sexta-feira, 4 de abril de 2014

DECISÃO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMINAR DE POSSE NOVA. POSSE INJUSTA POR CLANDESTINIDADE. DEFERIMENTO



Processo nº 176-34.2014.8.10.0066
Ação Reintegração de Posse
Autor: JOSE PEREIRA FALCÃO
RÉU: MIGUEL DE SOUSA RESENDE

DECISÃO

Cuida-se de Ação de Reintegração de Posse intentada por JOSÉ PEREIRA FALCÃO em face de MIGUEL DE SOUSA RESENDE para reaver posse de imóvel que estaria sendo esbulhado pelo requerido com pedido de liminar.
Aduz o requerente que é o possuidor de imóvel rural de 870.34.34 HÁ (oitocentos e setenta hectares, trinta e quatro ares e trinta e quatro centiares) e que o requerido que possui imóvel contiguo ao do requerente estaria invadindo uma área de sua propriedade equivalente a 15 (quinze) alqueires.
Postula a concessão de liminar com o fim de vê resguardado o seu direito à posse.
Instruiu o pedido com cópia do contrato particular de venda e compra do imóvel, cópia do boletim de ocorrência policial, georeferenciamento e fotos da área esbulhada.(fls. 12/35).
Às fls. 38, este juízo elevou o valor da causa e determinou a intimação do autor para recolhimento da complementação das custas, o que foi feito às fls. 50-53.
Vieram os autos conclusos.

É o Relatório. DECIDO.

A reintegração de posse é o remédio processual adequado à restituição da posse àquele que a tenha perdido em razão de um esbulho, sendo privado de seu poder físico sobre a coisa. Não é suficiente o incômodo; essencial é que a agressão provoque a perda da possibilidade de controle e atuação material no bem antes possuído, uma vez que nos termos do art. 926 do CPC: “o possuidor  tem o direito de ser mantido na posse em caso de turbação e  reintegrado no caso de esbulho.”

O esbulho se caracteriza em situações em que a posse é subtraída por qualquer dos vícios objetivos, enumerados no art. 1200 do Código Civil, quais sejam: a violência, precariedade e clandestinidade.

O autor, titular da posse, tanto pode ser autor como réu nas ações possessórias, segundo interpretação do art. 1.197 do Código Civil e art. 95 e ss. do Estatuto da Terra., in verbis:

Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.

Em seus comentários ao Código Civil, NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY esclarecem que "tanto o possuidor direto quanto o possuidor indireto - como por exemplo o nu-proprietário, o dono da coisa empenhada, o locador etc. - têm direito à defesa de sua posse, contra terceiros, por meio dos interditos possessórios".

Como sabido o possuidor é aquele que se comporta como proprietário, de modo consciente, mantendo de fato o exercício de alguns dos poderes inerentes à propriedade.
Para obter seu proveito econômico, é possível tanto a utilização direta como a cessão a terceiros da coisa, vale dizer, mediante utilização indireta.

O possuidor indireto, embora não tenha o poder físico imediato sobre a coisa, sem dominação direta, é também possuidor, porque se comporta como proprietário.

Tanto o possuidor direto como o indireto podem afastar os ataques injustos de terceiros à posse, utilizando a tutela possessória e o desforço próprio.

No presente caso, resta evidenciado que o autor, no momento do suposto esbulho, tinha a posse do imóvel desde 01.03.2013, a qual lhe foi transmitida por atos inter vivos conforme se afere do contrato de promessa de compra e venda de fls. 12-15, onde a anterior possuidora transmite o seus direitos de herança sobre os imóveis descritos na procuração de fls. 16-18.

Por sua vez o art. 1207 do CC facultar ao sucessor a título singular a chamada acceptio possessionis de forma que o adquirente do imóvel pode unir a sua posse à do antecessor, bem como recebe a posse com os mesmos caracteres com as quais foi alienado (CC, art. 1206):

Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.

Feitas tais considerações, analisando os autos, a luz da documentação que instrui a inicial, pode-se constatar que os autores provaram a posse justa, nos termos do art. 1200 do CC (Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.),  do imóvel Rural denominado FAZENDA CORAÇÃO DE FERRO, constituída pelos títulos do imóveis descritos nas fls. 12-14, adquirida em 01.03.2013 (fls. 12-18), demonstrando a tradição da posse por instrumento particular de Promessa de Compra e Venda (pois a posse tem um valor econômico), corroborado pela Procuração de fls. 16-18 que substabelece o autor nos poderes de administrar e alienar os imóveis nela descritos.

Ademais, convém destacar que a posse do autor foi exteriorizada por período superior a nove meses sem qualquer interferência de terceiros,.havendo notícia de esbulho no imóvel FAZENDA CORAÇÃO DE FERRO, somente em 08.01.2014 por ocasião do desapossamento denunciado nos presentes autos.

Das provas colhidas não ocorre nenhum juízo, em sentido contrário, ou seja, de que o autor, por si ou por prepostos, de alguma forma, não empreendesse qualquer conduta a veicular, subjetiva ou objetivamente, traços do exercício de uma posse. Tal fato é corroborado com o pequeno lapso temporal (4 dias) entre a notícia do esbulho e o seu registro junto à DEPOL local.

A posse exterioriza-se pelo exercício de poder sobre a coisa. Porém, a visibilidade de que a pessoa está em contato com a coisa não é suficiente para caracterizar a situação jurídica de possuidor. A qualificação de um fato como posse depende da investigação de sua origem e do título em que se diz fundada.

