0800144-41.2018.8.10.0038
SENTENÇA
RAIMUNDO MESSIAS DE SOUSA, já qualificado, ingressou com
a presente AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER em face do COMPANHIA ENERGÉTICA DO
MARANHÃO – CEMAR sob a alegação de que é proprietário de imóvel urbano nesta
cidade e que esta construindo uma garagem enquanto benfeitoria útil para seu
imóvel onde pretende guardar o seu veículo adquirido a imenso custo, uma vez
que se trata de um simples lavrador deste município, porém, está sendo impedido
de realizar a obra em virtude de um posto de energia elétrica que está situado
na calçada defronte de sua residência, o que vem impedido uso e gozo do seu
direito de propriedade.
Suscita que procurou a
concessionária de serviço de energia, a qual a lhe atribuiu o ônus para
retirada do poste no valor de R$ 2.209, 34 (dois mil, duzentos e nove reais e
trinta e quatro centavos), além de prazo razoável para remoção.
Pleiteia obrigação de
fazer, retirada do poste que impede o seu livre uso e gozo do direito de
propriedade, às custas da concessionária exclusivamente.
Audiência
realizada, não logrou êxito a conciliação.
Em sua resposta a CEMAR suscitou que a instalação do
poste de energia precede a construção da garagem, pois não há evidencia alguma
de ter sido instalado à frente do portão do reclamante; que a remoção do poste
é possível, porém, condicionada ao pagamento dos custos e prazos para sua
realização; que não se trata de uma manutenção preventiva, corretiva e/ou
melhorias de responsabilidade da requerida, mas sim de serviços de realocação
de postes de rede para atender ao interesse do autor; que a Res. 414/2010 da
ANEEL autoriza a cobrança pelo serviço em seu art. 102, XII e XIII; que os
postes não fora alocados de maneira incorreta; que a realocação é uma
necessidade para atender ao interesse do autor, criada pelo mesmo e que não
existia ao tempo da instalação do posteamento; finaliza requerendo a
improcedência da ação.
É o Relatório.
DECIDO.
A relação jurídica estabelecida entre as partes é de
natureza consumerista, tendo em vista que a parte acionada é fornecedora de
serviço cuja destinatária final é a parte autora (arts. 2º e 3º do CDC).
Assim, a controvérsia
deve ser solucionada sob o prisma do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº
8.078/90), que por sua vez regulamenta o direito fundamental de proteção do consumidor (art. 5º, inciso XXXII da Constituição Federal). Deve-se
atentar que o Código de Defesa do Consumidor tenta justamente reequilibrar esta
relação, tendo em vista a vulnerabilidade do adquirente e a posição economicamente
favorável dos fornecedores.
Insta a inversão do ônus probatório, como regra de
julgamento, porquanto a parte autora é hipossuficiente tecnicamente e milita em
seu favor a verossimilhança do direito alegado, na esteira do art. 6º, VIII, do
CDC.
Destaco inicialmente que a própria empresa acionada não
colacionou qualquer prova que demonstre a impossibilidade da remoção do poste
ou qualquer prejuízo dá decorrente para a coletividade de consumidores. Ao
contrário, declarou em sua resposta que está disposta a fazer a remoção e
realocação, entretanto, condicionou os custos do serviço ao prévio pagamento do
mesmo pelo autor em valores que superam a importância de R$ 2.000,00, custos
que comprometem e impossibilitam a realização da obra pelo autor.
DO DIREITO DE PROPRIEDADE DO AUTOR
O
direito de propriedade está disposto na carta constitucional brasileira de
1988, devidamente exposto no artigo 5ª, caput, e inciso XXII, bem como
dispostos no artigo 1.228 e seguintes Código Civil de 2002, o que faculta ao
proprietário o pleno direito de uso e gozo de seus frutos.
Assim
dispõe o artigo 5º da Constituição Federal do Brasil de 1988:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXII
- é garantido o direito de propriedade;”
Em
regulamentação ao referido dispositivo, dispõe o artigo 1.228 do Código Civil
de 2002:
“Art. 1.228. O proprietário tem a
faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de
quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
Tais
disposições deixam evidenciado que o proprietário tem o direito de uso e gozo
da sua propriedade e deve se opor a quem o detém injustamente.
Resta
evidente o interesse do proprietário/consumidor em se opor às irregularidades
praticadas pela concessionária de energia elétrica em sua propriedade e o
direito de exigir delas a remoção de postes, fios de alta tensão ou
equipamentos intrusos que obstem no uso pleno da propriedade do autor.
Nos
autos restou evidenciado que não se trata de um mero capricho do autor e
tampouco de uma benfeitoria voluptuária.
Trata-se
de benfeitoria útil que permitirá ao autor a guarda de seu recém adquirido
veículo, fato que trará segurança para o seu patrimônio.
