Processo nº 536-87.2013.8.10.0038
Autor: ANTONINO DO CARMO DE SOUSA
Réu: FRANCAL COM DE CALÇADOS E CONFECÇÕES
LTDA
AÇÃO DE REPARAÇÃO POR
DANOS MORAIS.
SENTENÇA
RELATÓRIO
O autor ingressou
com a presente ação em face do réu, alegando em síntese que teve seu nome
indevidamente incluído em cadastro de restrições do BACEN por ato ilícito do
requerido que consistiu em apresentação antecipada de cheque pós-datado para o
dia 28.03.2012 no dia 02.02.2012, resultando em negativação do nome do autor em
Cadastro de Emitentes de Cheque sem Fundos - CCF, diante da inexistência de
provisão suficiente no dia da apresentação.
Liminar indeferida (fls.
24-25).
Após duas redesignações, foi realizada audiência
tendo o réu sido citado, não houve conciliação tendo apresentado contestação,
oportunidade em que sustentou preliminar de ilegitimidade passiva e requereu o
chamamento ao processo do Banco do Brasil, no mérito infirmou os fatos
articulados na inicial.
As partes declararam não
possuir outras provas a produzir em audiência.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. DECIDO.
DA FUNDAMENTAÇÃO E DECISÃO.
PRELIMINARES
Ilegitimidade Passiva do
Requerido
Em
sua resposta o réu suscita a carência de ação da autora diante de sua
ilegitimidade passiva já que eventual dano suportado pelo autor deve ser
imputado à falha na prestação do serviço de custódia do Banco do Brasil.
Sem
razão.
Com
efeito, verifico que a relação jurídica subjacente ao título de crédito foi
estabelecida entre o autor e o réu, tendo havido violação por parte deste
último quanto ao dia contratado para a apresentação do cheque, independente do
meio escolhido por este último para o recebimento do seu crédito.
Quanto ao pedido Nomeação à
autoria do Banco do Brasil
Em
sua resposta, o réu requer a nomeação à autoria do Banco do Brasil.
Sem
razão.
Com
efeito, estando caracterizada uma relação de consumo, há previsão expressão
expressa no art. 88 do CDC acerca da proibição de intervenção de terceiros nas
demandas relacionadas à relação de consumo, motivo pelo qual indefiro o pleito.
MÉRITO:
Diante
da hipossuficiência técnica do autor, aliada à verossimilhança de suas
assertivas, entendo cabível a inversão do ônus da prova tal qual previsto no
art. 6º, VIII do CDC.
Diante
do coligido aos autos, restou sobejamente provado o dano moral sofrido pelo
autor, consistente em abalo de crédito, uma vez que mesmo tendo contratado a
apresentação do cheque pós-datado para o dia 28.03.2012, este cheque fora
apresentado para saque em 02.02.2012, tendo sido devolvido sem provisão de
fundos, motivo pelo qual o emitente teve o seu nome inscrito no Cadastro de
Emitentes de Cheques sem Fundos - CCF, fato que ofendeu um dos direitos de sua
personalidade, quais sejam, seu nome e boa fama.
Nesse
sentido cito precedente:
JECCAC-0005365) RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. COMPRA DE
MERCADORIA. PAGAMENTO COM CHEQUE PÓS-DATADO. APRESENTAÇÃO DA CÁRTULA ANTES DO
PRAZO ANOTADO. INSCRIÇÃO NO CCF. FALHA DO SERVIÇO. DANOS MORAIS. CONFIGURADOS.
APLICAÇÃO DA SÚMULA 370 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. VALOR DA INDENIZAÇÃO.
NÃO EXCESSIVO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A cópia do
cheque de fl. 08 revela que a parte recorrente aceitou o cheque da reclamante
com a inscrição "Bom p/02.09.2011", mas apresentou o cheque antes da
data expressa na ordem de pagamento a primeira apresentação foi feita em
25.08.2011 e a segunda no dia 30.08.2011. A alegação do reclamado de que não
trabalha com esta modalidade de pagamento, fica superada pelo fato de ter
recebido o cheque com a observação da data de apresentação e não ter tido o
cuidado mínimo de comunicar ao consumidor que iria depositar o cheque em data
anterior da que constava do documento. Evidente falha do serviço que ensejou a
negativação da reclamante no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos. CCF.
2. Neste caso, aplica-se a Súmula nº 370 do Superior Tribunal de Justiça,
enunciando que "caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque
pré-datado". O enunciado pressupõe o cheque pré-datado, ou pós-datado,
como praxe comercial que não revoga a Lei do Cheque, mas diz respeito à lisura
de intenções dos envolvidos no negócio jurídico e evidencia a necessidade de
respeito à boa-fé das partes, sem alterar a natureza do título de crédito. A
responsabilidade, então, decorre da quebra da confiança e da natural
consequência do ato, pois a experiência comum revela que simples comunicação de
cheque devolvido por falta de provisão de fundos implica na qualificação do
emitente do cheque como pessoa incorreta nos negócios, decorrendo disso os
dissabores, entre os quais o registro na instituição financeira (Resolução
BACEN nº 1.682/90). Logo, o caráter in re ipsa. 3. Para o arbitramento na
compensação do dano moral, a lei não fornece critérios. Destarte, a doutrina e
jurisprudência apontam critérios para servir de parâmetros na fixação do valor,
o que, por óbvio, deve se amoldar a cada caso. Na espécie, em observância às
finalidades compensatória, punitiva, pedagógica e preventiva da condenação, bem
assim às circunstâncias da causa, afigura-se proporcional o arbitramento feito
na sentença impugnada no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 4. Recurso
conhecido e não provido. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos,
servindo de acórdão a presente súmula de julgamento. 5. Recorrente vencido é
condenado ao pagamento das custas processuais. Sem honorários advocatícios,
pois ausentes contrarrazões recursais. (Apelação nº 0600732-29.2011.8.01.0070
(6.953), 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais/AC, Rel.