Compulsando os autos, verifico que os autores foram legitimamente investidos, faticamente, na posse do imóvel desde o dia 01.03.2013. E somente foram desapossados no último dia 04.01.2014, após as investidas contra coisa por parte de prepostos do requerido que, segundo o boletim de ocorrência, cercou a área com arame liso e madeira de lei, desmatou-a com o uso de tratores e em seguida plantou semente de capim.

Portanto, a atual posse do requerido é inquinada de vício, na medida em que os boletins de ocorrência policial anexados aos autos que fora obtida de forma clandestina, às escondidas, sem o consentimento do autor,  o que caracteriza sua ilicitude, diante do ordenamento jurídico.
A posse é clandestina (clam) quando se adquire via processo de ocultamento em relação àquele contra quem é praticado o apossamento (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. Cit., p. 23). É um defeito relativo: oculta-se da pessoa que tem interesse em retomar a posse, embora possa ser ela pública para os demais.

A inicial narra o esbulho contra o imóvel. Segundo a petição inicial: “(...) o requerido, que é seu vizinho, na data citada (04.01.2014), invadiu parte da propriedade do requerente, passou seu trator na terra, cercou a área e iniciou o cultivo da terra, tudo, clandestina e ilegalmente.(...)”

As fotografias de fls. 30-34, corroboram as alegações contidas na petição inicial.
A cópia da planta topográfica do imóvel, destaca a área invadida que, segundo a petição inicial, atingiria cerca de 15 (quinze) alqueires ao sul do imóvel questionado. (fls. 35)

Acerca da liminar pleiteada, dispõe o art. 927 e 928 do CPC:

Art. 927. Incumbe ao autor provar:
I – a sua posse;
II – a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III – a data da turbação ou do esbulho;
IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegra­ção.
Art. 928. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do man­dado liminar de manutenção ou de reintegração; no caso contrário, determinará que o autor justifique previa­mente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada.

Por tais argumentos, que demonstram satisfatoriamente, em juízo de cognição sumária, mera prelibação, preenchimento dos pressupostos ao deferimento da medida liminar de reintegração de posse, acrescidos da inclusão desta causa àquelas que a doutrina convencionou chamar de ação de força nova, por estar dentro do prazo de ano e dia da data do esbulho, autorizadora do deferimento da medida antecipatória de reintegração, nos termos do artigo 924, 927 e 928 do Código de Processo Civil, outra solução não há senão conceder preambularmente a reintegração de posse ao autor.

Com efeito, observo que o autor demonstrou estar legitimamente investidos na POSSE do imóvel em litígio, seja pelos títulos do imóveis descritos nas fls. 12-14, adquirida em 01.03.2013 (fls. 12-18), demonstrando a tradição da posse por instrumento particular de Promessa de Compra e Venda (pois a posse tem um valor econômico), corroborado pela Procuração de fls. 16-18 que substabelece o autor nos poderes de administrar e alienar os imóveis nela descritos.

O ESBULHO também restou caracterizado sumariamente nos autos conforme boletim de ocorrência policial de fls. 19; a data do esbulho também consta dos autos, ou seja, ocorreu desde o dia 04.01.2014, data em que o requerido determinou que prepostos cercassem a área com arame liso e madeira de lei, desmatassem-a com o uso de tratores e em seguida plantassem sementes de capim, tudo sem o consentimento do requerente. Por fim, a perda da posse remanesce até os dias atuais desde o desapossamento.
Portanto, entendo devidamente preenchidos os requisitos para a concessão da liminar pleiteada. Nesse mesmo sentido segue jurisprudência:
 “MEDIDA CAUTELAR - Liminar - Deferimento - Admissibilidade - Reintegração de posse - Irrelevância da alegada invalidade e inveracidade do documento instrutório da inicial - Esbulho possessório verificado na audiência de justificação de posse - Artigo 928 do Código de Processo Civil - Fase procedimental, ademais, onde não é lícito ao demandado produzir provas, limitando-se tão somente a fiscalizar a regularidade da audiência - Decisão summaria cognitio mantida - Recurso não provido. A prova necessária e suficiente para que o Juiz conceda a liminar de reintegração é apenas prova de verossimilhança dos fatos alegados pelo autor.” (TJ/SP, Relator: Mohamed Amaro - Agravo de Instrumento n. 232.531-2 - Campinas - 04.08.94)
Por tudo que se foi argumentado, bem com pelas provas escorreitas colacionadas aos autos, resta delineada a posse, sua perda, o esbulho e sua época, elementos tais indispensáveis ao deferimento da medida liminar reintegratória e, analisados pelo magistrado e constatada suas presenças, conduzem, invariavelmente, a concessão do pleito ao requerente.

ANTE O EXPOSTO, DEFIRO A REINTEGRAÇÃO LIMINAR pleiteada por JOSE PEREIRA FALCAO, em desfavor de MIGUEL DE SOUSA RESENDE e/ou quem os acompanhe no local, o fazendo em virtude do preenchimento dos requisitos insculpidos no artigo 924, 927 e 928 do Código de Processo Civil, devendo o processo seguir em seus ulteriores termos, intimando-se o requerido desta decisão e CITANDO-O para, querendo, apresentar contestação no prazo legal de 15 (quinze) dias.

Sendo necessário, autorizo, desde já, o cumprimento da medida liminar mediante arrombamento e com o uso de força policial.

Oficie-se À SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA, COMANDO DA POLÍCIA MILITAR, 14º BATALHÃO DA POLÍCIA MILITAR E DELEGACIA REGIONAL DE POLÍCIA CIVIL DE IMPERATRIZ a fim de que seja providenciado o efetivo cumprimento da presente decisão.

Intime-se e Cumpra-se.

Amarante do Maranhão/MA, 03 de abril de 2014.


                                                  Juiz Glender Malheiros Guimarães

Titular da Comarca de Amarante do Maranhão

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