Não é direito da
concessionária de serviço público de energia limitar o direito de propriedade
do autor, na medida em que é direito constitucionalmente assegurado a ser
exercido de forma plena.
Assim, não é a concessionária de energia que indica a
possibilidade ou não de construção de uma garagem na propriedade particular do
autor, uma vez que não é órgão competente para embargos de obras.
Ademais, é inconsistente a alegação de instalação de
poste e energia elétrica anterior a construção, uma vez que é uníssono entendimento
dos tribunais sobre o dever da concessionária de energia proceder com a retirada
de fiação ou poste se estes estão a impedir o livre exercício do direito de
propriedade, conforme se verifica nos seguintes precedentes:
EMENTA:
OBRIGAÇÃO DE FAZER. Remoção de poste de energia elétrica instalado defronte à
residência do autor Circunstância que impede a entrada e saída de veículos
Restrição ao direito de propriedade (art. 1228 do CC) Responsabilidade da concessionária
pelo custeio da remoção. Cumprimento da obrigação Elevação do prazo para 30
dias Razoabilidade Recursos provido, em parte. (TJ-SP - APL:
1220484620098260001 SP 0122048-46.2009.8.26.0001, Relator: Ligia Araújo Bisogni,
Data de Julgamento: 31/10/2012, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/11/2012).
Data de Julgamento: 31/10/2012, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/11/2012).
EMENTA:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. REMOÇÃO DE POSTE DE
SUSTENTAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA. POSTE PRÉ-EXISTENTE À AQUISIÇÃO DO
TERRENO PELA AUTORA. NECESSIDADE DE REMOÇÃO PARA VIABILIZAÇÃO DE EDIFICAÇÃO.
DEVER DA CONCESSIONÁRIA. DECRETO Nº 41.019/57. PRECEDENTES DESTA
CORTE. NECESSIDADE DE AMPLIAÇÃO DO PRAZO PARA EXECUÇÃO DA REMOÇÃO. PRAZO DE 30 DIAS. POSSIBILIDADE E LEGALIDADE DA FIXAÇÃO DE ASTREINTE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70031214935, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 26/08/2009).
CORTE. NECESSIDADE DE AMPLIAÇÃO DO PRAZO PARA EXECUÇÃO DA REMOÇÃO. PRAZO DE 30 DIAS. POSSIBILIDADE E LEGALIDADE DA FIXAÇÃO DE ASTREINTE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70031214935, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 26/08/2009).
Vê-se, portanto, em que
pese a alegação de que a instalação do poste de energia encontra-se instalado
em vias públicas o poste da rede de eletricidade está situado na frente da casa
do autos, em sua calçada, exatamente em frente à garagem que está sendo
edificada e que inexiste outro local para a referida construção, o que revela
que o autor está sendo impedido de usar e gozar do seu imóvel.
Por outro lado, é a
concessionária a única responsável para retirada da referida instalação, inexistindo
qualquer justificativa técnica comprovada para a não realização da instalação.
Do mesmo modo, sendo concessionária de um serviço público
tem o dever do fornecimento de energia da coletividade, sem, no entanto,
esbarrar no direito privado do consumidor, devendo impor ao mesmo sacrifício
mínimo necessário para o pleno atendimento do interesse público. Porém, essa
não é a situação que se descortina nos autos, onde o poste pode ser deslocado
alguns metros para a lateral esquerda - sem comprometer a qualidade do
fornecimento do serviço público – e desobstruindo o único acesso possível do
veículo do autor à sua garagem.
Neste ínterim, deve proceder a realocação do poste que encontra-se
em frente a residência do autor, alguns metros para a sua lateral afim de
assegurar o real direito de propriedade, sem, no entanto, levar qualquer
prejuízo a coletividade.
ANTE DO EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO DO AUTOR , motivo
pelo qual extingo o processo com resolução do mérito, nos termos art. 487,
inciso I do CPC, para DETERMINAR, em obrigação de fazer, que a empresa
demandada proceda, no prazo de 30 (trinta) dias com a REALOCAÇÃO do poste de
fiação que está situado em frente à garagem do autor e está impedindo o acesso
de seu veículo ao referido cômodo, modificando a localização do poste, as
expensas da concessionária exclusivamente, sob pena de multa diária de R$ 300,00
(trezentos reais), em caso de descumprimento, nos termos do art. 497 do CPC.
Sem custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 54
e 55, da Lei 9.099/95.
P.
R. I. e, certificado o trânsito em julgado, arquivem-se, observadas as
formalidades legais.
João
Lisboa/MA, 02 de outubro de 2018.
Glender Malheiros
Guimarães
Juiz de Direito Titular da 1ª Vara
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