito do possuidor de defender a sua posse contra terceiros é uma consequência jurídico produzida pela necessidade geral de respeito a uma situação fática consolidada.

O esbulho se caracteriza em situações em que a posse é subtraída por qualquer dos vícios objetivos, enumerados no art. 1200 do Código Civil, quais sejam: a violência, precariedade e clandestinidade.

Dispõe o art. 1210 do CC:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

Assim, entendo que os requerentes provaram os fatos constitutivos do seu direito, tendo se desincumbido de seu ônus probandi nos termos do art. 333, I do CPC:

Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, que, nessa condição, pode intentar ação possessória (CC, art. 1.196).
Arnaldo Rizzardo, ao conceituar a ação de reintegração de posse, anota que reintegrar equivale a integrar novamente, o que envolve o restabelecimento de alguém na posse de um bem do qual foi injustamente afastado ou retirado. (Direito das Coisas, Forense, 1ª ed., p. 95)
Com relação aos pressupostos para a procedência do pedido na ação de reintegração de posse, enfatiza o mesmo autor:
“Três pressupostos sobressaem: a)deverá o possuidor esbulhado ter exercido uma posse anterior; b)a ocorrência do esbulho da posse que alguém provoca; c) a perda da posse em razão do esbulho.
“Pratica esbulho quem priva outrem da posse, de modo violento ou clandestino, ou com abuso de confiança.” (Direito das Coisas, Forense, 1ª ed., p. 105).
Na ação de reintegração de posse, incumbe ao autor provar a sua posse, a turbação ou o esbulho praticado pelo réu, a data da turbação ou do esbulho e a continuação da posse, embora turbada (CPC, art. 927).
As ações possessórias objetivam, unicamente, a proteção possessória e, para que a autora obtenha êxito no seu intento, precisa comprovar sua posse, o esbulho praticado pelo réu, a data do esbulho e a perda da posse.
Na hipótese dos autos, o autor logrou comprovar a sua posse, através de terceiros, e o esbulho sobre o bem em questão.
Com efeito, denoto da prova produzida documentalmente e em especial durante a audiência de instrução que a posse da autora relativamente ao referido imóvel era atual ao tempo do esbulho:

“(...) que é vizinha do terreno e viúva do irmão da Maria Esterlina, hoje falecida, em cujo nome se encontra o imóvel; que a referida área pertencia ao esposo da depoente que o adquiriu em 1983; que em 1984, o esposo da depoente doou o terreno para sua irmã Maria Esterlina; Que Maria Esternila passou a residir no local em companhia de seu esposo; (...) que na casa situada no terreno moravam Esterlina, o marido e a filha Aldimar; (...) Que Esterlina e sua filha Aldimar resolveram vender o terreno, pois Esterlina estava doente, precisava de remédio e tinha amputado uma perna; que no ano de 2010 o referido terreno foi vendido para o casal Magno e Maria Messias; que o casal Magno e Maria Messias fez algumas benfeitorias como a construção de uma casa para o poço; que no terreno também existia algumas árvores frutíferas como mangueira, pitomba, jaca, acerola etc.; que era comum magno e sua esposa visitarem o terreno para de lá tirar frutos(...) que no terreno havia uma cerca antiga com arame antigo também; que todos os vizinhos do Povoado Avarandado sabiam que o referido terreno havia sido vendido para Magno e sua esposa; que há apenas alguns meses observou Clésio Carreiro adentrando no terreno; que há poucos meses observou pessoas roçando o referido terreno, tendo Maria Messias parado na casa da depoente para perguntar quem tinha mandado roçar(...) que a vontade de vender foi externada para a depoente por Maria Esterlina e Aldimar” (DEPOIMENTO DE FRANCISCA ARAÚJO, fls. 53)
“(...) que a mãe da depoente faleceu em 12.06.2010, motivo pelo qual venderam a área remanescente também para o casal Magno e Maria Messias; que não sabe dizer ao certo porque não foi a própria Maria Esterlina quem assinou o documento de venda do imóvel, mas acredita que se deu porque a mesma se encontrava doente e com a perna amputada; que afirma que assinou o documento de fls. 12 porque foi a própria Maria Estelina que pediu para a depoente assinar; Que após vender o imóvel para Maria Messias a mesma construiu uma casa para o poço coberta com telha brasilit; que o terreno era cercado com uma cerca antiga de arame farpado; que no terreno há várias árvores frutíferas e que o casal Magno e Maria Messias costumam ir ao local colher frutos; que todos os vizinhos tem ciência de que o terreno havia sido adquirido pelo casal Magno e Maria Messias; Que o senhor Clésio há menos de um ano mandou roçar o terreno, cortou várias arvores e colocou uma cerca retirando uma antiga; Que antes disso Clésio procurou a depoente dizendo que queria comprar o terreno; que a depoente disse que já havia vendido o terreno para o casal Magno e Maria Messias; que Clésio sugeriu que  a depoente desfizesse o negócio devolvendo o dinheiro para Magno mas a depoente recusou; Que dias depois Maria das Graças que era sobrinha do pai da depoente apareceu na casa da depoente dizendo ser herdeira do terreno, apresentando sua certidão de nascimento onde constava o nome do pai e da mãe da depoente” (DEPOIMENTO DE ALDIMAR DE LIMA, fls. 54)
Por outro lado a testemunha trazida pela parte requerida apenas fez prova de seu direito hereditário na condição de herdeira da falecida MARIA ESTERLINA. Porém, pelo seu depoimento restou evidenciado que a mesma jamais teve a posso o imóvel, motivo pelo qual não poderia o réu adquirir posse da referida herdeira que jamais exteriorizou atos de posse relativos ao referido imóvel.
É importante frisar que a presente decisão limita-se a reconhecer eventual direito possessório da autora o que não impede a abertura de inventário já que o domínio do bem continua em nome da de cujus.
Assim, entendo que a autora faz jus à proteção possessória pretendida, uma vez que os fatos narrados foram corroborados com o conjunto probatório inserido nos autos dão conta de que houve indevido desapossamento do bem objeto da presente lide por atos clandestinos do requerido.
Vale lembrar que em ação de reintegração de posse não cabe a discussão sobre a titularidade do bem, pois o seu legítimo proprietário poderá retomá-lo, a qualquer tempo e na via processual adequada, daquele que eventualmente venha a possuí-lo indevidamente.
Compulsando os autos verifico que a autora foi legitimamente investida na posse por transmissão da mesma da Sra. ALDIMAR DE LIMA, filha da legítima proprietária (fls. 14-15), através de instrumento particular de compra e venda de fls. 12 que em que pese ser inservível para transmitir a propriedade vale como relevante prova da posse justa do imóvel por parte da autora.

DISPOSITIVO
ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTE o pedido de reintegração de posse, confirmando a liminar anteriormente concedida, devendo o bem ser restituído definitivamente à requerente MARIA MESSIAS FERREIRA DA SILVA.
Considerando o caráter dúplice das ações possessórias, expeça-se mandado de reintegração definitiva de posse do bem objeto da presente lide em favor dos demandantes.
Condeno o réu CLESIO CARREIRO no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que, com amparo no art. 20, § 4º, do CPC, fixo em R$ 622,00 (seiscentos e vinte e dois reais), porém, dispenso o pagamento tendo em vista que o mesmo é beneficiário da Justiça Gratuita deferida neste momento.
P.R.I
Amarante do Maranhão /MA, 10 de setembro de 2012.


Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão


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