Autos nº. 305/2012 – Ação de
Reintegração de Posse
Requerente:
MARIA MESSIAS FERREIRA DA SILVA
Requerido: CLÉSIO CARREIRO
Vistos etc,
MARIA
MESSIAS FERREIRA DA SILVA, qualificado a fls. 02, ajuizou a presente ação de
Reintegração de Posse em desfavor de CLÉSIO CARREIRO, alegando, em síntese, que
é legítima possuidora do imóvel descrito às fls. 02, adquirido mediante instrumento
particular de compra e venda, datado de 28.03.2010 porém, teve sua posse
esbulhada por ato praticado pelo suplicado que no dia 02.04.2012 passou a
roçar, cercar e queimar a área em que pese os protestos da autora. Requereu a
concessão de liminar.
Instruiu
o pedido com cópia dos seus documentos pessoais, cópia do boletim de ocorrência
policial, da planta planimétrica da área, da declaração e recibos de compra e
venda, cópia do registro do imóvel em nome de MARIA ESTELINA FERREIRA, bem como
prova fotográfica do esbulho narrado.(fls. 09/18)
Às
fls. 20, este juízo indeferiu o pedido de Justiça Gratuita, e determinou o
recolhimento das custas o que foi cumprido às fls. 22.
Às
fls. 25-28, a liminar foi deferida tendo sido devidamente cumprida conforma
auto de fls. 31.
O
réu foi citado às fls. 30, tendo apresentado contestação às fls. 34-37,
oportunidade em que arguiu em preliminar a ilegitimidade ativa da autora uma
vez que a mesma não teria comprovado a sua posse pois esta teria adquirido o
terreno de quem não possuía o domínio do mesmo uma vez que o contrato de compra
e venda foi feito com ALDIMAR DE LIMA e não com a proprietária MARIA ESTELINA
FERREIRA de forma que as contratantes praticaram negócio ilícito, violando
direito de herdeiros; no mérito, afirma que a autora não externou atos de posse
relativos ao referido imóvel não tendo cuidado e nem zelado pelo imóvel, sendo
que este encontrava-se em estado de abandono, sujo e sem cerca; que a autora
não deu função social ao imóvel e que o requerido adquiriu o imóvel através de
sua compra nas mesmas condições que a autora. Finaliza requerendo o acolhimento
da preliminar e a improcedência da ação. Juntou documentos de fls. 39-43.
Às
fls. 46, foi designada audiência preliminar a qual restou infrutífera, motivo
pelo qual seguiu-se para a instrução a qual realizou-se às fls. 52-55,
oportunidade me que foram ouvidas duas testemunhas da parte autora e um
testemunha do réu.
A
parte autora apresentou alegações finais às fls. 59-62, oportunidade em que
reafirmou a presença dos requisitos do art. 927 do CPC e requereu a procedência
da ação.
O
réu, por sua vez, em sede de alegações finais afirma que a autora não tem
legitimidade para pleitear a possessória uma vez que adquiriu o imóvel de que
não era seu dono; que não há prova de filiação da ALDIMAR DE LIMA e por isso a
mesma não poderia ter vendido o terreno; que a venda é ilícita e portanto nula;
que ambos os negócios praticados pelas partes são nulos; que assim, o imóvel
restará por inteiro para MARIA DAS GRAÇAS DE LIMA, motivo pelo qual requereu a
improcedência da ação.
Vieram
os autos conclusos.
É o
relatório. Decido.
DA
PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA
Sustenta o réu, em preliminar, a ilegitimidade ativa da
autora uma vez que não teria demonstrado a sua posse e que o negócio jurídico
representado pelo documento de fls. 12-13 é ilícito uma vez que celebrado com
pessoa diversa da proprietária do imóvel.
Sem razão.
Com efeito, observo que o réu confunde posse com domínio.
É evidente que a declaração de compra e venda de fls. 12 não se presta para o
fim de transmitir a propriedade do imóvel questionado uma vez que a alienação
da propriedade de bens imóvel somente pode dar-se com a transcrição da
escritura de compra e venda do mesmo no cartório de registro de imóveis.
Porém, não se pode olvidar que na ação de reintegração de
posse não se discute propriedade, mas sim e tão somente a posse. Desta forma, é
evidente que o documento supra cumpre com louvor a sua função de transmitir a
posse pacifica e de boa fé do referido imóvel, colocando a autora, desde o ano
de 2010, numa situação potestativa de ingerência sócio-econômica sobre o bem da
vida em litígio, fato que foi plenamente desde a concessão da liminar.