Zenair Ferreira Bueno. unânime, DJe 01.11.2013).
No
mesmo sentido a Súmula nº 370 do STJ:
STJ – SÚMULA Nº 370: Caracteriza dano moral a apresentação
antecipada de cheque pré-datado. Rel. Min. Fernando Gonçalves, em 16/2/2009.
Sendo
assim, o autor recebeu um serviço inadequado, quanto à segurança que se deve
esperar do réu, aplicando-se ao fato em apreço o Código de Defesa do Consumidor.
É
importante esclarecer que a responsabilidade civil do reclamado é objetiva, não
havendo que se perquirir se a sua ação derivou de dolo ou culpa, pois o risco
de causar danos a terceiros encontra-se dentro do risco de sua atividade, não
lhe socorrendo a afirmação de que teria havido rompimento do nexo causal por
culpa exclusiva da vítima, já que o réu não comprovou o envio tempestivo da carta
de anuência, obrigação que se encontra dentro do seu dever específico de
cuidado e é absolutamente inerente aos riscos da atividade que desenvolve.
Assim comprovado o ato ilícito do reclamado consistente na apresentação
antecipada do cheque pós-datado (fls. 16); o
dano consistente em causar ao autor indevido abalo de crédito e ofensa
aos seus direitos da personalidade, diante de sua inscrição no CCF; o nexo causal na medida em que o
dano sofrido pelo autor decorreu diretamente de ato causado pela ré e ausente
a demonstração pelo Reclamado de qualquer causa excludente do liame causal,
há de ser responsabilizado pelo sofrimento causado à parte reclamante. Senão
vejamos:
INDENIZAÇÃO
– Dano moral. Reparação que independe da existência de seqüelas
somáticas. Inteligência do art. 5 º, V, da CF e da Súm.37 do STJ. Ante o
texto constitucional novo é indenizável o dano moral, sem que tenha a
norma (art. 5º, V) condicionado a reparação à existência de seqüelas
somáticas. Dano moral é moral. (1 º TACSP – EI 522.690/8-1 – 2 º Gr. Cs –
Rel. Juiz Octaviano Santos Lobo – j. 23.06.94) (RT. 712/170)
Há de ser considerado, que o direito não
ordena a reparação de qualquer dor, mas daquela que for decorrente da privação
de um bem jurídico sobre o qual a vítima ou lesado indireto teria interesse
reconhecido juridicamente.
Quanto à reparação do dano moral, aquele
ocorrido na esfera da subjetividade, alcançando os aspectos mais íntimos da
personalidade humana, ou da própria valoração da pessoa no meio em que vive,
mesmo que seja o dano moral puro, independente de conseqüências patrimoniais,
exigível ex facto, não resta
dúvida sobre a obrigação de indenizá-lo, é só observar as disposições dos
seguintes dispositivos legais: ar. 5º, V e X, CF, art. 186, Código Civil, Lei
8.078/1990, entre outros.
A
noção de dano moral como lesão a direito da personalidade é difundida por
grande parte da doutrina. Para o Professor Sérgio Cavalieri Filho: "o dano
moral é lesão de bem integrante da personalidade, tal como a honra, a
liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento,
tristeza, vexame e humilhação à vítima." (CAVALIERI FILHO, Sergio.
Programa de Responsabilidade Civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998.)
Sendo
assim, induvidosa a responsabilidade civil objetiva do reclamado, nos termos
dos artigos 186 e 932, III, ambos do CC,
combinado com os artigos 6º, II e 14 do Código de Defesa do Consumidor.
ANTE O EXPOSTO, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na exordial, confirmando
os efeitos da liminar anteriormente concedida para declarar a inexistência de
débito da autora em relação ao réu relativamente ao contrato em referência, bem
como para condenar a FRANCAL COM DE CALÇADOS E CONFECÇÕES LTDA, já qualificado,
a pagar ao autor ANTONINO DO CARMO SOUSA, já qualificado, como forma de
compensação pelo dano moral sofrido, a quantia de R$ 7.240,00 (sete mil, duzentos
e quarenta reais), correspondente a 10 (dez) salário mínimos vigentes, valor
que não é ínfimo e nem exagerado, acrescido
de juros de mora de 1% ao mês, a partir do dano (art. 398 do CC e Súmula 54 do
STJ) e correção monetária a partir desta decisão (Súmula 362-STJ).
Condeno
o réu em custas e despesas processuais e honorários advocatícios, estes no
percentual de 15 % sobre o valor da condenação. (CPC, art. 20, §3º)
Por
conseguinte, extingo o processo com resolução de mérito, na forma do que dispõe
o art. 269, I do CPC.
Conforme
determina o art. 475-J do CPC, intime-se o réu para efetuar o pagamento, no
prazo de 15 dias, sob pena de multa no percentual de 10% sobre o valor da
condenação.
P.
R. I.
João
Lisboa/MA, 05 de junho de 2014.
Juiz Glender
Malheiros Guimarães
Titular da 1ª Vara da Comarca de João Lisboa
Nenhum comentário:
Postar um comentário