Afasto a preliminar.
MÉRITO
A reintegração
de posse é o remédio processual adequado à restituição da posse àquele que a
tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado de seu poder físico sobre a
coisa. Não é suficiente o incômodo; essencial é que a agressão provoque a perda
da possibilidade de controle e atuação material no bem antes possuído, uma vez
que nos termos do art. 926 do CPC: “o possuidor
tem o direito de ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no caso de esbulho.”
A ordem jurídica
acautela o possuidor como forma de preservação de seu elementar direito ao
desenvolvimento dos atributos de sua personalidade, pois o uso e fruição de
bens tem em vista a satisfação das necessidades essenciais e acesso aos bens
mínimos pela pessoa ou pela entidade familiar. Qualquer demanda possessória
deve girar em torno de uma agressão material a uma relação possessória
preexistente, sem qualquer vinculação com relações jurídicas que confiram eventual
titularidade. Não por outro motivo não se admite a discussão de domínio em sede
de ações possessórias.
O direito do
possuidor de defender a sua posse contra terceiros é uma consequência jurídico
produzida pela necessidade geral de respeito a uma situação fática consolidada.
O esbulho se
caracteriza em situações em que a posse é subtraída por qualquer dos vícios
objetivos, enumerados no art. 1200 do Código Civil, quais sejam: a violência,
precariedade e clandestinidade.
Dispõe o art. 1210 do CC:
Art. 1.210. O possuidor tem direito a
ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado
de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
Assim, entendo que os requerentes provaram os
fatos constitutivos do seu direito, tendo se desincumbido de seu ônus probandi
nos termos do art. 333, I do CPC:
Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao
réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do
direito do autor.
Considera-se possuidor todo aquele que tem de
fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, que,
nessa condição, pode intentar ação possessória (CC, art. 1.196).
Arnaldo Rizzardo, ao conceituar a ação de reintegração
de posse, anota que reintegrar equivale a integrar novamente, o que envolve o
restabelecimento de alguém na posse de um bem do qual foi injustamente afastado
ou retirado. (Direito das Coisas, Forense, 1ª ed., p. 95)
Com relação aos pressupostos para a
procedência do pedido na ação de reintegração de posse, enfatiza o mesmo autor:
“Três pressupostos sobressaem: a)deverá o
possuidor esbulhado ter exercido uma posse anterior; b)a ocorrência do esbulho
da posse que alguém provoca; c) a perda da posse em razão do esbulho.
“Pratica esbulho quem priva outrem da posse,
de modo violento ou clandestino, ou com abuso de confiança.” (Direito das
Coisas, Forense, 1ª ed., p. 105).
Na ação de reintegração de posse, incumbe ao
autor provar a sua posse, a turbação ou o esbulho praticado pelo réu, a data da
turbação ou do esbulho e a continuação da posse, embora turbada (CPC, art.
927).
As ações possessórias objetivam, unicamente,
a proteção possessória e, para que a autora obtenha êxito no seu intento,
precisa comprovar sua posse, o esbulho praticado pelo réu, a data do esbulho e
a perda da posse.
Na hipótese dos autos, o autor logrou
comprovar a sua posse, através de terceiros, e o esbulho sobre o bem em
questão.
Com efeito, denoto da prova produzida
documentalmente e em especial durante a audiência de instrução que a posse da
autora relativamente ao referido imóvel era atual ao tempo do esbulho:
“(...) que é vizinha do terreno e viúva
do irmão da Maria Esterlina, hoje falecida, em cujo nome se encontra o imóvel;
que a referida área pertencia ao esposo da depoente que o adquiriu em 1983; que
em 1984, o esposo da depoente doou o terreno para sua irmã Maria Esterlina; Que
Maria Esternila passou a residir no local em companhia de seu esposo; (...) que
na casa situada no terreno moravam Esterlina, o marido e a filha Aldimar; (...)
Que Esterlina e sua filha Aldimar resolveram vender o terreno, pois Esterlina
estava doente, precisava de remédio e tinha amputado uma perna; que no ano de
2010 o referido terreno foi vendido para o casal Magno e Maria Messias; que o
casal Magno e Maria Messias fez algumas benfeitorias como a construção de uma
casa para o poço; que no terreno também existia algumas árvores frutíferas como
mangueira, pitomba, jaca, acerola etc.; que era comum magno e sua esposa
visitarem o terreno para de lá tirar frutos(...) que no terreno havia uma cerca
antiga com arame antigo também; que todos os vizinhos do Povoado Avarandado
sabiam que o referido terreno havia sido vendido para Magno e sua esposa; que
há apenas alguns meses observou Clésio Carreiro adentrando no terreno; que há
poucos meses observou pessoas roçando o referido terreno, tendo Maria Messias
parado na casa da depoente para perguntar quem tinha mandado roçar(...) que a
vontade de vender foi externada para a depoente por Maria Esterlina e Aldimar” (DEPOIMENTO DE FRANCISCA ARAÚJO, fls. 53)
“(...)
que
a mãe da depoente faleceu em 12.06.2010, motivo pelo qual venderam a área
remanescente também para o casal Magno e Maria Messias; que não sabe dizer ao
certo porque não foi a própria Maria Esterlina quem assinou o documento de
venda do imóvel, mas acredita que se deu porque a mesma se encontrava doente e
com a perna amputada; que afirma que assinou o documento de fls. 12 porque foi
a própria Maria Estelina que pediu para a depoente assinar; Que após vender o
imóvel para Maria Messias a mesma construiu uma casa para o poço coberta com
telha brasilit; que o terreno era cercado com uma cerca antiga de arame
farpado; que no terreno há várias árvores frutíferas e que o casal Magno e
Maria Messias costumam ir ao local colher frutos; que todos os vizinhos tem
ciência de que o terreno havia sido adquirido pelo casal Magno e Maria Messias;
Que o senhor Clésio há menos de um ano mandou roçar o terreno, cortou várias
arvores e colocou uma cerca retirando uma antiga; Que antes disso Clésio
procurou a depoente dizendo que queria comprar o terreno; que a depoente disse
que já havia vendido o terreno para o casal Magno e Maria Messias; que Clésio
sugeriu que a depoente desfizesse o
negócio devolvendo o dinheiro para Magno mas a depoente recusou; Que dias
depois Maria das Graças que era sobrinha do pai da depoente apareceu na casa da
depoente dizendo ser herdeira do terreno, apresentando sua certidão de
nascimento onde constava o nome do pai e da mãe da depoente” (DEPOIMENTO DE ALDIMAR DE LIMA, fls. 54)
Por outro lado a testemunha trazida pela
parte requerida apenas fez prova de seu direito hereditário na condição de
herdeira da falecida MARIA ESTERLINA. Porém, pelo seu depoimento restou
evidenciado que a mesma jamais teve a posso o imóvel, motivo pelo qual não
poderia o réu adquirir posse da referida herdeira que jamais exteriorizou atos
de posse relativos ao referido imóvel.
É importante frisar que a presente decisão
limita-se a reconhecer eventual direito possessório da autora o que não impede
a abertura de inventário já que o domínio do bem continua em nome da de cujus.
Assim, entendo que a autora faz jus à
proteção possessória pretendida, uma vez que os fatos narrados foram
corroborados com o conjunto probatório inserido nos autos dão conta de que houve indevido desapossamento do bem
objeto da presente lide por atos clandestinos do requerido.
Vale lembrar que em ação
de reintegração de posse não cabe a discussão sobre a titularidade do bem, pois
o seu legítimo proprietário poderá retomá-lo, a qualquer tempo e na via
processual adequada, daquele que eventualmente venha a possuí-lo indevidamente.
Compulsando os autos verifico que a autora foi legitimamente investida na
posse por transmissão da mesma da Sra. ALDIMAR DE LIMA, filha da legítima
proprietária (fls. 14-15), através de instrumento particular de compra e venda
de fls. 12 que em que pese ser inservível para transmitir a propriedade vale
como relevante prova da posse justa do imóvel por parte da autora.
DISPOSITIVO
ANTE O EXPOSTO, julgo
PROCEDENTE o pedido de reintegração de posse, confirmando a liminar
anteriormente concedida, devendo o bem ser restituído definitivamente à
requerente MARIA MESSIAS FERREIRA DA SILVA.
Considerando o caráter
dúplice das ações possessórias, expeça-se mandado de reintegração definitiva de
posse do bem objeto da presente lide em favor dos demandantes.
Condeno
o réu CLESIO CARREIRO no pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios, que, com amparo no art. 20, § 4º, do CPC, fixo em R$ 622,00 (seiscentos
e vinte e dois reais), porém, dispenso o pagamento tendo em vista que o mesmo é
beneficiário da Justiça Gratuita deferida neste momento.
P.R.I
Amarante
do Maranhão /MA, 10 de setembro de 2012.
Juiz Glender Malheiros Guimarães
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